sexta-feira, 15 de abril de 2022

Federação e Unidade Nacional (1965)



Esclarecimento: O Artigo abaixo foi publicado em jornal pelos “Diários Associados, mas, o recorte que dispomos não trazia a data da publicação. Felizmente, graças ao impressionante trabalho de pesquisa sobre o Integralismo em fontes primárias, o brilhante pesquisador Matheus Batista pode nos informar que a data da edição foi 07 de Dezembro de 1965.

Em breve, o Companheiro Matheus Batista publicará uma sensacional Obra sobre o Integralismo. Aguardem!

Federação e Unidade Nacional (1965)

Plínio Salgado

A Unidade Nacional Brasileira constitui um dos fenômenos políticos mais notáveis do mundo. Não se trata de uma unidade compulsória, como foi o caso do Império Romano, ou dos impositivos de guerras vitoriosas, como as de conquista empreendidas pelos Czares da Rússia, que sucessivamente foram abrangendo largos territórios. Em ambos os casos verificou-se uma unidade de aparência, mas não de essência. Os povos submetidos continuaram a falar em suas línguas próprias, multiplicadas em dialetos, mantendo o culto de suas religiões e as normas tradicionais de seus costumes.

 

No Brasil, entretanto, em extensão quase equivalente àqueles Impérios, conservaram-se a mesma língua, a mesma religião, os mesmos hábitos, com ligeiras variantes de características regionais. E, mais do que isso: um sentimento comum de Pátria, que identifica o amazonense e o gaúcho, os paulistas e mineiros aos nordestinos e às populações do Centro-Oeste. A que atribuir tão pasmosa unidade?

 

Historiadores e sociólogos procuram penetrar no mistério desse enigma; opiniões divergem, mas o problema continua desafiando a argúcia dos pesquisadores.

 

Tenho para mim que a causa principal da nossa unidade está no espírito ecumênico do colonizador português. Aquele povo, de pouco mais de um milhão de habitantes ao tempo das descobertas, herdou dos romanos o sentido universalista no trato com os povos. Em vez de impor, adaptou-se ao que encontrava como realidade social e soube conformar-se às circunstâncias geográficas, climáticas e regionais. Sem preconceitos de raça, cruzou-se com os autóctones e, depois com as correntes africanas e europeias que confluíram no Novo Mundo. Sem intolerância religiosa, pregou o Evangelho, mas não violentou nem os índios nem os negros, não exercendo sobre eles a crueldade dos arbítrios inquisitoriais. Sem exorbitância de uma política centralizadora, deixou germinar e crescer a futura Nação, consoante com o pensamento dos juristas e a clarividência dos Reis.

 

A evolução do povo brasileiro teria, porém, justamente em razão da política dos colonizadores, a partir de D. João III, de desenvolver-se entre as forças contrastantes de uma antinomia, que perdurou na Colônia, no Império e manifestou-se claramente na República. De um lado, a atração centrista da Autoridade Central, do outro a expansão centrífuga dos imperativos regionais, aos quais devemos acrescentar inicialmente o espírito do Homem Renascentista, sequioso de liberdade e de aventura e, posteriormente, o do racionalismo do século XVII e o libertarismo do século XVIII.

 

A necessidade inerente ao plano da colonização levou a Metrópole a dividir o vasto território em capitanias. Falou o bom senso, considerada a extensão da área a colonizar e a civilizar. Começam, aí as diferenciações de interesses das várias partes do País. Fracassado o plano, em grande parte das Capitanias, recorre-se a um Governo Geral. Viu-se, depois, que o Norte era diferente do Sul e que o Brasil precisava de dois governos.

 

No curso do século XVIII, acentua-se a antinomia entre o respeito à Metrópole e o libertarismo da Nação nascente. O sentimento de fidelidade à Portugal manifestara-se já nas guerras contra os holandeses, franceses e ingleses e, principalmente, quando os pernambucanos foram retomar Angola, para entregá-la à Pátria-Mãe. Exprime-se ainda no gesto de Amador Bueno, aclamado rei dos paulistas e rejeitando a coroa por ser fiel a Portugal. Por outro lado, falam os sentimentos regionalistas e individualistas, que revelam o Homem da América, de movimentos livres e soberana audácia. Tal estado de espírito irá manifestar-se na Inconfidência Mineira e na revolução americana de 1817.

 

Assim, chegamos à Independência. Agora, que o Poder Central se deslocava de Lisboa para o Rio de Janeiro, explodem os ímpetos de autonomia regional. O Brasil está ameaçado pelo separatismo. Por que? Pelo excesso de centralização do Poder. É o mesmo que se deu na Argentina, conforme assinala Sarmiento no seu livro sobre Facundo Quiroga.

 

Apagadas as chamas da segunda revolução pernambucana de 1824, acende-se dez anos depois o incêndio da Guerra dos Farrapos. É a República de Piratini contra os arbítrios do Poder Central. Depois de pacificado o Rio Grande do Sul, pelo esforço ingente de Diogo Antônio Feijó, foi este mesmo que, unido ao brigadeiro Tobias em São Paulo e a Teófilo Otoni em Minas, deflagrou uma nova revolução, em 1842, alegando a excessiva absorção do Governo Central contra as Províncias do Império. O Federalismo nascia, portanto, destas datas memoráveis: 1824 – Pernambuco; 1835 – Rio Grande do Sul; 1842 – São Paulo e Minas.

 

Só então começou-se a compreender que a Unidade Nacional Brasileira, lastreada pela mesma língua, pela mesma religião, pelos mesmos sentimentos, encontrava agora um opositor: os legítimos interesses regionais, não apenas econômicos, mas sobretudo de liberdade política e livre manifestação da opinião dos brasileiros.

 

No transcurso histórico de 1842 a 1870, a ideia federalista ganhou corpo, como condição fundamental da Unidade da Pátria. Nem se podia compreender o problema de outro modo. Ainda que unidos pelos laços afetivos mais profundos, os brasileiros das Províncias não sofriam ser oprimidos, espezinhados pelo Poder Central. Queriam ter voz nos auditórios da Nação, queriam ser atendidas nas suas peculiaridades, queriam a União mas com dignidade e como resultado de uma autonomia em que se baseia a sua livre adesão ao Todo Nacional.

 

A ideia federalista empolgou de tal maneira os espíritos que, desde a Convenção de Itu, realizada em 1873, foi-se tornando a ideia-força da propaganda republicana. No Partido Liberal, principalmente, o federalismo aliciava, dia a dia, novos adeptos, ao ponto de um homem como Rui Barbosa, pertencente àquela agremiação, declarar ser imperativa a fórmula federalista, “com ou sem a Monarquia”. Era o desenvolvimento do Brasil, que transitara das Capitanias, isoladas uma das outras, à formação gradativa das futuras Províncias e, finalmente estas, tomando consciência das diferenciações que as distinguiam umas das outras e delineando, por um processo natural, os seus limites geográficos.

 

Todo o segredo da Unidade Brasileira está em conciliar os rumos políticos gerais da Nação com os impositivos das reações regionais. Compreenderam-no os Reis Portugueses, os Governadores Gerais, os Vice-Reis e os estadistas do Império. Compreendiam-no de modo claro, pensadores como Tavares Bastos. Percebiam-no tanto os que pretendiam preservar o Trono, como os que desejavam derrubá-lo.

 

Ao proclamar-se a República, viram os responsáveis pelo novo regime que as instituições recém-inauguradas necessitavam de uma firme estrutura política para as embasar. Os Partidos da Monarquia (o Conservador, o Liberal e o Progressista) tinham sido automaticamente extintos, não por decretos artificiais, mas em consequência das realidades políticas.

 

As democracias não vivem sem partidos; são eles os captadores das correntes de opinião, os aparelhos de sensibilidade, acusando tendências das parcelas componentes do povo; refletindo a influência das ideologias e doutrinas expostas pelos pensadores do País; assinalando os diferentes estados de espírito do povo; acusando mudanças inerentes à própria vitalidade nacional. A Nação é um corpo vivo. Ao contrário do que pretenderam Bluntchili e a escola histórica alemã, não é o Estado que vive e sim a Nação, porque o Estado é apenas um instrumento dela.

 

Os fundadores da República, vendo a Nação sem partidos, não porque o desejassem, mas porque as agremiações baluartes do Império desapareciam com ele, buscaram nas realidades nacionais o meio de articular a opinião pública. A articulação dependia de motivações e estas, uma vez que só predominava a ideologia republicana, só podiam existir segundo os interesses das Províncias, agora transformadas em Estados autônomos.

 

Corporificou-se, então, o Partido Republicano, que por ocasião da proclamação da República, praticamente só existia em São Paulo e Minas, com 35 fraquíssimos clubes de propaganda. O adesismo ao Poder, que é uma constante na vida brasileira, segundo o primeiro fator da antinomia a que nos referimos, ou seja a submissão à Metrópole, aos Governadores Gerais e aos Vice-Reis, no tempo da Colônia e aos Gabinetes Ministeriais no Império, facilitou a formação do Partido Republicano no País, um partido único, que precedeu de muito o comunismo, o nazismo e o fascismo. Mas havia a atender a motivações que polarizariam as opiniões regionais e, nesse caso, multiplicaram-se os Partidos Republicanos, com siglas de cada Estado: PRP em São Paulo; PRM em Minas; PRR , no Rio Grande do Sul; PRB na Bahia. E assim por diante.

 

Os primeiros anos da República estiveram sob a responsabilidade dos militares e foram períodos de agitação, descompasso, perturbações, porque a Força Armada raciocina em razão de regimentos e batalhões disponíveis pelas facções em que se dividem e nunca pela ordem natural das coisas. Isso levou Deodoro da Fonseca a dissolver o Congresso, vindo, logo em seguida, o golpe de Floriano Peixoto e Custódio de Melo (Exército e Marinha). E não tardou que o consulado de Floriano fosse abalado pelo mesmo Custódio de Melo, em consonância com as forças rebeladas de Gumercindo Saraiva, que vinham do Sul.

 

Jugulada a revolta e já muito doente Floriano, veio afinal o Governo Civil de Prudente de Morais, contra o qual se articulou a conspiração de Diocleciano Martyr e Marcelino Bispo, cujo epílogo foi o assassinato do marechal Bittencourt, que recebeu a bala destinada a Prudente.

 

O Federalismo, entretanto, articulou-se para a eleição de Campos Sales e este deu vivência à realidade federalista instaurando a “política dos governadores” mediante a qual governou sem estado de sítio, norma de seus antecessores e sucessores.

 

Essa política funcionou até 1930. Era inevitável que os Estados mais populosos dominassem a vida nacional. A composição paulista-mineira e gaúcha equilibrou o sistema.

 

Inquietações e ideias novas começaram a se revelar nas revoluções de 1922 (Copacabana); 1924 (São Paulo); 1926 na Marinha, até que em 1930, por interesses puramente regionais, quebrou-se a aliança Minas-SãoPaulo-Rio Grande.

 

Enganavam-se os que pleiteavam a hegemonia de seus Estados. Correntes ideológicas surgiam, num sentido nacional e não mais estadualista. Era o socialismo, o comunismo, o nacionalismo, o integralismo. A própria revolução de São Paulo (1932) escapava aos limites do Estado, para assumir o caráter ideológico de constitucionalismo, vitorioso afinal na Carta de 1934. Mas esta teve pouca durabilidade, sobrevindo a Ditadura que teve vigência até 1945. Os partidos organizados em 1946 foram de caráter nacional e procuravam alguns artificialmente, apoiar-se em ideias gerais. No curso do período de 1946-1964, começaram a reagir os fatores regionalistas, que desvirtuaram, pouco a pouco, o sentido nacional das novas agremiações. E, após o movimento armado mais recente, o Governo, pelo Ato Institucional nº 2 extinguiu todos os partidos.

 

Encontra-se agora o governo do marechal Castelo Branco sob o peso das mais graves responsabilidades ante a próxima reestruturação política do País: conciliar o Federalismo (condição da Unidade Nacional) com a linha política da União. A fórmula integralista “centralização política e descentralização administrativa” deve ser a chave para a solução do problema. Essa orientação não abrange apenas o que concerne às prerrogativas de autonomia política, mas também as estruturas econômicas. A inflação, com o poder emissor nas mãos do Governo Central, e os sistemas tributários enriquecedores da União e depauperadores dos Estados e Municípios, torna a autonomia dos Estados apenas uma expressão de direito e não de fato. Desequilibram-se os dois fatores históricos da Unidade Nacional.

 

Julgamos oportuno estas ponderações levadas aos responsáveis atuais pelo Governo da Nação.

terça-feira, 12 de abril de 2022

Três aspectos de uma questão (1936)

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças a generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando Melo, conhecido Líder Pró-Vida e possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca. Aos que desejarem conhecer mais trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://paulofernando.com.br

O Artigo foi publicado originalmente no “A Offensiva”, em 13 de Fevereiro de 1936

Três aspectos de uma questão (1936)

Plínio Salgado

Permite a Constituição da República a qualquer brasileiro, ou grupo de brasileiros, agir no sentido de modificá-la, ou substituí-la por outra Constituição, ou revogá-la, no todo ou em parte?

 

A Lei de Segurança Nacional, que é uma espécie de “Ato Adicional” da Constituição de Julho, tornando mais claro o pensamento da Carta Magna, evidencia que a qualquer brasileiro é lícita a liberdade de pregar, de disseminar, de propagar as ideias filosóficas ou políticas que entender, desde que não use de métodos violentos para implantá-las.

 

Examinando a Lei de Segurança Nacional e tendo em vista os dispositivos constitucionais relativos à liberdade política, a questão assume dois aspectos:

 

1º) – o aspecto constitucional, legal, legítimo, do uso e gozo, de liberdades políticas, religiosas ou filosóficas, isto é, o da propaganda pacífica, intelectual, cultural, das ideias tendentes à modificação, ou à própria substituição do regime, desde que essas ideias não envolvam o conselho da aplicação de métodos violentos, ou o incitamento à sedição, à rebelião contra as autoridades constituídas;

 

2º) – o aspecto inconstitucional, ilegal, ilegítimo, do abuso e da licença, isto é, a preparação da mazorca, o estímulo ao desacato à autoridade pública, a prescrição dos métodos violentos.

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No primeiro caso, poderemos enquadrar todos os partidos reformistas, como por exemplo, a “Acção Integralista Brasileira” que pretende, mediante a formação de uma consciência nacional nitidamente esclarecida e de uma mentalidade nova, formada por meio de uma nova cultural e um novo pensamento filosófico, substituir, sem quebrar a expressão formal da República Federativa e Presidencial, antes fortalecendo o regime republicano, tonificando o presidencialismo e dando possibilidades definitivas à subsistência da federação, substituir os processos de captação das vontades populares, colocando, em lugar dos partidos políticos, as corporações. Fundindo o fenômeno sindical ao fenômeno político, realizando a síntese do interesse econômico ao interesse cívico e administrativo, o Integralismo realiza o superamento de duas expressões das atividades sociais brasileiras e, desse modo, longe de esfacelar a República Federativa e Presidencialista, virá fortalecê-la, dando-lhe melhores condições de viabilidade prática e desincompatibilizando-a com as novas circunstâncias da vida contemporânea.

 

No segundo caso, podemos classificar o Comunismo. Esse prega a subversão, a desordem, a derrubada por golpe técnico do Poder Constituído; atenta contra a soberania nacional, que ele subordina a uma autoridade estrangeira; fere os princípios básicos da sociedade patrícia, que são os princípios de Deus, da Pátria e da Família; adota os métodos da violência e os propaga abertamente.

 

Eis, porém, que, além desses dois aspectos, surgiu agora um terceiro, com o qual jamais poderíamos contar e que está desafiando o estudo dos juristas, dos magistrados do país e, principalmente, do Governo da República, assim como os janízaros parlamentares que defendem a Constituição e a democracia-liberal com tanto ardor.

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É o caso da nova feição que tomou a política no Rio Grande do Sul. Tem-se ali um governo de gabinete. Legítimo parlamentarismo. E não se diga que não atenta contra o regime presidencialista consagrado na Carta de Julho de 1934. São os próprios líderes, que encaminharam as “démarches” para a solução do caso riograndense, os que confessam estarem fatigados do presidencialismo, que está falido, que nada mais pode dar de útil ao Brasil.

 

No Rio Grande do Sul, portanto, foi revogado o regime presidencial. Poderão dizer que não o foi constitucionalmente, ou que não houve nenhum dispositivo de lei atentatório da Carta Federal. Mas isso não será um argumento. Existe uma situação “de fato”, que implica uma interpretação “de direito”. Existe uma circunstância prática, da qual decorre a consagração de uma teoria política.

 

Apareceu, portanto, mais um caso a ser estudado pelos a quem incumbe a guarda e a vigilância da manutenção da intangibilidade do Supremo Estatuto Nacional.

 

Como poderão esses homens, de graves responsabilidades públicas, assumir uma atitude de combate ao comunismo, só porque prega a substituição do regime por métodos violentos, quando eles próprios desfecharam um golpe de Estado na Constituição Brasileira?

 

Quando a Lei de Segurança Nacional condena os métodos violentos, não o faz pelo simples fato de serem “métodos violentos”, pois os métodos violentos, em si, objetivando outras finalidades não políticas, ou mesmo nenhuma finalidade objetivando, são já punidos normalmente pelo Código Penal. Os métodos violentos são punidos pela Lei de Segurança, em razão de sua finalidade, isto é, na sua relação de ato criminoso com o seu móvel, que é a substituição do regime. O que interessa, pois, a Lei de Segurança, não é o ato em si, mas o seu móvel.

 

De sorte que uma revolução branca, sem derramamento de sangue, sem assalto a quartéis, como essa que praticamente realizaram os partidos do Rio Grande do Sul, é um ato punível pela Lei de Segurança Nacional.

 

Não faltarão recursos de sofismas às inteligências dos políticos gaúchos, entre os quais os srs. João Neves, Lindolfo Collor, Baptista Luzardo e à desenvoltura cavalheiresca do sr. Flores da Cunha, para justificar, com o brilho de que são capazes, a atitude que assumiram de flagrante transgressão do texto constitucional.

 

Esses argumentos, porém, que esperamos com o mais vivo interesse, adquirem um valor excepcional para a “Acção Integralista Brasileira” que se sentirá tanto melhor no cenário político da República, quanto mais convincentes forem os raciocínios de defesa aduzidos pelos partidos do Rio Grande.

 

Si o que se fez no Rio Grande é permitido pelo Governo da República e pelo Poder Judiciário, intérprete máximo da Constituição, fica o governo sem forças para combater o comunismo. Em compensação, fica a “Acção Integralista Brasileira”, mais do que nunca, numa posição da mais brilhante constitucionalidade.

 

O que se fez no Rio Grande do Sul eleva de tal maneira o Integralismo como partido legítimo, legal, fiel ao Estatuto básico da República, que respiramos na mais doce das tranquilidades.

 

Bem dizíamos nós que éramos impecáveis no respeito às disposições da Constituição e das leis do país; razões de sobra tinham os generais Pantaleão Pessoa e Góes Monteiro quando nos deram idêntico parecer; seguro estava o capitão Felinto Muller quando nos deu passaporte político, em recente entrevista; de peso eram as considerações do Conde Affonso Celso a nosso respeito; verazes os laudos dos juristas eminentes que sobre nós se pronunciaram; acertadas e jurídicas várias decisões de vários tribunais do país, concedendo-nos re(xxxxx)s legais; e carradas de razões, de pesadíssimas razões, tinha o sr. Getúlio Vargas, quando declarava duas vezes a imprensa que a “Acção Integralista Brasileira” não atentava contra o regime.

 

Meu trabalho na chefia do movimento do Sigma, tem sido muito simples; para fazer o nosso partido nacional, único da República, subir, cada vez mais, aos olhos dos brasileiros honestos: ir evidenciando as contradições dos nossos adversários.

 

E é assim que se cresce em força moral perante uma Nação.

domingo, 10 de abril de 2022

As Armas contra os Rinocerontes! (1968)

 


Esclarecimento: O Artigo abaixo foi publicado em jornal pelos “Diários Associados, mas, o recorte que dispomos não trazia a data da publicação. Felizmente, graças ao impressionante trabalho de pesquisa sobre o Integralismo em fontes primárias, o brilhante pesquisador Matheus Batista pode nos informar que a data da edição foi 03 de Julho de 1968.

Em breve, o Companheiro Matheus Batista publicará uma sensacional Obra sobre o Integralismo. Aguardem!

AS ARMAS CONTRA OS RINOCERONTES!

PLÍNIO SALGADO

O escritor inglês Wells, há alguns anos atrás, fez-nos uma revelação original: a de que toda a humanidade está se tornando louca e só não o percebemos por estarmos nela integrados. Sendo uma loucura coletiva, todos nela se ambientam, tornando-se, portanto, impossível discernir a verdade da mentira, o bem do mal, o belo do feio. Dessa forma decompõem-se os sentimentos morais, estéticos e lógicos.

 

Por outro lado, o teatrólogo Ionesco, não faz muito tempo, escreveu uma peça, que tem sido amplamente representada no teatro e no cinema, apresentando uma cidade onde os habitantes resolveram virar rinocerontes. O caso começa com alguns, estende-se a outros mais, domina a população. Um funcionário de certa firma dispõe-se a reagir, mas dentro em breve, o próprio diretor da organização industrial também se transforma em rinoceronte. Da sua janela, vê o rebelde a passagem da manada dos paquidermes, com grande estrupido, e isto mais o revolta, principalmente porque sua noiva já manifestara o desejo de acompanhar a moda de aderir ao consenso geral, convidando-o para fazer o mesmo. A esta altura, o advogado da firma em que trabalhava o homem de bom senso, vem procurá-lo para convencê-lo de que virar rinoceronte era um legítimo direito de todos os homens e mulheres que gozam da liberdade garantida pela democracia. Enquanto falava, nota aquele homem de equilíbrio mental que o advogado ia comendo as folhagens do seu vaso. Era sinal evidente que se ia transformando em rinoceronte. Realmente, não terminara a conversa quando o bacharel, com um urro sai correndo, desce o elevador, atinge a rua e se transmuda em paquiderme, como toda a multidão. Entra, em seguida, sua noiva, que critica os padrões da autoridade familiar e social, declarando “superados” os critérios antigos. É preciso que as novas gerações assumam atitudes de independência, de autodeterminação, de liberdade plena. Tudo o mais é passadismo ultrapassado da geração anterior que (diremos por nossa conta) não está “conscientizada” e insiste em pretender manter a tolice das tradições. Assim dizendo, solta um berro e corre desabaladamente para a rua, onde se integra na massa popular que se transformou em massa paquidérmica. Nesse momento, o herói do drama, que representava o bom senso, a lógica, o equilíbrio mental e a consciência da sua racionalidade, grita com todas as forças dos pulmões: “Eu não serei rinoceronte, porque eu sou e serei sempre um homem!”.

 

O que assistimos hoje em nosso país, como em todos os outros dessa chamada “civilização ocidental” não é mais do que, ampliada, a peça teatral de Ionesco. O raciocínio dos alienados é o seguinte: “todos usam, todos fazem, todos assim procedem, porque motivo também eu não usarei, não farei, não procederei?”. A onda dos rinocerontes empolga o magistério público e privado; envolve a alta sociedade e a classe média; predomina sobre a juventude; influi na demagogia política; traça normas artísticas; cria um tipo de literatura adequada ao rinocerontismo; e aí temos o nudismo consagrado e que já não causa a mínima impressão no seio das famílias; os rapazes de cabelos compridos e as moças e até as velhas de minissaias; o teatro sustentando que a pornografia é arte; o desregramento sexual declarando basear-se em princípios científicos da psicanálise e das constituições endocrínicas; a rebelião contra a autoridades dos pais (“ultrapassados” e “quadrados”); a insurreição contra os governos, sem que se saiba ao certo o que pretendem os insurretos; o desrespeito aos mestres honrados e honestos e a tábua rasa que se faz das pessoas mais idosas que, na opinião de alguns professores que se fizeram agentes da corrupção, devem ser “conscientizados” pelos garotos e garotas que os Código Penal e Civil declaram irresponsáveis. Acrescente-se a isso a extrema liberdade concedida por pais (que não merecem o pátrio poder) às suas filhas menores e muito mais aos filhos que se fazem “play-boys”; a vida noturna de ambos os sexos estimulada pelo álcool, pela maconha, pelos barbitúricos e garantida por drogas anticoncepcionais; a desordem dos costumes segundo uma concepção existencialista que faz do ser humano um animal sem finalidade, e teremos o quadro geral das nações do ocidente, minadas pelo comunismo, ou seja pelos que pretendem escravizar, domar, esmagar uma sociedade que perdeu a consciência de si mesma e se transformou numa desordenada manada de rinocerontes.

 

Todas estas ponderações tenho feito numa série de artigos insertos nestas colunas, nos quais tenho procurado demonstrar que sob dois aspectos deveremos considerar o mundo codental: o do agnosticismo e pragmatismo das classes chamadas dirigentes (políticos, industriais, comerciantes, financistas) e o do existencialismo da juventude e do povo, de modo geral. Em um dos meus últimos escritos, falei de um novo politeísmo, cujos deuses abstrusos são as máquinas e de uma religião que hoje se chama “tecnologia”.

 

Vem agora o Papa Paulo VI e em impressionante discurso atribui a atual crise em todos os países “às turbulentas ideias dominantes no mundo contemporâneo” acrescentando que a “a falta de fé se deve parcialmente ao crescimento da mentalidade tecnológica” E diz: “A tecnologia levou a uma organização opressora e à consequente angústia que decorre dos próprios limites do círculo materialista e precisamente, nestes dias, explode em rebeliões violentas e irracionais”.

 

Também em confirmação do que tenho dito, o grande escrito português Augusto de Castro, diretor do “Diário de Notícias” de Lisboa, diplomata dos mais brilhantes, membro da Academia de Ciências, mas sobretudo um dos espíritos mais argutos dentre os que tenho conhecido, escreve um artigo para os Associados, sob o título “Reflexo da crise de autoridade”, comentando as recentes desordens na França, no qual, entre outras considerações, diz: “A crise que se revela e ameaça o mundo não é apenas aquela que, nos domínios político e social, dominou os acontecimentos em Paris. Não é somente a dos problemas da educação e sociais. Não é apenas econômica nem de mera ação de rua. É uma crise de Autoridade em todos os domínios: da autoridade familiar, da autoridade política, da autoridade internacional, da autoridade educativa, da própria autoridade religiosa”.

 

Comentando uma frase do “Izvestia”, de Moscou, que dizia “os franceses vão depressa demais”, Augusto de Castro declara: “Não iam apenas depressa; na realidade, não iam para parte alguma, a não ser para a balbúrdia, para a anarquia, uns com os pensamentos de Mao, que se caracterizam precisamente pela ausência do pensamento, outros com slogans desprovidos de sentido ideológico ou real. Era também, na própria subversão, a ausência de qualquer autoridade”.

 

Analisando as causas da derrocada da autoridade, a notável perspicácia do escritor ilustre expõe a sua opinião que é de rara clarividência, dizendo: “O que determinou no mundo esta crise de autoridade, que é o mal do nosso tempo, é difícil definir. Duma maneira geral, foi a doença do “diverso”, que após a guerra, se apoderou dos espíritos. O mundo proclamou o advento do “diverso” em arte, do “diverso” em literatura”, do “diverso” em política, até do “diverso” na religião. Do “diverso” sem se saber bem de quê. O próprio comunismo foi atacado pelo vírus do “diverso” e fez-se o comunismo chinês”.

 

Esta interpretação de quanto ocorre no mundo atual é prefeita, mas para completá-la temos de ir às causas que determinaram esse estado de espírito e estas devem ser buscadas na confusão das ideias disseminadas por filósofos e pensadores dos séculos XVII (Racionalismo), XVIII (Naturalismo), XIX (Experimentalismo Científico) e XX (Tecnologia). Dessas linhas gerais procederam o utilitarismo inglês, o pragmatismo americano, o positivismo francês, o criticismo kantiano, a dialética hegeliana, o panteísmo de Hartman, o monismo de Haeckel, o evolucionismo de Spencer, o anarquismo de Prudhon e Kropotkine, o socialismo de Marx, o sexualismo de Feud, o existencialismo de Kierkegard e depois de Sartre, o anticristianismo de Niestzche, todos com seus derivados, que se multiplicam, não se falando na contribuição vastíssima da literatura, em seus variados gêneros e as artes plásticas e musicais em suas variadas expressões. Foi tudo isso que criou o espírito do “diverso” tão argutamente descoberto por Augusto de Castro. E o “diverso” não é mais do que a manifestação da angústia do Homem deslocado do seu centro de equilíbrio, como já observara profeticamente Pascal, sem poder recuperar sua posição verdadeira ainda que aflitivamente venha tateando nas trevas impenetráveis.

 

Tivemos, no Brasil, um grande filósofo, que arrasou, mediante análises escalpelantes as filosofias materialistas do seu tempo. Foi Farias Brito. Os seus livros “Finalidade do Mundo”, “O Mundo interior” e seus opúsculos “A verdade como regra das ações” e “Base física do espírito” constituíram o início de um movimento espiritualista que deve ser continuado, com a atualização dos conhecimentos adquiridos mais recentemente, nestes últimos cinquenta anos de unilateralidade científica e de fanatismo tecnológico.

 

Esse tem sido o meu esforço, objetivando criar uma nova geração, isenta do cativeiro dos ditadores das falsas filosofias, produtos das elucubrações dos que não se sentem, eles próprios, seguros de suas concepções e outra coisa não fazem senão lançar maior confusão sobre a que tínhamos herdado das gerações precedentes. Precisamos de uma revolução, mas uma revolução autêntica da mocidade, contra a rotina, as frases feitas, as ideias e costumes aceitos passivamente pelas mediocridades internacionais e pela burguesia capitalista inconsciente. O lema deve ser, para tomarmos a interpretação da nossa contemporaneidade tão admiravelmente revelada por Ionesco: combate aos rinocerontes.

sábado, 9 de abril de 2022

O PROBLEMA DAS DÍVIDAS EXTERNAS (1936)

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças a generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando Melo, conhecido Líder Pró-Vida e possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://paulofernando.com.br

O Artigo foi publicado originalmente no “A Offensiva”, em 05 de Fevereiro de 1936.

O PROBLEMA DAS DÍVIDAS EXTERNAS
PLÍNIO SALGADO 

O sr. Assis Chateaubriand, mentalidade brilhante porém viciada no método unilateral do raciocínio liberal-democrático, fez cavalo de batalha, pelas colunas de “O Jornal” e do “Diário de São Paulo”, a propósito da contradição em que diz ter apanhado um editorial da A OFFENSIVA e os pontos de vista do Sr. Marcos de Souza Dantas a propósito das nossa dívidas externas. 

O que é preciso, nesse caso ou em qualquer outro, é não considerar os fatos isoladamente, mas concatená-los, apreendendo o sentido lógico de cada um, ligado ao sentido geral de um a atitude. É preciso também distinguir as situações (a liberal-democrática vigente e a integralista que se aproxima) e, dentro da lógica de cada uma dessas situações, analisar, e compreender as atitudes e críticas oriundas de circunstancias especiais. Cumpre ainda, para se seguir um método rigoroso e interpretação dos fatos, distinguir o que é “doutrina” do que é a sua aplicação. Tudo isso compreende a mentalidade modesta de qualquer camisa verde, por mais humilde que seja, mas não pode compreender a inteligência brilhante de um homem habituado às unilateralidades da crítica liberal-democrática. 

Eu me encontrava sexta-feira em Belo Horizonte, de onde, segundo o “Diário da Noite”, do sr. Chateaubriand, teria saído precipitadamente por insinuação da polícia, como revolucionário perigoso (fato que o digno chefe de Polícia da capital mineira desmentiu de maneira categórica), quando a A OFFENSIVA estampou o artigo em torno do qual o diretor d
os “associados” está fazendo a sua tempestadezinha. 

Neste caso do artigo contra o Sr. Juracy Magalhães, pelo fato de ter o governador da Bahia suspendido o pagamento das dívidas do Estado, lendo-o, submeti-o à lógica do regime vigente e não me inquietei, em absoluto.

No manifesto programa com que o Integralismo vai pleitear eleições municipais, estaduais e as presidenciais da República, está claro o meu pensamento sobre as dívidas externas, pensamento, aliás, que coincide perfeitamente com o do Sr. Marcos de Souza Dantas. 

É preciso ter-se em vista que o Sr. Chateaubriand, de propósito,tem deturpado o próprio pensamento do sr. Marcos de Souza Dantas. Este nosso companheiro não é partidário do calote. O que ele quer é, exatamente, o que está estampado no meu manifesto programa, no art. 4º, capítulo 2º, em que escrevi:
“Revisar os contratos dos empréstimos públicos e dívidas dos Estados, nacionais e internacionais, promovendo-se a liquidação sem sacrifício da economia brasileira, nem dos interesses legítimos do comércio importador e exportador, observados os interesses legítimos de justiça, o direito de vida da Nação, a dignidade da Pátria e desenvolvimento das trocas de mercadorias com o exterior”. 

Este sempre foi o pensamento do sr. Marcos de Souza Dantas e este pensamento coincide com o do Integralismo, razão pela qual aquele nosso companheiro vestiu a camisa verde. 

Ora, o artigo da a AOFFENSIVA que, à primeira vista, pode causar estranheza, basta analisá-lo e verificar-se-á que ele foi escrito dentro da lógica, do regime vigente e até com muita precisão e oportunidade. 

Não é o sr. Juracy Magalhães, na Bahia, um adversário franco do Integralismo? Não se tornou aquele governador, ao qual devo, aliás, as maiores atenções e gentilezas pessoais, um perseguidor implacável dos camisas verdes baianos? Pois então, como assume uma atitude que fere de morte os princípios liberais-democráticos que ele defende? 

O Integralismo é, sobretudo, a doutrina que pretende restaurar, no Brasil, uma coisa que se diz muito comum, porém, que é muito rara: o senso comum. 

Vivemos em continuas contradições, a propósito de tudo. 

O Integralismo não pretende entrar no país como o macaco em loja de louças. 

Preliminarmente: o problema das dívidas externas tem de ser resolvido em conjunto e não isoladamente, em cada Estado; segundo: o Integralismo, antes de tudo, como está claro no seu manifesto programa, quer “realizar os contratos”, quer estudá-los atentamente para, em seguida, “promover a sua liquidação, sem sacrifício da economia brasileira, do comércio importador e exportador, etc.”; terceiro: dentro do regime liberal-democrático, do espírito jurídico que o orienta, é um verdadeiro absurdo qualquer medida da natureza da que tomou o governador da Bahia. 

Nestas condições continuamos dentro da nossa doutrina e em perfeito acordo com ela está o nosso companheiro Marcos de Souza Dantas. 

Aliás, o sentido que quiseram emprestar à entrevista do sr. Marcos de Souza Dantas, foi por este categoricamente desmentido em nosso número de ontem, com esclarecimentos precisos, que colocam este assunto nos seus devidos termos. 

Foi, portanto, inútil mais esta manobra dos “Diários Associados”, assim como as largas considerações em que se perdeu o sr. Assis Chateaubriand, pretendendo criar uma crise no Integralismo, coisa tão impossível e absurda que desafiamos todos os liberais-democratas com seu exército de jornalistas e seu aparelhamento de agências telegráficas para conseguirem provocá-la. 

Continuamos, como acentuou o companheiro Souza Dantas, coerentes com a nossa doutrina que é a constante do manifesto programa que lancei há dias. 

Não faço, como afirmou o sr. Chateaubriand, uma campanha contra os banqueiros internacionais por simples humorismo. Continuamos firmes e perseverantes na linha de doutrina e de conduta que nos traçamos, apenas, cada vez mais maravilhados diante das incoerências dos liberais-democratas como o sr. Juracy Magalhães, e os sofismas do sr. Chateaubriand.