sexta-feira, 26 de julho de 2024

Fantasia indigna e realidade honesta (03/05/1936)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

Fantasia indigna e realidade honesta (03/05/1936)

PLÍNIO SALGADO

O Integralismo é, antes de tudo, a política das realidades humanas. Não pretendemos fazer um regime para querubins e serafins. Não pretendemos criar um Estado para uma corte celeste. Queremos, porém, engendrar um sistema que, ao mesmo tempo, objetive:

1º) - impedir que a maldade humana, que reconhecemos ser uma das realidades sociais e particulares, atinja suas consequências funestas para os interesses da coletividade e dos grupos naturais;

2º) - criar um clima moral de aperfeiçoamento dos espíritos, mediante uma obra sistemática de educação e de exemplos, capaz de elevar, gradativamente, os corações e as inteligências até à compreensão perfeita da virtude e à sua prática.

Nós, integralistas, não somos otimistas. Não acreditamos que o problema humano esteja apenas no homem. Se assim fosse, pleitearíamos, desde o início, uma revolução de quadros; proporíamos uma substituição de homens por outros homens, e nada mais. Seria indigno de nós e dos superiores ideais que representamos, acreditar que os indivíduos perfeitos são aqueles que estão fora dos postos políticos e de administração pública do Brasil. Sabemos mesmo que, dentro do próprio movimento integralista, existe uma quantidade apreciável de patrícios de boa vontade, que vestiram a camisa-verde no empenho sincero de concorrer para a salvação do país, patrícios esses, porém, que estão cheios de defeitos, de baldas liberais-democráticas e de pecados e incorreções que eles se esforçam por apagar de si mesmos. Sabemos que o nosso recrutamento de brasileiros não pode ter a pretensão de aliciar santos, anjos e arcanjos. Se homens dessa altura moral existissem no país em número tão grande como os algarismos das estatísticas integralistas, o nosso movimento não se explicaria como uma necessidade histórica. O Integralismo é necessário, justamente porque temos de reeducar o povo brasileiro. Só se reeducam aqueles que estão dispostos a isso. Estar disposto à isso já é um sinal de saúde moral, de reação espiritual e primeiro passo no caminho do aperfeiçoamento.

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Ora, assim sendo, o Integralismo objetiva, de um modo "imediato", uma reforma profunda nos métodos de governo, capazes de encarar a realidade política do país, assim como a realidade social. Capaz de enquadra-las e dirigi-las. Controlar as atividades econômicas e financeiras, traçar as normas coercitivas da moralidade pública, da educação, da formação do caráter nacional, impor ordem e disciplina, tornar imperativo o principio da autoridade, prestigiar esse princípio de autoridade: pela exigência mais rigorosa do procedimento público e privado dos homens que a encarnarem.

De um modo "imediato", pois, objetivamos reformas políticas, pretendemos adotar novos processos, novos métodos de democracia mais condizentes com as realidades humanas e as realidades brasileiras. Submeter uma sociedade de loucos, de agitados, de epiléticos, de místicos alucinados, de sonhadores mórbidos, de superexcitados sexuais, de dipsomanos, de fingidos, de vaidosos, de mentirosos, de ambiciosos, de delirantes, a um regime dietético e desintoxicante, eis a missão do Estado, missão que ele só cumprirá conduzindo-se ele próprio até aos limites traçados pela natureza humana.

Agora, de um modo "mediato", pretendemos atingir, ao cabo de longos anos de ação doutrinária, de ação educacional, de imposição de normas pelo exemplo dos dirigentes, o máximo de aperfeiçoamentos morais, obra essa que durará várias gerações, pois estou certo de que não realizarei numa só geração aquilo que foi destruído sistematicamente em muitas gerações que me precederam.

Quando os Iiberais-democratas, fanáticos de um regime, pretendem fazer a apologia do seu sistema, costumam dizer que o sistema é perfeito, mas os homens é que não o tem cumprido.

Esse argumento demonstra que o sistema não presta. Por excessivo na confiança que depositou nos homens, acreditou mais nestes do que em si mesmo. Pretendendo realizar-se, não ofereceu em si próprio os elementos coercitivos da ação desmoralizadora dos homens, os fatores impositivos de uma orientação superior, antes, pelo contrário, deixou-se estar entregando seu próprio destino de coisa perfeita à discrição dos seres imperfeitos. Em vez de concorrer para o progresso do espírito humano, concorreu para o seu regresso. Em vez de se tornar lei viva, tornou-se lei morta.

Essa é a razão porque, nesta pregação integralista, insiste sempre neste tema: não ultrapassar a linha do equilíbrio, para não cair na mesma hipocrisia dos liberais.

Que adianta termos uma norma de conduta admirável impressa em nossos livros, estatutos, manifestos, cartilhas, artigos e ensaios, ordens do dia e diretivas? Que adianta, se, na prática, são os próprios pregadores que agem em contradição com a sua doutrina?

Não será isso muito mais pernicioso para a mocidade? Não será um crime praticado perante a Nação?

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O senso das realidades humanas é fundamental no Integralismo. Esse senso de realidade nós o encontramos na fonte de que viemos: o espírito cristão. E eu tenho visto muitas vezes, dentro do próprio movimento integralista, quanta imperfeição se acoberta debaixo dos maiores exageros de doutrina moral.

Aos chefes, aos dirigentes, aos apóstolos, aos. funcionários, aos que detêm uma parcela de autoridade em nosso movimento, digo francamente que prefiro, mais do que a palavra, o exemplo. Eu sei da grandeza e da beleza trágica dessa luta que se trava no íntimo dos espíritos de uma geração que teve a suprema glória de reagir a tempo contra tudo o que estava podre, contra a herança de miséria que recebemos das gerações precedentes. Eu sei bem dessa luta. Sei, porém, que não haveria virtude se não houvesse luta.

Como Chefe deste movimento, eu não sou dos mais cruéis na exigência, dos mais implacáveis na condenação dos erros, dos mais violentos castigadores do mal, justamente porque compreendo a batalha que suscitei no coração de cada um. Tenho reparado, porém, que os mais cruéis no seu puritanismo são quase sempre os que não examinam suas próprias fraquezas, e, de tal forma se inebriaram pela moralização objetiva, que se esqueceram dos deveres subjetivos, cuja base é o sentimento mais profundamente cristão.

Quero que os integralistas compreendam bem o sentido que dou a estas reflexões, para que vivam em paz e se fortifiquem no conhecimento de suas próprias fraquezas, e- confiem tanto em si mesmos como nos seus companheiros, todos confiando, em primeiro lugar, n'Aquele que, não nos dando a mão, nos deixará na mais tremenda das confusões.

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O exemplo que a liberal-democracia está oferecendo ao mundo, com a situação atual da Europa, demonstra como toda a doença da humanidade de hoje é a hipocrisia. Os liberais-democratas fingem acreditar nas virtudes de uma civilização e de um regime, que eles mesmos desrespeitam, adotando, na prática, os métodos mais reprováveis de violências.

Não adotemos esse exemplo. Que Jamais a crença em nossas virtudes e nas virtudes do Integralismo seja um fingimento. Por isso o Integralismo é a doutrina da realidade. Da realidade cuja inspiração deriva da fonte milenária do Evangelho e, para os povos, como para os indivíduos, para as sociedades e para as Nacionalidades, será sempre a "fonte de água viva", daquela água a que o Nazareno alude junto do poço de Jacob, à Samaritana maravilhada. Essa água viva de eternidade e de força chama-se sinceridade. Sentido de equilíbrio e de harmonia, sentido de justiça e misericórdia, sentido de humildade e de sacrifício, sentido de realidade material, intelectual e moral. Numa palavra: sentido de Humanidade.

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 03 de Maio de 1936.

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