sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Crime contra a Nação (04/03/1936)

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

Crime contra a Nação (04/03/1936)

Plínio Salgado

Começa a crescer um rumor sobre a possibilidade de se adotar no Brasil, para substituir o sufrágio universal, nas eleições para Presidente da Republica, o voto indireto.

Dentro da liberal-democracia, não há maior crime contra a soberania nacional.

Quem lê as páginas imortais de Ruy Barbosa, na memorável campanha que sustentou, no Império, contra esse método deturpador da linha pura do liberalismo democrático, não pode deixar de reconhecer que, a manter-se o sistema vigente da democracia inorgânica, não há por onde fugir do sufrágio universal que, pelo menos, traz a comparticipação da massa na solução dos grandes problemas nacionais.

As eleições indiretas para a Presidência da República significam a maior das imoralidades. A Constituinte, que votou a Carta Magna de Julho, que nos rege, teve o bom senso, a honestidade de, pelo menos, manter com as fórmulas antiquadas, o processo eleitoral que mais se aproxima da sinceridade do regime.

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Ninguém mais do que nós, integralistas, somos contrários por princípio, por doutrina, por índole, ao sufrágio universal. Ele exprime a vontade desorganizada das turbas. Ele se afasta dos legítimos centros de interesse, em torno dos quais giram as aspirações humanas, os desejos honestos e vontades dos grupos naturais em que o homem se enquadra na sociedade.

Mas o sufrágio universal só pode ser substituído pelo voto corporativo. Si o voto popular, expressivo tão somente da vontade política, alheio completamente aos interesses de ordem econômica e moral, já não se coaduna com o ritmo dos tempos modernos, em que entra mais um fator na atividade política, isto é, a questão social, esse voto só pode ser suprimido, quando a sociedade, reestruturando os seus quadros, possa dar um sentido orgânico às vontades que nela se agitam. Só então, será possível, sem ferir de morte a democracia, instituir-se a eleição indireta, para o Chefe da Nação.

A Câmera Corporativa Nacional exprimirá a consciência perfeita, exata, de cada ciclo de atividade econômica, cultural, moral do país. Essa representação é legítima, porque não terá vindo de conchavos de bastidores, de negociatas políticas, de promessas mentirosas, de fraudes eleitorais, de pressões policiais, de perseguições governamentais, de violação das consciências. É legítima porque traduz atos de liberdade, da liberdade possível, que será aquela exercida no âmbito da classe profissional, sem nenhuma pressão exterior.

Essa Câmara poderá e deverá eleger o Presidente da República, porque ela exprime interesses reais, naturais e humanos do povo, não desorganizado, mas organizado em cada classe. Dessa maneira, não se fere de morte a democracia. Pelo contrário: racionalizando-a, a ela se imprime uma vitalidade definitiva.

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O Integralismo, quando pretende substituir o sufrágio universal pelo voto das corporações, não condena de uma maneira essencial o princípio do "voto". Respeitando o livre-arbítrio da personalidade humana, respeitando a liberdade da "pessoa", reconhece que o "voto" exprime esse livre-arbítrio, essa liberdade. O que nós condenamos é o voto popular em que se traduzem as heterogeneidades sociais, pelo que pugnamos em prol do voto que exprima opiniões "homogêneas".

A doutrina integralista é bem simples, e, por ser muito simples, parece difícil, porque, como dizia Alberto Torres, o destino das idas simples é não serem facilmente compreendidas. O comum dos homens letrados prefere as ideias complicadas.

Por isso, até mesmo muitos que se dizem integralistas, não penetram neste pensamento, que, em última análise, constitui o princípio fundamental da nossa doutrina política: em vez de matar a democracia, nós queremos salvá-la. Salvá-la de que modo? Dando-lhe novos processos de auscultar a opinião. Vitalizando o "voto", que está morto. Moralizando o sufrágio, submetendo-o a um ritmo que é o sentido moderno da organicidade das forças nacionais.

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Nestas condições, si combatemos o sufrágio universal, muito mais combatemos a eleição indireta para Presidente da República, quando esta é oriunda de delegados que receberam outorga de poderes do sufrágio universal.

A eleição de deputados na liberal-democracia, todos sabem como se a faz. Não se elege um deputado por interesses nacionais; não se elege um deputado por interesses humanos legítimos. Um deputado é eleito em razão de interesses artificiais, efêmeros, muitas vezes imorais.

A promessa de uma ponte, de um emprego, de um favor municipal, pode eleger um deputado. Esse homem não traz para a Câmara nenhuma inspiração nacional. Seria uma imoralidade assombrosa que esse homem votasse para Presidente da República. A outorga que ele recebeu não foi para isso. Foi em razão da ponte ou do emprego prometido.

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A eleição indireta para Presidente da República é um conto do vigário passado ao povo. É como si alguém recebesse uma procuração especial e pretendesse usar de plenos poderes. É uma exorbitância de mandato. É uma "chantagem".

A eleição indireta é a fonte das oligarquias perniciosas. É a supressão de todas as liberdades populares. É um abuso de confiança.

Pior, porém, do que tudo isso (posso assegurar e desde já prenunciar os acontecimentos futuros) a eleição indireta do Presidente da República será, infalivelmente, a porta aberta à revolução armada.

Terão os políticos, na sua ambição, perdido todo o bom senso? Não pensarão eles nas futuras desgraças nacionais? Pretenderão violentar da maneira mais cruel, o povo brasileiro? E estarão dispostos a arcar com as consequências?

Que estas perguntas fiquem no ar. E que ninguém diga que uma voz não se ergueu quando se fala em praticar uma loucura, uma das mais perigosas loucuras, que é a compressão das massas eleitorais, a violação dos princípios básicos do regime.

E dizem que temos uma Lei de Segurança...

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 04 de Março de 1936.

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