Humberto Pergher |
Humberto Pergher
O artista ao modelar o barro para
dele extrair uma estátua, não só deixa em sua superfície estampados seus traços
digitais, muito mais que isso concretiza na obra a sua idéia e personifica nela
seu próprio ser de tal maneira, que esta passa a ser seu retrato mais ou menos
fiel conforme a perfeição da obra. Através dela entra-se em contato com a
riqueza interior, a vibratividade e euritimia do artista e do homem, para com
ele sentir as mesmas emoções.
Pode-se ainda entrar em contato, em
comunhão íntima de paixões e idéias pela simples visão do artista, ouvindo-o
falar especialmente quando à riqueza de vibração aliar uma espontaneidade de
expressão oral e mímica; quando à cadência e ao fluir ligeiro do verbo aliar a
agudeza de olhar que magnetiza; quando à grandiosidade e profundidade de
idéias, quando a sonoridade da voz e intensidade de emoções, à majestosa
estruturação do período aliar, paradoxalmente, uma incompreensível pequenez
física talhada duramente pela adversidade e pela luta.
Pois esta visão íntima do homem em
sua diáfana transparência esta simbólica vivência de idéias e emoções, esta
aterradora pequenez do homem frente ao espírito já a experimentaram todos
quantos ouviram uma conferencia de Plínio Salgado. Despe-se imediatamente o
espírito do ouvinte de quantos atavios por ventura se ache emaranhado e em sua
original candura entra em união intelectual com o conferencista, para sorver
gota a gota, o néctar que este destila, modicamente, de início; em ritmo
crescente, logo após; e, por fim, em torrentes incontidas ocupando o intelecto
e a sensibilidade do ouvinte de maneira tão completa que o tempo perde seu
valor. Aqui, mais que em qualquer parte, manifesta-se a pequenez do homem ante
o infinito e sua grandeza no finito.
Entrechoque da grandiosidade das
idéias com a violência dos sentimentos despertados nos espíritos, busca escape
emotivo nos vibrantes aplausos e nas palmas espontâneas de quantos auditórios
travem contato íntimo com o espírito de Plínio Salgado. Não há necessidade de
anterior conhecimento da vida deste escritor, nem tão pouco de suas idéias, de
suas lutas, de seu sofrimento em ver sua Pátria, que deseja grande, pujante e
cristã, tão amesquinhada, traída tantas vezes, e cada vez mais enfraquecida em
suas forças vitais. É suficiente ver sua pessoa, fisicamente pequena e abatida,
transformar-se subitamente em um gigante que domina completamente toda uma
multidão pela grande e eloqüente cadência de seu verbo, para sentir com o
orador um amor imenso por esta terra que é nossa, uma dor pungente pela desdita
que a abate, e a necessidade imperiosa de lutar pela sua re-cristianização,
único meio de salvá-la e fazê-la feliz.
É suficiente este contacto
auditivo - visual – intelectual - emocional para ter-se o homem todo em toda
sua riqueza, em toda a sua grandeza intelectual e moral. Então se compreende
sua incrível obstinação em lutar, mesmo que seja sozinho, em sacrificar sua
grande vocação para a literatura e “recomeçar mil vezes se for preciso para
salvar o Brasil”.
Entretanto, muito restrito é o número
dos que podem, por este contato direto assimilar os ensinamentos de Plínio
Salgado. A grande maioria dos brasileiros deve fazê-lo pela leitura de suas
obras embora em todas as suas obras esteja, em sua totalidade, o homem que
dedicou sua vida à causa de Cristo e do Brasil, devido à predominância de um
dos aspectos de sua doutrina, poderia o leitor ser levado a um conhecimento
parcial e, por isto mesmo, falho, do homem e de seu pensamento.
Pela obra se chega ao autor e pelo
autor se compreende a obra.
Por onde se vê ser necessário um
conhecimento biográfico do autor para melhor compreensão de sua obra. Urge
situá-lo em sua época, no meio em que vive, para conhecer quais as influências
do ambiente sobre ele e as suas reações. É necessário saber qual a sua formação
religiosa, qual sua adaptação social, para melhor compreender e interpretar as
idéias mestras de sua doutrina.
No caso do autor da “Vida de Jesus”,
torna-se indispensável saber de seu espírito profundamente cristão, conhecer os
laços afetivos que o ligam ao Brasil desde os seus ternos anos, quando num
ambiente familiar essencialmente cristão aprendeu a amar a Deus e à sua Pátria.
Conhecida sua biografia e tendo presente estes fatores fundamentais, pode-se
começar o estudo de seu pensamento sociológico e filosófico pela leitura de
suas primeiras obras, os romances “O Estrangeiro”, “O Esperado”, “O Cavaleiro
de Itararé”, e a “Voz do Oeste”, nos quais procede a um largo estudo social do
homem do interior paulistano, em páginas de rara sensibilidade artística e
profundo senso objetivo, cônscio do papel do literato no aprimoramento da
sociedade.
Nestes seus romances estão lançados
os princípios de toda sua doutrina sociológica, política e filosófica. As
inúmeras obras que se seguiram são desenvolvimentos dos princípios
anteriormente esboçados. O leitor das obras de Plínio Salgado terá sempre
presente o espírito profundamente cristão do autor voltado para a realidade
brasileira, esperançoso de ver o Brasil cumprir sua missão histórica da qual se
fez para sempre o mesmo incansável batalhador, durante sua vida e após ela na
duração de seus escritos. Porém, de todas as obras de Plínio Salgado é na “Vida
de Jesus”; que mais alto se ergueu seu gênio. Neste livro uni-se a piedade
cristã a alma do artista, o espírito do pensador e a visão do homem público
para burilar incontestavelmente a maior pérola da literatura brasileira. Na
“Vida de Jesus”, os moços brasileiros têm a obra prima do artista, do
sociólogo, do cristão, onde a identificação do autor se faz em cada linha e
onde seu pensamento se concretizou para a eternidade.
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É este Plínio Salgado fervorosamente
cristão e perdidamente brasileiro que deve ser compreendido em primeiro lugar e
está sempre presente ao estudioso de suas obras e de seus escritores. Só assim
haverá a perfeita compreensão em sua honestidade intelectual, em sua
sensibilidade profundamente humana, em seu ardor apostólico, na crueza
apocalíptica de sua analise social do nosso tempo e na certeza absoluta dos
superiores destinos do Brasil.
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Publicado originalmente em “A Marcha”, 12/02/1954, e
posteriormente reproduzido no Vol. VIII da “Enciclopédia do Integralismo”.
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