As duas faces de Satanás (1937)
Plínio Salgado
O comunismo não é uma causa: é um
sintoma. O mal não é o comunismo em si, porém as causas que geram o comunismo.
O comunismo, por consequência, não se acaba
com violências, com opressões e fuzilamentos: acaba-se com a extinção das
fontes de que ele provém.
É preciso encararmos o comunismo sob
os dois aspectos pelos quais ele se apresenta: o intelectual e o moral.
Sob o aspecto intelectual, o comunismo
só pode ser combatido, eficientemente, pela crítica, pelas ideias, no livro, na
tribuna, na imprensa. Sob o ponto de vista moral, o comunismo só pode ser
combatido pelas medidas que melhorem o sofrimento da massa e pelos exemplos de
virtude.
Tanto o estado de espírito do
intelectual como o estado de espírito do inculto, porém, sentimental, só podem
ser substituídos por uma nova concepção da vida.
Será, porém, inútil, tanto a ação do pensamento
como a ação do sentimento, se ela não for prestigiada pelo exemplo.
Estancar as fontes do comunismo, - eis
o nosso trabalho.
* * *
Onde estão as fontes do comunismo?
No materialismo burguês.
Com que autoridade moral um
materialista pode declarar-se inimigo do comunismo?
Sua atitude reacionária só consegue
irritar ainda mais os humildes, os infelizes. Seu ódio anima o ódio dos contaminados
pelo bolchevismo. Seus instintos sanguinários não fazem mais do que acender mais
ao vivo as cóleras da multidão.
É muito comum hoje em dia escutar-se o
burguês dizer: “Qual nada! O que o Governo devia fazer era fuzilar logo esses
comunistas!”
A gente olha para o burguês. Está bem
vestido, com o charuto na boca, acaba de descer o elevador do Jockey Clube,
onde levou duas horas almoçando numa roda de elegante. Daqui a pouco, vai ter
um encontro com uma mulher que não é a sua, no “hall” do Palace. Esta manhã
esteve na praia, seminu, fazendo conquistas frinéias familiares. Tem uma renda
farta. Vive à tripa forra. Sabe de numerosos casos de adultérios galantes e de
cavações reles. E tem muita raiva dos comunistas. “Oh! O governo devia fuzilar
essa caterva!”
O nosso homem vota um desprezo profundo
pelos humildes. Essa gente, para ele, cheira a cebola e a suor. Grita com os criados,
maltrata os garçons. Faz o maior pouco caso do estudante pobre, dos caixeiros, do
soldado heroico, daqueles que guardam a sua casa, como cães de fila. Caçoa do
brasileiro do sertão, que trabalha para sustentar o luxo das capitais. E, quando
esse nédio burguês ouve falar em comunismo, logo diz: “Basta a polícia! “É
meter-lhes as patas do cavalo, é varrê-los a metralhadora”.
* * *
Não. O comunismo não se combate assim.
O burguês está enganado. Já se enganou desse modo na Espanha; está se enganando
na França, como está se enganando no Brasil.
O comunismo é apenas um sintoma do
materialismo grosseiro de que o burguês é a fonte originária.
O operário não quer mais acreditar em
Deus? Mas quem foi que ensinou o operário a negar a Deus? Foi o burguês. O
burguês que acha muito boa a religião para os velhos, os proletários, as
crianças e as mulheres.
O nédio burguês é ateu, e não respeita
a família, e não liga a Pátria. Leva uma vida de macaco, só pensando em
prazeres, com o nariz a cheirar rabos de saia, os fundilhos alisados pelas
poltronas e pelos almofadões dos carros de raça. Sua preocupação constante é o
pano verde, a “garçonnière”, as paixões criminosas, a esperteza nos negócios.
Convém, para ele, que o operário seja
religioso, porque assim não incomoda com rebeliões e desesperos. Convém que a
esposa também o seja, porque assim se conforma com as suas ridículas atitudes de
galo velho. Convém que as crianças também o sejam, para não darem trabalho com
desobediências.
É assim o burguês. Para ele, a Pátria é
coisa muito boa, porque a Pátria para ele não são os milhões de brasileiros que
sofrem, porém, os soldados de polícia e os agentes de segurança, os
investigadores e as metralhadoras. Isso é que é a Pátria, a Nação, para ele.
Mas nem isso ele defende, porque é comodista. Deixa essa tarefa, a nós, camisas
verdes, ao Exército Nacional, à Polícia, ao Governo. Ele materialista e
gozador, não dá um passo. Exige, apenas, que não poupemos o comunista.
O Exército, diz o burguês, deve ser
disciplinado, não se metendo em política. No íntimo o burguês materialista está
convencido de o Exército existe para que ele, em plena segurança, possa
conquistar e deflorar a filha do operário; para que ele possa refestelar-se no
seu pijama de seda; possa atropelar com o seu automóvel o mísero velhinho ou a
inocente criança que tiveram a petulância de se pôr à frente da sua máquina
possante. Lá no fundo de seu coração empedernido, ele pensa que o Governo, o
Chefe de Polícia, os militares, os camisas verdes, devem ser seus capangas,
seus criados dóceis.
Estão muito enganados, os burgueses. O
que, nós, integralistas, combatemos, em primeiro lugar, é o materialismo, o sensualismo,
a grosseria dos sentimentos, o domínio dos instintos. Sem combater isso, como
combateremos o comunismo?
* * *
Pois se o operário olha para o burguês
e vê que ele, em todas as suas atitudes, proclama que a vida do homem acaba
neste mundo; e se o burguês é o homem que sabe, que leu, que estudou; e se é com
ele que o operário aprende, é lógico que o operário ficará sendo materialista,
deseja ser também um bruto, um gozador e como não tem recursos, adere a uma
doutrina que lhe diz: “O céu e o inferno são aqui mesmo: tratemos pois de gozar
a vida tomando tudo dos burgueses!”
A filha do operário que se prostitui,
levada na baratinha do burguezote, foi seduzida, primeiro, pelo luxo da
burguesinha e pela opulência da burguesona. Os homens brutais, empolgados pelo
instinto, que premeditam o assalto às famílias dos burgueses, para saciar a sua
lascívia animalesca, não fazem mais do que imitar, de modo violento e cruel, o burguês
que assaltou habilidosamente a casa do proletário, desonrando-lhe a filha.
É que o operário é uma obra do
burguês. O burguês fez o operário à imagem e semelhança. A criatura agora se
revolta contra o criador. Nada mais lógico, porque o burguês também se revoltou
contra Deus, quando adotou um método de vida tão contrário aos mandamentos do
Senhor.
O burguês é violento? O operário
também o é. O burguês é lascivo? O operário também o é. O burguês é comodista,
indiferente à Pátria? O operário também afirma que a Pátria é o estômago.
O burguês é cosmopolita? O operário é
internacionalista. No fundo, são a mesma coisa.
Se o comunista prega o amor livre? Mas,
o burguês, de há muito, já vive em poligamia.
O comunismo prega a destruição das
religiões? Mas, o burguês, de há muito, está caçoando de todas as religiões.
O comunismo quer matar, trucidar? Mas
o burguês também exige fuzilamentos.
Os comunistas não têm pena das
famílias dos burgueses? E os burgueses terão pena das famílias infelizes,
paupérrimas, deste país?
* * *
Burgueses! Eu e os camisas verdes
viemos para vos salvar e salvar vossas famílias!
Burgueses! Eu vos chamo, em nome de
Deus e da Pátria!
Vinde enquanto é tempo! Nós,
integralistas, não vos odiamos quando dizemos estas verdades, que precisais
ouvir, porque o Senhor, na sua infinita bondade, permitiu que alguém vos dissesse
o que nunca ouvistes de ninguém, porque todos os que vos rodeavam eram
hipócritas e não vos amavam.
Nós, camisas verdes, amamos
profundamente o operário, como vos amamos também, burgueses, porque vós que
oprimis com crueldade e eles, que rugem de cólera contra vós, todos sois
brasileiros e sois humanos, e este Movimento Integralista é da Pátria e se
anima de sentimentos de humanidade.
Nunca alguém disse ao operário e ao
burguês esta palavra dura, que irrita, que queima, porém que desvenda os
segredos profundos das desgraças atuais em todo o Universo.
Abrandai vosso coração de pedra;
aplacai vossos instintos; elevai vosso espírito e vinde dar combate à fonte do
comunismo, para que o comunismo se acabe.
* * *
Satanás veste sempre duas máscaras: a
máscara da dor e a máscara do prazer. Quando o homem sofre, Satanás é a
revolta, o desespero; quando o homem goza, Satanás é a voluptuosidade, a
luxúria.
Satanás veste os andrajos da miséria
para sacudir os punhos fechados, na saudação bolchevista. Satanás veste seda e
enfeita-se de joias, para sorrir com indiferença e desprezo sobre o sofrimento
dos humildes.
Satanás é o comunista que assassina à
traição. Satanás é o homem rico e feliz, que assiste a esse crime, e sorri.
Satanás é a revolta das hetairas nos cubículos
do Mangue. Satanás é a alegria triunfante dos “flirts” adulterinos das rodas elegantes.
Satanás é a indiferença, o comodismo,
o ceticismo, a negação, a ruína de uma Pátria.
Ele se apoderou de vós burgueses, como
se apoderou de muitos proletários. Ele entrou nos quartéis, é bem verdade. Mas,
antes de entrar nas casernas, ele já havia entrado nos vossos salões, entre
frases elegantes e costumes fáceis.
Urge que caminheis para nós.
Urge que vos salveis, burgueses.
Porque, de agora para sempre, já não
podereis alegar ao Supremo Juiz que não ouvistes a verdade, que não apareceu
alguém que afrontasse uma sociedade inteira para lhe lançar ao rosto seus
crimes, enquanto é tempo de se evitar o castigo.
* * *
Na Família, pela Pátria, para Deus.
Mas que estas palavras não sejam
apenas palavras. Que estas palavras sejam sacrifício e realidade profunda dos
corações e das almas. Eis a grande, a única batalha contra o comunismo.
Eu acendi esta luz verde para mostrar
na treva da hora presente o caminho por onde devereis passar, para não cairdes
no precipício.
Há também as lâmpadas vermelhas, pelas
quais vos estais guiando.
Não podereis dizer um dia que não tive
o cuidado de iluminar todo o Brasil com as verdes lanternas humanas que evitam
a queda nos profundos abismos.
SALGADO, Plínio. Páginas
de Combate. Rio de Janeiro: Livraria H. Antunes, 1937; transcrito
integralmente da pág. 07 até a pág. 16.
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