quinta-feira, 29 de agosto de 2024

A Pátria, acima de tudo! (09/05/1936)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

A Pátria, acima de tudo! (09/05/1936)

PLÍNIO SALGADO

Três hipóteses se apresentam ao nosso espírito em face da situação nacional:

1ª) - A situação do país é gravíssima;

2ª) - A situação é apenas grave;

3ª) - A situação não é grave.

Na primeira hipótese, devemos examinar em que consiste uma situação gravíssima. Evidentemente que ela consiste em circunstancias que se refletem nas próprias relações internacionais do país; é o caso da intervenção em nossa vida interna de um inimigo estrangeiro, ou a ameaça premente da invasão do nosso território. Nesta emergência, o Governo precisa encontrar-se armado de meios, de modo a defender com a máxima eficiência e rapidez a soberania nacional e a honra da Pátria. Temos diante de nós o caso típico do "estado de guerra". Defendido pela legislação em vigor esse "estado de guerra" suspende todas as garantias constitucionais, relativas à liberdade de pensamento, de reunião, de propaganda, de atuação política, ficando essa liberdade condicionada ao Juízo do próprio Poder Executivo, que decide, a favor ou contra, através das autoridades que hierarquicamente o encarnam.

Esse eclipse necessário das liberdades públicas, essa restrição da amplitude do exercício dos direitos democráticos, para surtir seus completos efeitos terá como consequência lógica a ineficácia de quaisquer institutos assecuratórios dos referidos direitos, dando-se por suspensas as concessões de mandados ou outros remédios jurídicos por parte de juízos ou tribunais do país; porquanto seria insuficiente a abolição das liberdades pelo Executivo, quando o Judiciário lhe anulasse a possibilidade de ação.

Que resulta disso? Resulta que "estado de guerra" firma o princípio da prioridade absoluta do Poder Executivo durante período de sua vigência. Firmado esse princípio, que decorre dele? Decorre que, tanto em teoria, como na prática, os Poderes Judiciário e Legislativo cessam de funcionar, este, de um modo completo, e aquele em tudo o que disser respeito a quaisquer recursos ou ações referentes aos reclamos das liberdades públicas asseguradas pela Constituição e pela Legislação em vigor nas épocas normais.

Agora, da suspensão temporária dos Poderes Legislativo e Judiciário, quais serão as consequências? Essas consequências são todas aquelas que decorram do princípio firmado de que o Governo Federal não deve encontrar óbices de espécie alguma nas atividades repressoras da anarquia ou da guerra que se levantam contra o Estado Nacional. Não existindo os Poderes Legislativo e Judiciário, temos 1º - não há imunidade parlamentares nem garantias especiais à magistratura, 2º) - a autonomia dos Estados sofre as restrições decorrentes da declaração da prioridade do Executivo Federal sobre os dois outros poderes da União, porquanto, se em matéria de providencias de ordem policial ou militar, aqueles poderes podem criar embaraços, muito maiores embaraços poderiam criar outros tantos Executivos agindo por conta própria e muitas vezes em divergência com os supremos interesses nacionais.

Aberto um parêntesis na normalidade da vida constitucional, deixando de, virtualmente, existir, para interpretarmos os estritos termos legais referentes ao "estado de guerra", o Legislativo, através do qual se manifesta a opinião pública, e o Judiciário, que garante a execução da Lei Eleitoral, a interpretação exata da Lei de Segurança Nacional, a aplicação concreta dos textos da Constituição, logicamente serão nulas todas as eleições realizadas na vigência do "estado de guerra".

O direito do voto, principalmente depois que entrou em vigor a nova Lei Eleitoral que objetiva, de modo claro, po(...) expresso, a representação partidária, só se torna efetivo mediante o exercício de vários direitos que lhe são forçosamente inerentes: o direito de reunião, o direito de propaganda, o direito de locomoção.

Ora, esses direitos não existem no "estado de guerra". A Lei Eleitoral, por exemplo, proíbe aos partidos a propaganda quarenta e oito horas antes da eleição; é exatamente dentro desse período que o governo suspende o "estado de guerra" para a realização do comício eleitoral.

Essas são as consequências do “estado guerra”, tão necessário na hora presente, consoante o que se infere das informações do Poder Executivo.

Aceita, pois, a hipótese de que a situação do país é gravíssima, só nos portaremos com patriotismo e dignidade, aprovando e até aplaudindo "estado de guerra". E uma vez que aprovemos e aplaudamos, teremos de concordar, e jamais nos rebelarmos contra as consequências de remédio heroico, de uma providência cauterizante, a que foi levado o Governo, em um momento doloroso da vida nacional.

Regulamentar o "estado de guerra" será reconhecer que a situação não é gravíssima, porém apenas grave. Ora, se assim é, basta aplicar ao país o "estado de sítio", de menores efeitos, ou até mesmo, socorrermo-nos tão só da legislação em vigor: a Lei de Segurança Nacional, os Códigos Penais.

Mas eu pergunto: quem saberá melhor do que o Executivo das necessidades imediatas do Brasil, no tocante à Segurança Nacional?

Acaso o Legislativo?

Mas não foi Legislativo que, nas vésperas de rebentar a revolução comunista de novembro, votou, por 80 votos contra 72, uma indicação ao presidente da República, para que, ou "fechasse a Acção Integralista Brasileira", ou "reabrisse a Aliança Nacional Libertadora"?

As Chefaturas de Polícia de todo o país e os Comandos das Regiões Militares verificaram, dias depois dessa atitude da Câmara, que a Aliança Nacional Libertadora estava envolvida como personagem de primeiro plano, na revolução de novembro. Essas mesmas autoridades verificaram os relevantes serviços prestados, na defesa da Ordem e do Governo da República, pela Acção Integralista Brasileira, tendo disso dado testemunhos públicos o chefe de Polícia da Capital Federal e o próprio presidente da República, em expressivo telegrama ao Chefe do Integralismo,

Como pode a Nação confiar no Poder Legislativo, quando ele, na melhor das hipóteses, para não o acusarmos, nem de leve, de conivência com os comunistas, se mostrou tão mal informado, nas vésperas da intentona de novembro?

Por uma coincidência, naqueles dias, os jornais publicavam uma correspondência de Moscou, dando conta dos trabalhos do Congresso da Internacional Comunista, e reproduzindo considerações de Dimitroff, em discurso através do qual afirmava que os comunistas brasileiros iriam manobrai o nosso Legislativo, no intuito do combater o Integralismo, como ato preparatório da insurreição bolchevista.

Não quero acusar os nossos patrícios, com assento na Câmara Federal, do conhecimento dessa pérfida manobra da Rússia, império com o qual devemos nos considerar em guerra, pela petulância e menosprezo a nossa dignidade de Povo Livre, revelada na ingerencia em assuntos de nossa política interna. Não: eu ainda creio no patriotismo da Câmara e do Senado Federais. Não posso conceber que esses homens, tão atacados e às vezes injustamente caluniados em razão de males que não deles, mas do sistema político decorrem, não posso conceber que, pais família, cristãos e brasileiros, que o são e muitos até paradigmas de tradições legítimas, dessem por tão barato o interesse nacional, subordinando-o a caprichos fúteis.

Mas o em que me firmo é no seu desconhecimento habitual por parte do Legislativo, das tramas ardilosas e hábeis maquiavelismos, que só o Executivo, pela sua ação constante e vigilância incansável, pode conhecer nos seus mínimos pormenores, muitos dos quais, no interesse mesmo da Nação. No caso de serem levados à arena dos debates parlamentares, prejudicariam a defesa nacional.

Ainda está quente e fumegante o sangue dos militares que, na defesa dos lares brasileiros, entre os quais os dos próprios congressistas, tombaram nos dias trágicos de novembro. Cumpre pensemos nisso, antes que nos aferremos prerrogativas que, no momento, devemos renunciar em holocausto a nossa Pátria e ao sacrifício de nossos irmãos militares que ainda estão arriscados a morrer por nós, pelas nossas famílias.

Não queremos nós, os integralistas, nenhum mal aos senhores deputados senadores, antes, pelo contrario, desejamos a suas famílias, a sua religião, a sua liberdade, tanto quanto de bem aspiramos para todos os camisas-verdes; entendemos, no entanto, que a hora é para que tenhamos, todos nós, muito juízo, muito bom senso, sufocando em nós todas as vaidades.

Que o Poder Executivo, e ele, que responde diretamente pela honra nacional, decida de tudo, neste momento.

Se, porém, a situação não é grave, o que constitui a terceira das hipóteses acima aventadas, neste caso, nem "estado de guerra", nem "estado de sitio" se justificariam.

Não podemos, em todo o caso, brincar num instante como este. E brincadeira será sempre toda qualquer manobra que elementos extremistas disfarçados e habilíssimos executarem no Legislativo, abusando da boa fé de honrados pais de família, que ali tem assento, para que votem de acordo com inconfessáveis desígnios de inimigos que a eles próprios, deputados e senadores, pretendem trucidar.

Que jamais nas horas sérias, em quaisquer episódios da vida parlamentar, mesmo o das eleições internas de comissões, quando todo Brasil aflito quer confiar nos homens de responsabilidade, tenhamos o espetáculo de um Senado de Calígula, resolvendo, sobre as desgraças de Roma, qual melhor molho de peixe.

Nós, integralistas, ainda acreditamos que não nos faltará, a nós, brasileiros, de todos os partidos e de todas as condições, essa coisa tão indispensável e que, por mais que pareça vulgar, é rara e preciosa: juízo.

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 09 de Maio de 1936.

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