Esclarecimento:
A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa
colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo
pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que
nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo
Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo
Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/
PACIFICAÇÃO (02/05/1936)
Plínio Salgado
Também na
Europa se desejou a pacificação.
O sr. Samael Hoare
pronunciou-se. O sr. Sarraut soltou algumas palavras. Ouviram-se alguns tiros.
Eram as tropas fascistas que invadiam a Abissínia.
O sr. Antonio
Eden, o sr. John Simon, mexeram-se. Ouviram-se alguns tiros mais longínquos.
Era na Ásia. Os japoneses estavam em Mandchukuo.
O sr. Brun, o
sr. Flandin, o sr. Lloyd George deram entrevistas à imprensa. Logo escutaram alguns
rumores de tropas marchando. Era a Alemanha que vinha ocupar as fronteiras
francesas.
Então, os
srs. Tardieu, Herriot, Chamberlain, Brun, Flandin, Simon, Eden, Hoare, Sarraut,
Stanley, Baldwin, Erc Phips, Daladier, agitaram-se clamando pela pacificação.
Mas, logo em seguida, verificaram que a thoria era uma coisa muito diferente da
prática, que o idealismo não correspondia à realidade, que os métodos
liberais-democráticos jamais poderiam pacificar o mundo.
Nem por isso
desanimaram. Começaram a viajar abaixo e acima. De Londres a Paris, de Paris a
Londres. De Genebra para toda a parte. Tudo inutil e desmoralizador.
Foi assim
que, também na Europa, tentaram pacificação. A pacificação era impossível como
impossível será em toda a parte onde houver interesses de grupos contra os
interesses gerais.
Ainda agora,
na Câmara Inglesa, registra-se uma das páginas mais deliciosas do velho humorismo
britânico.
Sim. Uma
coisa não foi destruída na Europa: aquele imperturbável "humor", que
vinha de Dickens, que esteve sempre na atitude fleumática dos velhos Lords ou dos
mais humildes frequentadores dos "bars" junto ao Tamisa, onde se toma
um gole de "gin", ou de "whisky", entre duas palavras
graves de legítima ironia.
Já tardava a
graça exótica e singularíssima da velha Albion. Já o mundo esperava da Pátria
de Bernard Shaw e de Chesterton, uma atitude digna da tradição humorística da
Grã-Bretanha.
E, afinal, apareceu
na Câmara Inglesa, a atitude que nos faltava. Um deputado apresentou, com ar
grave, como convêm a um genuíno humorista, e fazendo mesmo gestos trágicos, uma
série de atos que ele considera muito expressivos da situação europeia.
Esses atos
são os seguintes:
1. Violação
do Tratado de Versalhes - Remilitarização da Alemanha.
2. Idem e
violação do Tratado de Locarno - Entrada das tropas alemãs na Renânia.
3. Violação
do Tratado de St. Germain - Remilitarização da Áustria.
4. Violação
do Tratado de Lausanne. - Refortificação dos Dardanellos.
5. Fracasso da
Conferência Naval de Londres - Não estabelecimento de limites para as construções
navais.
6. Violação
do "Covenant" da Liga das Nações - Guerra ítalo-etiópica.
7. Violação
do convenio contra o uso de gazes tóxicos - Guerra ítalo-etiópica.
8. Tensão na
fronteira da Mongólia e Mandchukuo - Possibilidade de revisão dos mandatos da
Liga das Nações.
9. Ingerência
da União Soviética na Europa Ocidental - Pacto franco-soviético.
10. Aplicação
das sanções - Tensão anglo-italiana.
11. Armamentismo
excessivo – Enormes orçamentos militares das potências.
Como se vê, é
maravilha! E o mais extraordinário é que a Câmara Inglesa, correspondendo ao
humorismo do deputado, não riu. Pelo contrário, agitou-se. Ilustres
parlamentares assumiram mesmo atitudes violentas, enérgicas, alarmadíssimas.
Tudo para
fazer rir o mundo. E toda a Europa riu na tarde de anteontem. Uma imensa risada
rastilhou pela margem do Tamisa, atingiu Callais, estrondou na França. A
hilaridade atingiu Genebra, Berlim, Roma, os Balcans, e o turco que, às margens
do Bósforo fumava tranquilamente o seu "narghile", desatou a rir,
despertando os gregos vizinhos e as colônias mediterrâneas. A fria Escandinávia,
a florida Holanda, a Beélgica, a Dinamarca, tudo riu. Foi uma tarde de bom
humor prodigalizada pela Câmara Inglesa, que desempenhou o papel que lhe
competia nesta hora do mundo.
Foi assim que
a liberal-democracia começou a morrer, sem tristeza no planeta. Foi assim que
ninguém mais acreditou em pacificações, nem no mundo internacional, nem no
mundo das políticas nacionais, nem mesmo nos municípios, onde os coronéis
disputam o prestígio local.
Pacificação
só se faz com uma coisa: autoridade.
Autoridade só
se faz com uma coisa: renúncia a interesses imediatos, visão superior de
interesses gerais.
Enquanto
houver partidos, não há pacificação Será, pois, inútil que a Europa tente
pacificar-se.
E, por falar
em pacificação da Europa, haverá quem acredite nessa palavra, por exemplo, em
Santa Luzia do Olho d'Agua, ou na capital de algum país da América do Sul?
Publicado orginalmente
n’A OFFENSIVA, em 02 de Maio de
1936.
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