domingo, 1 de outubro de 2023

Pormenores da paisagem política (03/03/1936)

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

Pormenores da paisagem política (03/03/1936)

Plínio Salgado

No panorama geral da política brasileira é interessante observar os pormenores da paisagem, tão expressivos dos dias que vivemos e até certo ponto denunciadores dos primeiros delineamentos da campanha pela sucessão presidencial da República.

Nenhum desses pormenores - excluídas as marchas e contra marchas das correntes e os conchavos destes últimos dias - são tão expressivos como a realização das eleições municipais em todo o país.

Essas eleições municipais, nos dias presentes, ganham uma significação muito profunda. Nunca esses pleitos locais, que dizem respeito a problemas de estrita órbita municipal, adquiriram tão súbita importância.

É que eles constituem um balanço de forças. Essas forças exprimem todas as possibilidades de participação das correntes nos pródromos, no processo geral e no desfecho do problema da sucessão presidencial.

Pela maneira como se portam as situações dos Estados em referência às oposições, pode-se, até certo ponto, deduzir qual o grau de interesse que o governo em questão põe na solução do máximo problema político; pela maneira como tratam certas correntes, pode-se deduzir quais os rumos que as marchas e contra marchas dos bastidores estão tomando nos dias correntes...

A participação do Integralismo nessas eleições municipais em todo o país, tem também uma significação muito grande. É o balanço das forças do Sigma. Veremos com que contam os camisas-verdes para se alinharem na batalha pacífica das urnas logo que cheguem os dias de se cogitar de dar sucessor ao sr. Getúlio Vargas.

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Cumpre observar que o Integralismo não é constituído apenas de massas eleitorais. O Integralismo é um partido político de âmbito nacional; como tal foi registrado no Superior Tribunal Eleitoral; como tal age, dentro da Constituição, da Lei Eleitoral da República, da própria Lei de Segurança Nacional; como tal, se apresenta no país, como a única força política organizada no alto sentido da Unidade da Pátria, da Unidade do Pensamento, da Unidade do Sentimento. Entretanto, o Integralismo, de um modo mais amplo, considerado como movimento cultural e educacional atuante no meio brasileiro, contém o "partido político", não é contido por este. Um partido político nacional já é uma coisa tão grandiosa, que deslumbra todos aqueles que têm acompanhado as extremas dificuldades, as impossibilidades mesmo que se têm apresentado a quantos neste país tentaram a realização desse Ideal político, diante do qual tombaram inúteis e impotentes grandes homens como Pinheiro Machado, Ruy Barbosa, Nilo Peçanha, e os últimos próceres da revolução de 30. Não há político brasileiro, experimentado nas lutas partidárias, conhecedor das realidades do país, que não se maravilhe diante do que já realizamos: o partido nacional. Entretanto, fizemos muito mais: o partido nacional é um dos aspectos de um "sistema" muito maior e verdadeiramente imponente, que é a "Acção Integralista Brasileira", como organização cultural, educacional, em atividade que exerce em todos os sectores da vida do país.

Ora, assim sendo, é o Integralismo uma corrente cuja força não se avalia apenas pelos índices eleitorais, que apenas mostram um dos seus aspectos. Inscrevem-se nas fileiras dos camisas-verdes os homens mais cultos do país, como vimos ainda recentemente, com a adesão do sr. Lucio dos Santos, glória legítima da ciência em Minas Gerais, e alistam-se, igualmente, os humildes, analfabetos. Somos a única corrente que inscreve também analfabetos... São brasileiros. Sofrem as agruras de uma condição social humilhante e, num dado momento, pela honra da Pátria, pela glória da Nação, poderão dar, não o voto, mas a própria vida!

Façamos abstração, no entanto, dessas massas que agem debaixo da bandeira do Sigma. Consideremos, exclusivamente, os coeficientes eleitorais. Já realizámos eleições em cinco Estados. Levámos para mais de 70.000 votos. Já elegemos perto de 200 vereadores. Fizemos vários prefeitos.

Na Bahia, a pressão governamental foi enorme. Sentiu-se, perfeitamente, que o sr. Juracy Magalhães está empenhado no caso da sucessão presidencial da República. Ali as perseguições foram enormes. Por que a nossa força na Bahia é um fato que já ninguém contesta.

Temos, agora, as eleições em Santa Catharina, São Paulo e Ceará. São três províncias importantes para os camisas-verdes.

Como se portarão os governos nesses Estados?

Eis a pergunta.

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O "estado de sitio" não foi decretado para se perseguirem partidos políticos, nem para deixar os governos estaduais na magnífica situação de realizarem o prélio eleitoral sem concorrentes... Isso seria vergonha para os governadores dos Estados. Seria perante o Povo Brasileiro, perante a História do Brasil, esses homens aparecerem como os ladrões de cadáveres de Waterloo...

Pelo que tenho observado em São Paulo, o sr. Armando de Salles Oliveira não vae criar dificuldades às oposições. O "estado de sítio" coincidindo com as eleições municipais, vae mostrar quais os governadores covardes, miseráveis, de estofo moral aviltante, assim como tornar patente quais aqueles que serão cavalheiros, fidalgos, conscientes de uma elegância moral indispensável aos que pretendem se impor à admiração nacional.

Há nestas coisas de política, como nas coisas da vida particular ou pública dos homens, certas delicadezas, certos gestos, que constituem o que poderemos chamar a "ética da luta".

De quanto pude observar no Interior Paulista, de onde acabo de regressar, chego à conclusão de que o sr. Armando de Salles Oliveira não transgredirá essa "ética". Não se mostrará aos olhos do país como um covarde. Não se valerá do "estado de sítio", que toda a Nação e nós, integralistas, inclusive, aprovamos como medida extrema de combate ao comunismo e até a uma potência estrangeira que se imiscuía nos negócios internos da nossa terra, não se valerá dele para tirar proveito partidário, para sufocar a propaganda das oposições que, no caso presente, em São Paulo, são constituídas pelo P. R. P. e pelo Integralismo, além de vários partidos de caráter estritamente municipal.

A prova do que digo são os boletins que tenho diante dos olhos, que "firmam jurisprudência", si se pode usar dessa expressão, acerca dos métodos policiais em face da atuação dos partidos no próximo pleito. São boletins em que se convida o povo para a realização de "meetings". Quem convida? O Partido Constitucionalista, isto é, o situacionismo, ou melhor, o sr. Armando de Salles Oliveira.

Uma vez que já se abriu o precedente, todos os outros partidos estão no direito de fazer o mesmo. Parece que essa é a palavra de ordem do Governo Paulista. É a palavra de ordem do bom senso, Do contrário, como se cumpriria a Lei Eleitoral? Pois a propaganda não é um ato preparatório do exercício do direito do voto? Ora, si em pleno estado de sítio, o Governo consente que se realizem eleições, logicamente, imperativamente, consente o exercício do direito do voto com todos os seus atributos, requisitos, características, processos. Foi, naturalmente, pensando assim que o Governo deu a "deixa" aos partidos, mandando o seu próprio partido iniciar a "propaganda".

E agora seria muito mais odioso, si o Governo, tendo consentido à sua gente, a "propaganda", pretendesse coarctar a dos outros credos...

Essa atitude me fazia crer que em Santa Catharina, onde o sr. Nereu se mostra tão simpático e parece mesmo que de certa forma ligado ao sr. Armando de Salles, idênticos direitos poderiam ser exercidos pelos "camisas-verdes", que têm ali grandes redutos eleitorais.

Infelizmente, assim não foi, tendo os integralistas recorrido ao Judiciário, que até lhes concedeu força armada nas eleições de anteontem.

E o Ceará? Nós queremos estar certos de que o governador que tem tido nos integralistas uma corrente de alta e superior visão, não somente pela atuação no Parlamento dos dois deputados estaduais que elegemos, e do deputado federal que representa no Rio o integralismo brasileiro pelo voto dos cearenses, mas ainda pelo que o integralismo tem sido como baluarte na defesa da ordem publica, - nós queremos estar convencidos de que o sr. governador do Ceará deixará correr livremente a nossa propaganda.

Tais são os prognósticos que faço para as eleições deste mês. São razoáveis e envolvem um pensamento de justiça e de patriotismo. Querem também envolver um aviso aos governos:

- Cuidado, srs. governantes: não aperteis demais as cravelhas, não asfixieis demais, não useis muito do vosso martelo sobre a bigorna dos vossos adversários, Lembrai-vos de vários episódios da História do Brasil. Dos tempos antigos e recentes. Lembrai-vos da História do Mundo, Pesai bem, medi bem, contai bem. Para que possais evitar que, por força das circunstâncias, tenhais vós de serdes pesados, medidos e contados, em dia que sempre chega de surpresa...

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 03 de Março de 1936.

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