terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

RESSURREIÇÃO (28/03/1937)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

RESSURREIÇÃO (28/03/1937)

Plínio Salgado

A ressurreição de Cristo encerra, na sua realidade e na sua simbologia, um ensinamento para os indivíduos e para os povos. O maravilhoso episódio evangélico demonstra que não será jamais possível a vida gloriosa, a vida imortal, a vida integral em espírito e corpo, a vida invulnerável, a vida intangível, a vida suprema em harmonia perfeita, sem que, primeiro, haja o triunfo escuro da morte sobre a vida precária, a vida falível, a vida incerta, a vida em angústia, em fraqueza, em temor.

Entre todos os mistérios que se oferecem à limitada compreensão humana, nenhum me seduz tanto, nenhum me abre um panorama mais completo dos planos universais da criação, como esse, que nos mostra, num relâmpago, a sinfonia de todos os valores e expressões do Eterno Pensamento conjugando-se com a Eterna Vontade no esplendor do Eterno Sentimento.

Na Ressurreição culmina e realiza-se a Redenção Perfeita, a Redenção, que seria incompleta, se não envolvesse a nobilitação, a santificação, a glória da Forma Material, que é, também, criação de Deus.

Quando o Arcanjo, na hora matinal, entre as brumas alvas da aurora, diz às mulheres piedosas: "Ressuscitou; não está aqui", ele anuncia o milagre cósmico, a integração absoluta do Corpo e do Espírito. A Humanidade, desde então, está realmente engrandecida sobre todas as suas misérias, e a promessa divina se cumpre, revelando ao nosso pobre corpo, a esse corpo que São Paulo dizia estar cheio de morte, a esse corpo atraído para as desarmonias das prevaricações e dos crimes, para as dores das paixões e para as misérias deprimentes, a possibilidade das afirmações gloriosas, na força plena da imortalidade e da perfeição.

A Redenção do Homem apenas em Espírito não seria completa. O Homem realiza no plano universal o milagre da integração de dois mundos: o mundo da matéria e o mundo da consciência. Entre os seres brutos e os seres espirituais, o Homem é o meridiano do Infinito, é o ser integral.

*

Esta compreensão do Homem nós só começamos a tê-la, desde Cristo e desde a Ressurreição. Já não é o domínio absoluto do Corpo, o exclusivo prestígio das formas eurrítmicas na alegria pagã: e já não é, também, o abandono, o desprezo, o vilipêndio desse cântaro vivo, dessa ânfora que estremece em movimentos emocionais, levando o perfume sagrado, a essência pura do espírito imortal. É a conjunção, é o ritmo misterioso, é a harmonia suprema entre o falível que se infalibiliza, entre o perecível, que se imperecibiliza, entre o mortal que se imortaliza e o Espírito Perene.

Confirma-se a intuição pagã dos semideuses, expressão esta que supriu a deficiência do entendimento ao desamparo da Revelação. E nós aprendemos que é preciso combater a morte do Corpo para torná-lo digno do seu destino superior.

Como combater a morte do Corpo? Será preciso tomar esta frase na sua significação mais terra-a-terra, para não se compreender a esplêndida beleza do combate que nos cumpre travar. Pois quando tomamos esta pergunta no seu sentido mais profundo, então percebemos que não se trata da morte material, mas da outra, a que estabelece o divórcio entre o Corpo e o Espírito, a que dissocia o ritmo entre dois mundos, à que destrói as harmonias e proclama a luta entre as forças materiais as forças espirituais.

*

Penetrando a fundo nestas palavras, entender-se-á um pouco a angústia, a aflição, a agonia do mundo moderno. A dor é parenta próxima da morte. Nós o sabemos, por experiência lancinante, quando se trata do fim da vida orgânica, do bruxuleio da existência corpórea. Nós o sabemos, também, pelos sofrimentos morais consequentes de nossos erros, E o mundo contemporâneo está cheio de dor. É a dor do ódio, é a dor das ambições, é a dor do orgulho ferido, é a dor das vinganças, é a dor das desconfianças recíprocas, é a dor da inveja, a dor do medo, é a dor da lascívia, é a dor das superexcitações da nevrose do jogo e das aventuras comerciais, financeiras e políticas, é a dor dos despojados de fé, que tiritam no frio das dúvidas, é a dor das covardias, a dor dos tédios e dos esgotamentos... Há morte no corpo do Mundo Moderno. Há morte porque há desarmonia entre a vida material e a vida espiritual.

Como combater a morte que entrou no mundo? Certamente essa morte não poderá ser com- batida sem que primeiro a combatamos dentro de nós mesmos. E que deveremos fazer? Devemos realizar em nós próprios a síntese dos ritmos dissociados Como realizá-la?

De certo não será pela fuga do mundo, pela fuga de nós em nós mesmos, pela vida contemplativa, pela negação do destino do corpo, que livraremos o mundo contemporâneo do desespero e das torturas prenunciantes da morte.

*

A questão social que se põe aos olhos dos estadistas e dos pensadores não pode ser resolvida, nem pela interpretação do destino do homem segundo uma única finalidade transcendente, nem segundo uma única finalidade material. O corpo tem seus deveres para com o Espírito, e o Espírito tem seus deveres para com o Corpo.

Esse corpo, que ressurgiu arrebatado pelo próprio Deus, esse Corpo de Cristo redimiu-nos em corpo e alma. E, como se não bastasse, para nos fazer compreender o equilíbrio exato, a harmonia perfeita, a destinação segundo a Terra e segundo o Céu, Cristo, antes do episódio maravilhoso, que culminou à Redenção, reuniu-nos, em confiança e amor, e prometeu-nos a sua presença, não apenas em alma, porém, em corpo e sangue, na vitoriosa expressão divina.

E tudo isso é a lição da Vida. A vida, tão fácil de ser vivida pelos irracionais, torna-se difícil para nós, justamente porque o nosso Espírito, na liberdade plena, entre as leis do Mal que o solicitam, e as leis do Bem que o inspiram, sente-se perplexo e confuso. E, por isso, a Redenção torna-se uma regra, um roteiro, uma luz, para que possamos, dia a dia, aprender a viver.

Os Povos, porém, esquecem, cada vez mais a lição divina da Vida. Os homens estão perdidos na cerração espessa. Falta-lhes uma luz. E essa luz é tão fácil!

*

"Ressurgiu; não está aqui!" Homens, lembrai-vos de que o corpo foi dignificado, foi honrado, foi reposto na sua majestade. Como permitis que as injustiças sociais levem multidões de párias à miséria do corpo, à fome, ao relento, ao desamparo na enfermidade e na velhice? Como permitis que uns percam a alma prodigalizando excessos de comodidade no corpo, e outros percam a alma, na revolta a que a conduz o corpo tiritante e oprimido?

Estadistas, políticos, intelectuais e militares, financistas e poderosos de todos os poderes, estais esquecidos de que tendes um Espírito, e que esse Espírito tem deveres para com as necessidades materiais, não apenas vossas, mas de vossos semelhantes? Como permitis que governem o mundo as leis exclusivas da matéria, da brutalidade na concorrência, da traição no comércio e na política, do ódio na luta entre opressores e oprimidos? O Estado deve ser uma expressão das necessidades do Espírito e do Corpo da Nacionalidade, de cada pessoa que compõe a massa coletiva. O Estado, como expressão corpórea, deve ser tão vigoroso, tão for- te, tão belo e tão puro, como deve ser cada corpo dos habitantes da Nação; e o Estado, como expressão espiritual, deve ser tão potente em vontade e tão iluminado em deveres, quanto cada um dos indivíduos que constituem a coletividade nacional. Esse Estado reflete a própria expressão humana, no que ela tem de realidade e finalidade, e mira-se no espelho divino do mistério cósmico de Cristo ressurreto da sua tumba, no seu glorioso esplendor.

Neste dia em que comemoramos a Ressurreição, nós, integralistas, temos o mais belo dos motivos para pensar debruçados sobre as angústias do mundo moderno e sobre a agitação da vida nacional.

Restituir à vida da Nação o sentido do milagre, eis à nossa missão histórica. Clamar para que os outros Povos se recomponham segundo o grande ritmo criador da Suprema harmonia cristã, eis nossa aspiração.

Ver o Brasil ressurreto. Ver a Nacionalidade integrada no alto sentido da vida material e espiritual - é tudo quanto desejamos, nesta nossa luta.

A lição do Evangelho é, porém, muito viva em nossas consciências. Sabemos que Cristo, triunfando da morte na morte, quis ensinar aos homens que quem quiser a vida eterna terá de passar pela morte. E a morte, para nós, brasileiros, não é por certo aquela que é menos para temer, mas o doloroso transe nacional, em que teremos de ver desfraldadas as bandeiras do separatismo, do comunismo, possivelmente ligadas no mesmo arranco materialista, oportunista, traidor, destruidor.

Aproximam-se dias escuros. Nós bem o sabemos. O mundo todo está se cobrindo daquelas nuvens que se fecharam completamente na Hora Sexta, sobre a Montanha... E a nossa Pátria já está toldada de sombras cor de chumbo. É, possivelmente, a morte, que vai passar, mas é também a Vida que vai vencer.

A Vida do Espírito Nacional, que palpita nos camisas-verdes da Pátria, e, que galvanizará, e iluminará, e porá em marcha o Corpo da Pátria, no triunfo glorioso de uma ressurreição do Brasil.

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 28 de Março de 1937.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

Confiança na Justiça (18/03/1937)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

Confiança na Justiça (18/03/1937)

Plínio Salgado

Quando respondi ao telegrama com que me distinguiu o sr. governador da Bahia, no ano passado, com relação à atitude que s. excia. assumiu contra os adeptos do Sigma, declarei que deveríamos confiar nas decisões da Justiça.

Durante seis meses, não fiz outra cousa senão depositar as mais vivas esperanças na retidão dos juízes da minha Pátria.

Houve momentos em que os integralistas saíram abatidos, humilhados dos tribunais, Nunca, porém, perderam a calma, porque eu lhes dizia que era preciso esgotar todos os recursos, com paciência e resignação no sofrimento.

Os 22 companheiros presos, acusados de conspiração, mostravam-se de animo elevado, dignos da camisa verde que vestiram para servir ao Brasil. Suas famílias, mães, esposas, filhinhos adorados, viveram, no sofrimento, cheios dessa esperança na magistratura do nosso país, pois toda a minha preocupação era a de transmitir-lhes esta minha íntima certeza.

Por ocasião do Congresso Integralista de Imprensa, de Belo Horizonte, escrevendo o Código de Ética Jornalística, ao recomendar que jamais os camisas-verdes se utilizassem de mentiras contra o adversário, escrevi: "A verdade pode não ter as primeiras vitórias, mas a última sempre lhe pertence".

Esta frase foi reproduzida e largamente divulgada, principalmente na Bahia. Ela foi o alimento espiritual dos rudes sertanejos, dos lares oprimidos, dos inocentes caluniados, dos justos injuriados, dos bravos ridicularizados, dos velhos, mulheres, crianças, roídos de saudade de seus filhos, de seus maridos, de seus pais. E os Integralistas, tanto da Bahia, como de todo o Brasil, não se desiludiram nunca, não se desesperaram, não se agitaram, não reclamaram, não ofenderam autoridades, não ergueram a voz contra os juízes.

Mais do que nós, mais do que os nossos brilhantes advogados, mais do que os nossos julgadores, Deus sabe o que faz. Sem sermos fatalistas, trabalhando, agindo, diligenciando conforme o preceito divino, nós bem sabíamos, nas horas mais duras, mesmo naquelas em que víamos os comunistas nos debocharem com sorrisos e palavrinhas pérfidas à nossa saída, melancólica e humilhada, dos pretórios a que recorríamos, nós bem sabíamos orar, intimamente, e com alegria interior falarmos no fundo silencioso de nossas almas: "seja feita a vossa vontade, Senhor!”.

Para lograr mais rapidamente a liberdade de nossos companheiros, impetramos certas medidas que, agora, verificamos, não seriam tão vitoriosas, de significação tão profunda, de efeitos tão vastos e de expressão moral tão elevada, como a decisão de ontem do Tribunal de Segurança Nacional.

Nossa primeira preocupação foi impetrar um "habeas-corpus" perante s. excia. o sr. Juiz federal da Bahia. Tivemo-lo denegado, em razão da incompetência alegada pelo digno magistrado.

Subimos à Corte Suprema. Nossos eminentes advogados, professores Alcibíades Delamare e Barreto Campello ali compareceram соm uma petição notável, com a qual tudo esperávamos. Mas a Suprema Corte não tomou conhecimento do pedido, por ser o caso da alçada do Supremo Tribunal Militar.

Fomos ao Supremo Tribunal Militar. Com que esperança! Os comunistas acompanhavam nervosamente a decisão da sorte de nossos 22 companheiros presos, aqueles 22 homens que mereciam todo o seu ódio, pois representavam duzentos mil baianos que se tornaram a barreira contra as investidas do Soviete.

Os ilustres magistrados do Supremo Tribunal Militar negaram-nos o "habeas-corpus", por quatro votos contra três, sendo estes dos juízes Barros Barreto, Ribeiro da Costa e Alvaro Mariante, aos quais seremos eternamente gratos, embora respeitemos e acatemos os votos contrários a nós, porque respeitamos e acatamos os juízes do Brasil.

Um segundo "habeas-corpus" nossos incansáveis advogados impetraram perante o mesmo Tribunal. Perdemo-lo, nas mesmas condições. Os jornais amarelos, dissimuladas patrulhas do sovietismo rubro, exultaram, Não houve, porém, de nossa parte, na palavra, um gesto contra a Justiça. Cumpre-me aqui elogiar um milhão de Integralistas, que foram irrepreensíveis. Por maior que fosse o respeito pela minha palavra de ordem, tratando-se de uma massa humana, poderia algum companheiro mais exaltado proceder no auge do desespero, de modo deselegante, em desacordo com a doutrina que pregamos Mas não registrei um caso sequer dessa natureza. Também as famílias dos presos poderiam afligir-se, afligindo-me, mas essas dignas patrícias, as baianas de têmpera, souberam poupar esse desgosto ao Chefe e aos companheiros. Cada vez mais animadas, mais firmes, mais resolutas, não as atemorizaram a perspectiva de mais longo suplício.

Fracassados no Superior Tribunal Militar, voltámos à Corte Suprema, Nossa esperança foi enorme. As demonstrações públicas das autoridades federais, a nosso respeito, evidenciavam que o governador da Bahia não agira como delegado do Poder Central, como executor do "estado de guerra". Estávamos certos de que iríamos obter o "habeas corpus".

Os ilustres magistrados que compõem a Corte Suprema negaram-nos, porém, o "habeas corpus". Por unanimidade, deixaram de entrar no mérito da questão, pelo fato de estarmos em "estado de guerra".

Nosso advogado, o professor Alcibíades Delamare, produzira uma belíssima sustentação oral, com aquela cultura que nele, admiramos, e aquela vibração que faz dele um dos mais exaltados patriotas.

Lembro-me bem da tarde em que ele me deu a notícia, em meu gabinete, do resultado que acabrunhara tanto os integralistas, principalmente por que os comunistas tinham estado, firmes, à saída do Tribunal, para cobrir de ironias, de risinhos soviéticos os brasileiros que vestiram uma camisa verde com o objetivo de morrer se for preciso, para evitar que a nossa Pátria seja escravizada pelos bolchevistas de Moscou.

O nosso patrono admirou-se do sorriso de calma absoluta com que recebia a notícia. É que intimamente eu estava certo que as coisas tinham de ser assim. Era preciso que fossem assim.

Fui levar a notícia desconsoladora aos companheiros que já haviam sido transportados da Bahia, a pedido nosso dirigido ao Tribunal de Segurança Nacional, para o Quartel do Regimento de Cavalaria da Brigada Militar Eles a receberam também, com aquela expressão de serenidade, direi mesmo de alegria, com que os integralistas recebem as dores que Deus lhes manda, como resgate da felicidade da sua Pátria. Esses homens e, principalmente suas famílias, foram admiráveis durante os seis meses de prisão sofridos pelo Bem do Brasil.

Restava-nos o Tribunal de Segurança Nacional. O processo volumoso viera da Bahia para as nobres mãos desses Juízes-mártires, desses juízes- salvadores-da-Nação, desses magistrados da República diariamente ofendidos por uma potência estrangeira, cujos asseclas repetem como um estribilho a inconstitucionalidade do Tribunal, cuja missão é justamente por a salvo a Constituição, a República, as Tradições da Pátria dos assaltos dos que em novembro tentaram destruir esses patrimônios da Nacionalidade.

O volume de processo não nos assombrava, porque os documentos que o compunham eram montes de papéis timbrados da Acção Integralista, pacotes de fichas que todo o mundo no Brasil conhece, declarações de 22 presos, de testemunhas inócuas, cartas altamente patrióticas de integralistas inquietos pelas manobras bolchevistas. Acusados de uma conspiração "de grande envergadura", lá estava o rol das armas arrecadadas em centenas de devassas em Sedes de partido e casas particulares: 1 espingarda de caça, um revólver H. O. com seis balas, uma pistola velha... Estas coisas nos tranquilizavam.

Mas, o que mais nos tranquilizava era o valor moral dos Juízes do Tribunal de Segurança Nacional. Juízes de uma hora de exceção na vida do Brasil. Juízes que se tornam alvo natural dos inimigos da Pátria. Juízes que têm sobre seus ombros, não interesses comuns à vida normal do país, mas interesses supremos da Nação numa fase anormal da História. Juízes que, diariamente, estavam demonstrando ao Povo a sua energia, a sua serenidade, a sua alta dignidade. Nós tínhamos de confiar nesses Juízes.

Confiamos. Esperamos. Tranquilamente. Deus falou pela voz desses magistrados.

A liberdade ora concedida aos nossos companheiros da Bahia tem uma significação muito maior, muito mais grave, muito mais importante para os próprios destinos do Brasil.

Ela não é uma consequência eventual de uma ordem de "habeas corpus", que poderia ser concedida em razão de formalidades não cumpridas, ou de interpretação de competências, ou da natureza do mandato da autoridade coactora. Ela é um resultado imediato da apreciação de um volumoso inquérito. Ella é emanada do Tribunal que se torna a fonte mais legítima neste momento das outorgas de dignidade nacional, de correção em face do "estado de guerra", de significação política, de caráter moral.

Libertados pelos outros tribunais, também dignos, e que nós integralistas respeitamos, os companheiros da Bahia ainda poderiam ter sobre si o peso, ou pelo menos uma leve nuvem de suspeita sobre seu procedimento. Mas, postos em liberdade pelo Tribunal de Segurança Nacional, o Povo Brasileiro fica sabendo que tudo quanto temos dito em nossa defesa e que tem sido, aliás, confirmado pelas mais altas autoridades federais, como o sr. ministro da Justiça e o sr. presidente da República, encontra base indestrutível em motivos que servem de alicerce à patriótica e nobre decisão da Justiça Especial.

Tiveram razão os integralistas em confiar nos Juízes do Brasil. Tive eu razão quando, respondendo ao telegrama com que me distinguiu o sr. governador da Bahia, declarei esperar tranquilamente o julgamento final do caso já famoso da conspiração de S. Salvador.

Nós continuaremos assim. Jamais perderemos a calma. Jamais deblateraremos. Jamais nos desesperaremos. Com a lei, pela lei, para a lei. Com a Constituição, pela Constituição e para a Constituição. Confiando na Justiça, esperando tudo da Justiça, dirigindo-nos à Justiça e tudo fazendo pelo prestígio da Justiça, prosseguiremos nossa marcha, que visa à grandeza do Brasil.

Podem os camisas verdes de toda a imensa Pátria trabalhar com ardor pela sua causa. Quando houver arbítrios de autoridades, haverá um Juiz ao qual se possa recorrer. Quando esse juiz falhar, há os tribunais. Quando não houver nem juízes nem tribunais, então é porque tudo acabou, e urge agir pelos meios que habitualmente condenamos.

Isso, porém, decerto, jamais se dará. Porque, para honra do Brasil, há juízes no Brasil da envergadura de um Barros Barreto, um-Costa Netto, um Raul Machado, um Pereira Braga e de um Lemos Bastos.

Com juízes de tão alto patriotismo e de tão grande saber, honestidade e retidão, os que amarem a Pátria não precisarão ser extremistas para manifestar o seu apoio à Nação e salvá-la nas horas perigosas.

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 18 de Março de 1937.

domingo, 18 de fevereiro de 2024

CARTA A CASTRO ALVES (17/03/1937)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

CARTA A CASTRO ALVES (17/03/1937)

Plínio Salgado

Não sei onde estás, Castro Alves, se naquela estrela que resplandece no crepúsculo, ou na luz do Cruzeiro, ou na estrada de faiscante poeira da Via Láctea, onde caminhas, sentindo o infinito e contemplando maravilhosas maravilhas... Talvez estejas hoje na onda verde do mar da nossa terra, na esteira do "barco ligeiro" "que semelha no mar doido cometa"... No murmúrio do vento, talvez?... No pampeiro que varre a coxilha, no saveiro das praias que amaste, nos mosforós que cantam nas chapadas esbraseadas?...

Eras bem o Brasil; deves estar, por certo, nos cantos misteriosos que sobem das florestas; no rumor ignorado das selvas, no desabrochar das flores; no ruído sutil dos insetos doirados e no tatalar das azas das borboletas...

Este ar fino, que perpassa acariciando as palmas dos coqueiros, nesta tarde abrasada de março, e que traz as perfumes silvestres, parece que me diz que estás hoje, no dia do aniversário do teu nascimento, em toda a carta geográfica da Grande Pátria.

Estás hoje, pois que te evocamos, nesta delicada emoção que vibra no íntimo da nossa sensibilidade; estás nesta nossa inquietação; estás nesta nossa amargura como estás em nossa mais decidida esperança.

Ao dedilhar a máquina em que celebro o teu aniversário, há vibrações misteriosas no meu ser. Tenho a impressão viva e forte de que a tua alma espera de mim, não um artigo para o público, a teu res peito, mas uma carta para o teu coração, a respeito do Brasil.

Há poucas horas, estive relendo as tuas poesias, Poeta dos Escravos, poeta da selva americana, poeta do Brasil. Li e reli, muitas vezes, estes versos tão oportunos, nestes dias de hoje:

Existe um povo que a bandeira empresta

p'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!

E deixa-a transformar-se nessa festa

em manto impuro de bacante fria!...

Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta

que impudente na gávea tripudia?

Silêncio, Musa, chora e chora tanto

que o pavilhão se lave no teu pranto!

 

Auriverde pendão da minha terra,

que a brisa do Brasil beija e balança!

Estandarte que à luz do sol encerra

as promessas divinas da esperança...

Tu, que, da liberdade, após a guerra,

foste hasteado dos heróis na lança,

antes te houvessem roto na batalha,

que servires a um povo de mortalha...

Esses teus versos são proféticos, ó Poeta iluminado! Não o sabias, quando os escrevestes. Horrorizava-te a só ideia de que a Bandeira querida, a Bandeira da Pátria pudesse servir de mortalha a um povo estrangeiro, ao povo africano.

Entretanto, nos dias de agora, o auriverde pendão da nossa terra, em muitos lugares do Brasil, está servindo de mortalha para si mesmo... Ha brasileiros que se servem dele para se escudarem, para combaterem os legítimos defensores da Pátria. Há brasileiros secretamente mancomunados com estrangeiros, para escravizar os seus compatriotas, apontando-os como inimigos do pavilhão sagrado.

Há homens que juraram servir à Bandeira do Brasil e que traem o juramento, usando das armas que a Nação lhes confiou para matar seus irmãos e ferir traiçoeiramente a soberania da Pátria, que eles pretendem subordinar aos bárbaros de Moscou.

Há filhos deste país que, ocupando cargos públicos, servem-se da autoridade desses cargos para favorecer aos invasores e para perseguir os defensores da dignidade nacional.

E tudo se faz em nome da Bandeira, pela Bandeira, para a Bandeira, com a Bandeira, em razão da Bandeira, sob pretextos, sob desculpas, sob sofismas arquitetados em torno da Bandeira.

A farda, que é uma continuação do pano sagrado da Bandeira, a farda que deve ser enaltecida, cultivada, muitas vezes cobre peitos em cujo recesso há corações que premeditam o assassínio de surpresa de camaradas leais, fieis ao pavilhão sagrado do Brasil. Em novembro de 1935, a nossa querida Bandeira presidiu ao drama doloroso em que vimos soldados do Brasil se apresentarem como soldados de uma potência estrangeira, matando criminosamente os bravos defensores da dignidade, da independência e da liberdade de um Povo.

Restou-nos o consolo de verificar que o Exército Nacional soube defender a Bandeira da Pátria contra os que tramaram nas sombras de suas próprias casernas.

No entanto, esse episódio trágico não serviu nem de lição, nem de aviso. Os políticos continuam dividindo a Nação, como se nada tivesse acontecido. E o Brasil continua ameaçado.

Se ressuscitasses, Poeta, o teu horror seria mil vezes maior do que aquele que te inspirou o poema do "Navio Negreiro". Se soubesses, que brasileiros separatistas ridicularizam a Bandeira Nacional, cultuando as bandeiras das suas regiões! Se soubesses que uma tarde, em Campos, a Bandeira Nacional foi atirada na sarjeta, sendo dali levantada pelos camisas-verdes, que a trouxeram ao Rio, fazendo-a desfilar, pelas mãos de um nobre operário, à frente de uma passeata realizada como reparação! Se soubesses que na tua terra, na Bahia, a Bandeira Nacional foi enxovalhada, sendo também levantada da sarjeta onde jazia, pelas mãos desses mesmos camisas-verdes, que Ievaram, triunfalmente, por entre as aclamações de uma multidão revoltada! Se soubesses que, algum tempo depois, esses camisas-verdes eram compelidos por lei, a fechar as organizações militarizadas que tinham com o fito exclusivo de defender a Bandeira da Pátria na esfera da vida civil, em cooperação com as Forças Armadas do país! Se soubesses que inimigos do Brasil, míseros patrícios nossos rendidos ao Soviete, participantes da traição de novembro, com a máscara de liberais-democratas, defensores da Bandeira Nacional, conspiram contra essa mesma Bandeira, maquinando a destruição dos camisas-verdes que a sustentam e por ela se sacrificam! Se soubesses que na tua Bahia, esses camisas-verdes - os únicos defensores civis da dignidade, da prioridade, da unicidade, da imortalidade, da glória da Bandeira verde-amarela, foram presos, perseguidos, oprimidos, proibidos de cantar o Hino da Pátria, de erguer o braço nessa saudação condoreira, tão ao gosto do teu estro e tão ao gosto da tua Bahia, quando passa a Bandeira traída, a Bandeira ofendida, a Bandeira iludida, a Bandeira humilhada!

Sabes, Castro Alves, que no Brasil há uma corrente de brasileiros que se subordina a banqueiros ingleses, outra a banqueiros americanos, outra ao Soviete russo, outra à maçonaria internacional, e que todas essas correntes já não possuem nenhum sentimento de verdadeiro amor ao Brasil?

Sabes que o território brasileiro está sendo, dia a dia, distribuído entre estrangeiros: que em Mato Grosso impera uma companhia argentina numa vastíssima área: que no Amazonas dominam os americanos do norte numa amplíssima concessão, e os japoneses numa dilatada sesmaria? Que no Paraná uma grande porção do território pertence a ingleses? Que em Minas, preparam-se concessões enormes a serem dadas estrangeiros, para que explorem o nosso ferro? Que as quedas d'água do Brasil estão todas em mãos adventícias? Sabes, Castro Alves, que a maravilhosa Cachoeira de Paulo Afonso, que cantaste, aquele gigante cujo "mugido soturno rompe as trevas", não pertence mais ao Brasil?

Sabes que estamos endividados e escravizados; que estamos divididos por mesquinhas lutas políticas; que estamos nos enterrando no lodo de um torpe materialismo? Sabes que o caboclo do Brasil se encontra desamparado, doente, roído de maleita, de verminose, sem nenhum conforto e sem nenhum amparo, enquanto o colono estrangeiro é protegido, estimulado, favorecido?

Que significa a cena do "Navio Negreiro" diante desse espetáculo da autodestruição de um Povo?

Se vivesses hoje!

Verias as últimas reservas das energias nacionais se levantarem e escutarias a perversidade cínica dos que tripudiam sobre as angustias de um Povo, apontá-las como inimigas da ordem. Verias milhares de sertanejos da tua Bahia se erguerem, para salvar o patrimônio das tradições nacionais e verias esses sertanejos, em nome da própria Bandeira Nacional, serem sufocados e reduzidos ao silêncio, a fim de que os políticos pudessem agir livremente e rolar pelo declive da desgraça arrastando o Brasil...

Que poema escreverias! Que formidável poema!

Quando presenciasses o sofrimento dos verdadeiros brasileiros, dos verdadeiros defensores da Bandeira Verde-Amarela, dos verdadeiros campeões da Unidade da Pátria; quando visses a Justiça, de braços cruzados, sob a égide do Pavilhão Sagrado; quando visses os chamados homens de responsabilidade, completamente indiferentes à sorte dos mártires, sob o patrocínio do Pendão auriverde; quando visses os comunistas rirem das prisões e dos vexames padecidos pelos camisas-verdes que foram condenados por Dimitroff, em Moscou; quando visses os patriotas ridicularizados, injuriados, caluniados, esquecidos, vilipendiados, encarcerados, muitos espancados, com os lares varejados, com os direitos de cidadania suspensos arbitrariamente e tudo isso em nome da Bandeira, pela Bandeira, a pretexto da Bandeira, levado à cena da História pelos traidores da Bandeira, pelos impostores da Bandeira, pelos assassinos da Bandeira, então, Castro Alves, repetirias com mais ardor, com mais emoção, os teus versos sagrados e proféticos:

Auriverde pendão da minha terra

que a brisa do Brasil beija e balança.

Estandarte que à luz do sol encerra

as promessas divinas da esperança!

Tu, que da liberdade após a guerra

foste hasteado dos heróis na lança,

antes te houvessem roto na batalha

que servires a um povo de mortalha

Mas, Castro Alves, nesta conversa que estou tendo contigo, te direi: nem roto na batalha, nem mortalha de um Povo será o auriverde pendão, que tanto amaste. Aqui estamos, camisas-verdes do Brasil. Chegamos a tempo. Nada nos destruirá. Força alguma nos deterá. Estamos alerta. Um dia faremos desse auriverde pendão da nossa terra a expressão da maior força, da maior civilização da América.

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 17 de Março de 1937.