segunda-feira, 2 de outubro de 2023

CINZAS... (27/02/1936)

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

CINZAS... (27/02/1936)

Plínio Salgado

"Memento homo..." Morrem no espaço os últimos ecos dos últimos cordões; há nos ouvidos, o rumor surdo e insistente dos últimos sambas; o clamor das multidões alegres. Lá se foi o Carnaval...

No contraste entre os três dias de Folia e o dia lilás das Cinzas, a Igreja nos inspira o mais impressionante dos simbolismos. É nesta manhã, única no ano, que o Homem há de se lembrar que é pó e em pó se tornará.

Nestas horas fatigadas, há um recolhimento para todas as sensibilidades finas. Deve também esse vago sentimento de amargura e ao mesmo tempo de realidade, penetrar a alma de uma Nação.

Sobre a testa do Brasil, podemos também fazer uma cruz de cinza. Com a cinza dos escombros do Quartel do 3º Regimento. Talvez com a cinza dos próprios filhos deste país que tombaram mortos na defesa da honra nacional.

Memento Pátria!

Sim: lembra-te, Pátria, que poderás mais rapidamente transformar-te em cinzas.

É certo que todos os povos e todas as nações passam. É certo que os séculos desfilam e sobre velhas humanidades nascem humanidades novas. Sim; é bem certo. Mas é certo também que há povos que desaparecem deixando uma lembrança de dignidade e de força; e outros há que sucumbem, rapidamente, deixando uma recordação de miséria e de cativeiro.

Hoje, o camisa-verde toma também um pouco da cinza das revoluções frequentes que têm ensanguentado o solo brasileiro; a cinza dos campos devastados nas revoluções de 24, em S. Paulo e no Rio Grande; a cinza das destruições no Nordeste e nos planaltos do Paraná, junto a Itararé; a cinza das cidades saqueadas, dos sítios depredados, das fazendas arrasadas, da guerra de 1932; essa argila empapada pelo sangue dos moços paulistas, nordestinos, gaúchos, mineiros, paranaenses e pelas últimas lágrimas dos que morreram bravamente, com retrato de mãe, de esposa, de noiva, de filha, no bolso da farda, e é com essa terra da nossa terra, com esse sangue do nosso sangue, que o camisa-verde unge a tua fronte, ó Pátria, perguntando-te:

- Até quando permitirás que os partidos estadualistas armem os brasileiros contra seus próprios irmãos?

Penetrado pela meditação profunda sobre os teus destinos, ó Pátria, o camisa-verde sofre a tua escravidão ignominiosa ao argentarismo estrangeiro; a tua humilhação, vilipendiada pela propaganda bolchevista, que fere as tuas tradições de honra e delicadeza de sentimento, e pergunta:

- Até quando, Pátria, consentirás em ser infeliz escrava, quando podes levantar-te para seres senhora soberana?

Olhando para os campos, as matas, os chapadões da nossa terra, o camisa-verde vê seus irmãos caboclos, sofrendo na gleba, há cento e tantos anos. Sente o abandono e a dor do seringueiro do Amazonas, do vaqueiro do Nordeste, do garimpeiro de Goiás e Mato Grosso, do ervateiro, do boiadeiro, do sitiante, do colono, do agregado, do jornaleiro, dos remeiros, dos peões, dos carreteiros, e pergunta:

- Até quando, Brasil, teu povo há de ser, assim, tão pobre e tão trabalhador; tão caluniado e tão honesto; tão desprezado e tão hospitaleiro; tão injuriado e tão valente?

E, pondo os olhos nas fábricas, nos quartéis, nos bairros operários, nos mocambos, nas favelas, nos canudos, onde uma população de operários, de soldados, de párias, curte todas as privações ignoradas, o camisa-verde exclama:

- Até quando os construtores de tuas riquezas, Brasil, no desespero de seu sofrimento, se deixarão arrastar pelas ideias dissolventes, escravizar-se por aqueles que pretendem transforma-los em máquinas humanas, sem família, sem Deus, sem liberdade, como já acontece na Rússia?

Por mais que os políticos charlatães cantem a canção do otimismo com que embalam a inconsciência das massas populares, tão sofredoras e tão alheias às causas de seus males; os camisas-verdes dizem-te, neste dia, a verdade suprema, de uma grandeza trágica, marcando-te a fronte, ó Pátria, com as cinzas de todos os teus desastres e de todos os teus crimes, e de todos os teus sofrimentos:

- Lembra-te, Pátria, que viverás com os camisas-verdes e sem eles desaparecerás!

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 27 de Fevereiro de 1936.

Nenhum comentário:

Postar um comentário