terça-feira, 28 de novembro de 2023

A LIÇÃO DE ADDIS ABEBA (08/05/1936)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

A LIÇÃO DE ADDIS ABEBA (08/05/1936)

PLÍNIO SALGADO

Espectadores do panorama europeu, os acontecimentos que se desenrolam do outro lado do Atlântico devem servir-nos como lições, lições preciosas para povos jovens e nacionalidades em formação.

A tomada de Addis Abeba pelos exércitos italianos, preliminarmente, demonstra o poder tonificador de um regime de ordem, de disciplina, de entusiasmo nacional. A Itália, outrora derrotada pelas tropas de Menelick, reconstituiu suas energias quarenta anos após, arrancou de si mesma as forças imortais que apenas adormecem, porém nunca se extinguem nos povos, e conquistou um enorme território, destruindo o Império Negro.

Essa é a primeira lição, que nos faz pensar sobre as vantagens de uma Pátria sem partidos, organicamente estruturada, unida pelo sentimento de sua própria grandeza e agindo, numa unanimidade de consciências e numa uniformidade de ritmo, no sentido supremo de um ideal coletivo.

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A segunda lição que nos oferece a tomada de Addis Abeba é a de que todo o cabedal de costumes, ética internacional, direito das gentes, juízos arbitrais, institutos pacifistas, tratados, convênios, conversações diplomáticas, jurisprudência, princípios e teorias, tudo o que compõe essa coisa chamada "a civilização ocidental", arrasou-se completamente. De nada valeram as "sanções". De nada valeram as atitudes morais dos governos. Nada significaram os protestos de Genebra. A incapacidade singular de cada governo para solucionar problemas de ordem interna ou externa, que lhe são próprios, ampliou-se, na mais vergonhosa incapacidade plural. Nem podia ser de outra forma: a soma de quantidades negativas só pode levar o sinal "menos". E, desta sorte, o mundo fica sabendo que em caso de guerra, ainda quando esta seja de conquista, não há para quem apelar, senão para os próprios recursos nacionais de cada um dos interessados.

A ocupação da Manchúria pelo Japão, anteriormente já havia desmoralizado a Sociedade das Nações. A exasperante e prolongada tragédia do Chaco Boreal, aqui perto de nós, tragédia que só teve seu termo quando os grupos financeiros em choque resolveram cessá-la, foi outro episódio que trouxe para todos os espíritos sensatos a descrença mais absoluta no idealismo jurídico e na eficiência das diplomacias. O rompimento dos tratados pela Alemanha vem acentuar a insuficiência das teorias em face da prática. O rearmamento dos povos confirmou essa insuficiência. E, agora, a tomada de Addis Abeba trouxe um vergonhoso consolo para as diplomacias platônicas do mundo: a Itália, apesar das sanções, não se retirou e nem mesmo ameaçou retirar-se da confraria de Genebra...

Com a cara amarela e um sorriso desenxabido, a Grã Bretanha elogia a atitude do sr. Mussolini, que, segundo a linguagem esportiva da terra do "football association", incontestavelmente "jogou na regra"... E, isso, já é um conforto para a "civilização" e para os juristas do mundo, e um tema para as mais finas ironias, como as do nosso cronista do "Momento Internacional".

Diante dessa lição, nós, brasileiros, que ainda acostumados a ler, de vez em quando, o livro de William Stead, "O Brasil no palco do mundo", onde a figura de Ruy Barbosa se agiganta em face da tese da Alemanha, falando em todas as línguas do Universo, em nome do direito das pequenas nações, precisamos mudar de leitura, e ler, por exemplo, o livro de Hitler, "Minha Luta".

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Esse livro de Hitler é um comentário vivo à doutrina firmada pela posse de Addis Abeba. O chefe do governo alemão defende ali a tese em que se afirma o direito dos povos fortes, quando se debatem nas dificuldades da superpopulação, de tomar territórios alheios.

O nacional-socialismo é um movimento tipicamente bismarckiano. O seu condicionado não é a revolução social, porém, o nacionalismo na sua máxima exaltação. Nele predomina, de um modo imperativo, a inspiração de Nietzsche, o sentido político de Frederico II, o "élan" das marchas dos "hussards" e o poema das glórias militares.

Seria útil aos brasileiros meditar sobre Addis Abeba e penetrar o sentido de "Minha Luta".

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Addis Abeba nos leva a pensar também na Manchúria, transformada numa posta de carne, que o dragão japonês e o leão soviético disputam do outro lado do planeta. Leva-nos a pensar nos vastos territórios brasileiros e no nosso sistema de colonização. Com um pouco, ao menos, de patriotismo, pensaremos na "fordlandia", onde o lobo "yankee" pisa cautelosamente. Isso nos fará considerar a situação da América Central, a pseudo-Independência do Panamá, a anexação das províncias mexicanas, a anarquia de Cuba...

Por outro lado, meditaremos na sutil propaganda separatista, insuflada, quase imponderavelmente, pelo capitalismo britânico. Concentraremos nossa atenção para os objetivos reais da Rússia, quando interfere em nossa política interna, isto é, a anexação de um vastíssimo território ao seu Império.

Convêm não nos iludamos com falsas amizades, com "salamaleques" de quem quer que seja. Convêm não nos percamos em objetivos unilaterais. Os perigos para o Brasil não vêm nunca de um lado só, mas de todos os lados.

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Alguma coisa morreu no mundo, depois da Grande Guerra. Foi um sentido do direito, foi um rumo da política internacional. Foi, talvez, muito mais: o espírito de uma velha civilização.

Alguma coisa nasceu sobre a Terra. O espírito de uma Nova Civilização, que nos incumbe, a nós, brasileiros, implantar no mundo.

Eu sei que aqueles que se habituaram a rir do Brasil, a nos julgar incapazes, mesquinhos, ignorantes, estúpidos, ridículos, estão sorrindo diante da frase que deixei escrita acima desta. Mas eu não escrevo para esses, que já se aviltaram tanto, que já se degradaram de tal forma dentro de uma mentalidade de escravos ao ponto de hoje nada mais significarem para os que são fortes, másculos, enérgicos e me acompanham nesta cruzada de ressurreição nacional.

Para estes é que escrevo. E para todos aqueles que, ainda não tendo vestido uma camisa-verde, estão em condições de o fazer imediatamente, se, ainda sentem vibrar, no íntimo, de seu coração, o sentimento de altivez e dignidade que arrebata os soldados do Sigma.

Esses sabem que temos uma missão a cumprir ainda neste século. E que, para isso, precisamos preservar a nossa Nacionalidade dos perigos iminentes, dos perigos mesmo remotos que possam aniquilá-la.

Criar o sentimento da União Nacional. Esquecer a miserável política dos partidos. Abster-se dos preconceitozinhos liberais. Unir a Nação. Em alma, em pensamento, em vontade, em sangue, plasmar o Grande Brasil.

Não será na hora dos desastres que tocaremos nosso clarim. Este nosso clarim, que principiou a ressoar pelos quatro cantos da carta geográfica do Brasil, desde 1932, é o grito de alarma, é o sinal da ressurreição.

Brasileiros! Não vos iludais! Não vos conserveis nessa atitude de mero espectador no Coliseu, vendo cair os gladiadores e aplaudindo os que conduzem vitoriosamente as quadrigas no corso. Levantai-vos. Para exprimirdes a força nacional, para constituirdes a muralha viva, para vos afirmardes como a honra de um povo e a predestinação de um Continente.

Um dia se falará destas palavras que aqui deixo escritas. Praza aos Céus que elas não sejam lidas nesse dia com o remorso dos criminosos contra a Pátria, porém, com a alegria e a força de uma Nação que tendo ouvido o aviso, levantou-se e caminhou!

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 08 de Maio de 1936.

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

NAS TREVAS DA HORA PRESENTE (15/02/1936)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

NAS TREVAS DA HORA PRESENTE (15/02/1936)

PLÍNIO SALGADO

Ia eu escrever sobre a situação da França, apreciando os acontecimentos que ontem se desenrolaram em Paris, colocando-os em confronto com o que se passa atualmente em todos os pontos do mundo, numa hora dúbia, incerta, crepuscular,

Com o pensamento em Paris, chega-me a correspondência. Os teclados da máquina calam-se. Tenho um prazer particular de abrir, pessoalmente, esses montes de envelopes e de impressos que me chegam dos lugares mais remotos do Brasil, porque eles exprimem a própria alma da minha gente.

No meio das cartas, encontro um envelope grande. Dentro, alguns exemplares de um jornalzinho. Chama-se "A Lux". Vem de uma cidade remota do interior de Minas E' órgão oficial do Bispado de Aterrado,

Ao prelado daquela pequena cidade já me liga uma afeição delicada. Ele acompanhou com olhos de brasileiro e de Príncipe da Igreja, o meu trabalho, o meu esforço, nesta luta tremenda contra o Espírito do Mal, multiforme, multitudinário, complexo, insidioso, que se apresenta com mil máscaras, mil formas imprevistas, por vezes penetrando o próprio Movimento Integralista, em cujas zonas mais permeáveis tenho de acudir com assistência imediata. Ele compreendeu o anseio do meu espírito, o drama da minha consciência entre a execução de um plano político firmemente delineado e executado com autoridade, e as críticas, muitas vezes de boa fé, porém, falhas dessa intuição que é o segredo dos Estados Maiores e da capacidade dos Chefes, intuição de realidades sociais ambientes, norteadora de atitudes nem sempre compreensíveis. Ele sentiu o meu sofrimento, percebeu as minhas dificuldades, e mandou-me carinhosamente, a oração ao Santo seu predileto, o Arcanjo que guiou o jovem Tobias, que restituiu a vista ao velho Tobias. Por certo que s. ex., o longínquo prelado dos rincões mineiros viu no Brasil maçonizado, no Brasil roído de materialismo, de ceticismo, de incompreensão, que atinge até aos honestos, a figura de cego do velho Tobias. E pediu ao Arcanjo Raphael que me desse um pouco das entranhas do misterioso peixe, que restituiu a vista ao patriarca do Antigo Testamento.

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Guardei esse gesto de delicadeza dentro do meu coração. Um afeto particular ligou-me a esse brasileiro que nunca vi, nem conheci, e cujo espírito tão nobre e lúcido, ao mesmo tempo tão bondoso, dirigiu-se tão espontaneamente ao meu.

Abro agora este jornalzinho de Aterrado. É tão minúsculo, que coube num envelope de oficio. Em minha memória estavam os "boulevards" de Paris, a Praça da Concórdia, o Quais d'Orsay, as ruas que se dirigem a Saint Germain, itinerários dos funerais do escritor Bainville, realizados anteontem, e trechos meus velhos conhecidos, nas tardes de 1930, quando eu meditava, pelas margens do Sena, sobre a fermentação política do mundo.

Os últimos telegramas davam conta dos tumultos promovidos pela "Action Française", da agressão ao israelita Leon Blun, líder socialista francês, da attitude de Pilatos do sr. Sarraut, dos varejamentos das sedes monarquistas da França, pela "gendarmerie", das represálias da "frente popular", nome covarde que acoberta a III Internacional, cujo bureau central funciona atualmente, não em Moscou, porém, ali mesmo, em Paris.

Os despachos não se referiam, senão de um modo geral, às "organizações da direita", cujo fechamento se pedia no Parlamento. Diante desses fatos, eu meditava sobre a fatalidade de uma inevitável marcha, de um inevitável choque, de uma inevitável solução política em quase todos os países.

Pois da Espanha também não trouxeram os últimos despachos a notícia de um próximo e fortíssimo golpe comunista? E do Chile não nos vieram, na semana corrente, as novas de uma insurreição bolchevista?

Tremendas ameaças pesam sobre o mundo. Mas, o que é mais grave, mais impressionante para todos aqueles que, tendo-se enfronhado dos pormenores das marchas e contramarchas políticas, adquiriram senso agudo da compreensão de todas as manobras táticas e habilíssimas das "forças secretas", que jogam com os governos e os partidos, como títeres, é a identidade de ritmo no combate sistemático exercido, nestes dias, em todas as nações, contra as entidades congêneres ao Integralismo, expressivas das últimas (ou primeiras!) reservas das saudáveis energias nacionais e cristãs.

Votam-se leis, tomam-se providências, em todos os países, para destruir qualquer esforço de salvação nacional extrema. É muita coincidência. Os "camisas azuis", os "Croix du Feu", de França; os "camisas-pretas" da Inglaterra; os "camisas-douradas" do México; os "camisas-prateadas" dos Estados Unidos; os "camisas-pardas" do Chile; os partidos monarquistas, as organizações baseadas nas tradições nacionais; todos estão sendo ameaçados pelos Parlamentos, todos estão tendo contra si a arregimentação das "esquerdas" e dos "centros".

Em alguns países, a manobra tem sido executada com extrema habilidade. Aqui no Brasil, por exemplo, eu estou jogando mais uma partida de xadrez, com as "forças ocultas", do que uma batalha em campo raso. Desde que as "pranchas" do Grande Oriente circularam nas Lojas, comecei a sentir, não por parte dos maçons, diretamente, mas por parte de elementos de boa fé, porém ingênuos desconhecedores das tramas secretas, o combate ao Integralismo.

Não perder a calma, tem sido o meu lema. Não agir com precipitação, tem sido o meu método. Não dar expansão à minha impulsividade, tem sido o meu system. Examinar, pesar, distinguir, ensurdecer às vezes, perdoar muitas outras, procurar esclarecer em todas as oportunidades, serenamente e com firmeza. Do contrario, já teríamos fracassado, Pois tão imprevistos, simultâneos, incompreensíveis são os golpes que desferem sobre nós, integralistas, que eu tenho de estar atento para todos os lados.

Tem-se criado uma atmosfera de desconfiança entre o Integralismo e as religiões, especialmente, entre o Integralismo e a Igreja Católica; tem-se fomentado indisposições de operários contra nós, tachados que somos de defensores da burguesia, e tem-se estimulado o temor dessa mesma burguesia contra o Sigma, apontado como dissimulação do comunismo... Comparam o nosso movimento ao hitlerista, quando não somos racistas, nem nacionalistas cegos, porém brasileiros e cristãos. Acusam-nos de inimigos da liberdade, de subversores do regime, quando clamamos exatamente pela recomposição do equilíbrio das liberdades e fortalecimento do regime republicano, federativo e presidencial, por meio de um novo sistema de captação das vontades que pretendemos se exprimam através dos órgãos naturais e cristãos das corporações.

Essa campanha é feita habilmente por elementos que não aparecem na arena do combate. Combina-se, por exemplo, numa Loja, que tais e tais elementos de prestígio social, conhecidos como católicos, frequentadores do palácio do Bispo "x", insinuem, em palestras, o perigo que o Integralismo representa para a religião, etc. Os argumentos são sempre habilíssimos porque pertencem àquele que, revestindo a forma de serpente, desde a primeira insídia, escolheu essa forma por ser a víbora "o mais astuto dos animais".

Os recentes acontecimentos políticos da França revelam a mesma situação de intriga pérfida em que se envolvem as forças nacionais, ansiosas pela ordem, pela disciplina, pela grandeza de suas Pátrias.

É, no instante em que ia eu comentar estes fatos, que a imprensa, em geral, não focaliza no seu verdadeiro aspecto, eis que um jornalzinho remoto, de um Bispado longínquo, jornalzinho tão pequenino e humilde que cabe dentro de um envelope, chega e se revela aos meus olhos um intérprete seguro, firme, dos fatos que se desenrolam na vida brasileira e cuja lógica profunda nem todos os espíritos apreendem.

Na defesa do Integralismo, esse pequenino jornal do esquecido interior brasileiro, tão grande, porém, como o coração e a inteligência de um dos prelados mais ilustres pelos dotes Moraes e intelectuais e pela delicadeza de sentimentos, desenvolve a lógica legítima, a lógica única, a argumentação seguríssima que se resume, em numerosos artigos de vários de seus números, neste pensamento: se a maçonaria e o comunismo são contrários ao Integralismo, é porque os princípios deste são aqueles mesmos que motivam o ódio daquelas duas forças "internacionais" contra os católicos.

No meio das trevas da hora presente, como é doce receber um tênue raio de luz, humilde, simples e vivificante, como uma réstea luminosa de sol!

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 15 de Fevereiro de 1936.

domingo, 26 de novembro de 2023

As vozes da História (07/02/1936)

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

As vozes da História (07/02/1936)
PLINIO SALGADO

Insisto em tratar deste assumpto. E como não há de ele me empolgar? Não se trata, acaso, da mais impressionante apoteose do movimento do Sigma?

Sim: falo ainda do Congresso Universitário de São João d'El- Rey. É preciso que todos os camisas-verdes da Pátria sejam despertados para o grande acontecimento. Que todos os olhos estejam bem abertos. Que todos os ouvidos estejam bem à escuta. Que todas as atenções se polarizem neste instante radioso em que a bandeira azul e branca se desfralda sobre as montanhas de Minas Gerais, nos céus da Pátria, falando a todo o Brasil.

As notícias que chegam da velha cidade mineira são as mais belas possíveis. Espera-se ali um número de universitários superior a mil. Na manhã de domingo próximo, São João d'El-Rey caminha do fundo dos tempos, em direção ao Futuro.
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Informam que trinta velhas igrejas cantarão, na manhã maravilhosa, pela boca de bronze de seus velhos sinos.

É a alma da Nação. São as vozes da História.

Do recesso das tradições mineiras, onde adormecera o espírito da Raça, à sombra da mancenilha entorpecente de um liberalismo fora da moda, corruptor e opressor, acorda a alma legitimamente liberal dos Inconfidentes, dos que sonharam a independência e a glória do Brasil.

Com que emoção ali comparecerei! O Integralismo tem um Chefe singular, que não fez esse movimento para si, que mil vezes diz aos companheiros: "é preciso arranjar outro, porque estou, desde o primeiro dia, a contragosto neste lugar". Muitos pensam que o Chefe assim falando o faz por mero espírito de renúncia. Como se enganam! Ele o faz porque todo o seu sonho, todo o seu desejo é ser, pura e simplesmente, o suscitador de energias, o criador, ignorado e obscuro, das expressões de beleza e de força nacionais.

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Que prazer intenso, que volúpia de estesia e de entusiasmo pela Grande Pátria, armar o espetáculo imponente em que os outros devam figurar, devam aparecer, devam resplandecer na glória de uma realização maravilhosa! Eu sinto, na marcha deste movimento, a alegria interior que deveriam sentir Esquilo ou Sófocles, ou Eurípides, pondo em movimento diante do anfiteatro aberto para o céu da Grécia, o movimento, o ritmo, o mistério e as harmonias arrebatadoras da tragédia antiga!

Oh! Si eu pudesse não ser o Chefe! Si eu pudesse ser, apenas (o que é tudo para o meu amor ao Brasil!) o encenador da grandeza nacional; o diretor de cena da honra e da força do meu povo; o carpinteiro, o cenógrafo, o ensaiador, o ponto, o contrarregra anônimo, que os bastidores escondem, enquanto resplandece a fulgurante beleza criada!

No meu Brasil, tive de ser tudo, inclusive comparsa, e, na qualidade de comparsa do drama histórico, tocou-me o papel mais difícil, mais exasperante de figura central do nosso movimento.

Se os meus adversários soubessem que esse é o meu desgosto: Se eles soubessem o que fiz, desde o início, para ser unicamente criador das energias novas; o compositor das harmonias supremas, o preparador perseverante, paciente, tenaz, do espírito que anima os episódios da História; o coordenador silencioso das forças em eclosão! Ser como o escultor, que desaparece entre a multidão, enquanto na praça, à luz do sol, e à luz dos olhos maravilhados cintilam as radiosas linhas puras; ser como aqueles que desencadeiam as sinfonias gloriosas, ou traçam a linha nítida das árias límpidas, ou desenvolvem os tons das melodias, para que os outros toquem, interpretem, animem: sim, os outros!

Só os artistas (e Napoleão Bonaparte já o disse que construir ama Nação é realizar obra de arte...) poderão compreender estas minhas palavras e penetrar o segredo das minhas secretas ambições. Ambições! Tão diferentes do que os medíocres podem imaginar; não ambições de poder, de cargos, de governo, que tudo é efêmero, porém, ambição eterna, sonho de beleza, de força, de ritmos perpetuamente renovados: alegria! Alegria do criar algo novo!

O Poder, o Governo, são simples necessidades acidentais; são meios para atingir outros fins...

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Essa alegria Interior é a que vou ter em São João d'El-Rey. Depois de três anos de luta, de sacrifício, de martírio, de continuas batalhas contra os medíocres, eis que arranco do coração de Minas Gerais as vozes dos sinos de trinta igrejas para, com a emoção do Passado, o sentido trágico da formação nacional, a alma secular de uma Nação, cantarem pelo timbre de seus bronzes a giesta da Primavera da Pátria, a saudação comovida a juventude: anúncio dos Tempos Novos, a marcha triunfal das gerações futuras.

Universitários de todas as Províncias! Moços que vieram, ao meu apelo, da Amazônia, do Nordeste, do Centro, do Litoral e do Sul! Escutai a voz dos sinos de São João d'El-Rey no dia do nosso encontro, uns com os outros, brasileiros das mais diversas procedências; no dia em que não serei apenas o vosso Chefe, o Chefe dos camisas-verdes, mas o suscitador deste espetáculo, que é o mais significativo da História do Brasil, e arauto, anunciando pelo mais alto clarim o advento de alguma coisa nova e forte no continente americano!


Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 07 de FEVEREIRO de 1936.


 


sábado, 25 de novembro de 2023

O MANIFESTO DOS DISSIDENTES (21/02/1936)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

O MANIFESTO DOS DISSIDENTES (21/02/1936)

Plínio Salgado

Que doloroso documento esse que nos vem de São Paulo, sob a forma de um manifesto dos dissidentes do Partido Constitucionalista! Diante dele, a gente tem uma impressão dolorosa, acabrunhante, Já não há mais nada na democracia liberal! Tudo está acabado. As ideias, que tinham envelhecido, morreram. Morreram nas mãos dos intelectuais. Exatamente da ala intelectual do Partido Situacionista de S. Paulo.

 

A corrente signatária do Manifesto tem homens como Alcântara Machado e Motta Filho, Esses dois nomes valem por todos os outros que ficaram do outro lado, com o Diretório.

 

O sr. Alcântara Machado não é apenas o paulista de quatrocentos anos: é o jurista, o intelectual, o escritor brilhante e (ó ironia do Destino!) aquele que escreveu um livro que se chama “Vida e morte do Bandeirante”. Livro que, para escrevê-lo, cumpria ter alma de bandeirante; altiva, corajosa, sem dissimulações. Livro cheio das palpitações do Passado, do brio e do destemor da gente antiga.

 

O sr. Motta Filho é um ensaísta de valor. Um discutidor de ideias. Autor de livros curiosos e penetrantes, como aquele em que estuda o Romantismo brasileiro, com segurança e conhecimento da alma nacional e das correntes de ideias predominantes do país. É autor de um livro sobre Alberto Torres. (“O tema da nossa geração”). Foi fundador Sociedade de Estudos Políticos, de que saiu o Integralismo, e sempre se mostrou um homem de ideias.

 

Esses dois ilustres brasileiros pertencem à corrente que divergiu do Diretório Central do P. C., no último Congresso do Partido.

 

Por que divergiu essa corrente? Por motivos ideológicos? Não, absolutamente não!

 

Então as ideias do P. C. situacionista são as mesmas do P. C. oposicionista? Perfeitamente, são iguais, porque zero é igual a zero. O P.C. não tem ideias.

 

Mas, então o partido do sr. Armando de Salles Oliveira não tem ideias?

 

Não sou eu quem o afirma e sim os próprios signatários do manifesto que nos vem de S. Paulo. O fim do P. C. era única e exclusivamente prestigiar o sr. Armando de Salles Oliveira, desde que para todos os componentes dessa agremiação houvesse “os mesmos deveres e os mesmos direitos”.

 

Quanto aos deveres, já se entende; trata-se de prestigiar o sr. Armando de Salles Oliveira. Quanto aos direitos, francamente, eis aí um assunto em que não vale a pena tocar, porque é humilhante para homens que deveriam ser portadores de aspirações ideológicas e não de cargos e posições.

 

No último Congresso do Partido, houve uma ala que: rompeu. Quais os motivos apresentados? Divergência quanto a programas administrativos? Nada disso. São os próprios manifestantes os que confessam: não estavam sendo nomeados os diretórios do interior indicados por eles; os empregos não estavam sendo distribuídos equitativamente; no Palácio dos Campos Elíseos, eles, os dissidentes, não estavam sendo tratados com os mesmos salamaleques com que o sr. Armando de Salles mimoseava os outros.

 

Foi só por isso que os homens romperam.

 

Nada de ideias, nada de programas, nada de divergência, de orientação. Questão pura e simples de prestigio.

“Não nos pediram colaboração ativa; apenas nos exigiram solidariedade passiva”.

 

Nestas condições, os homens romperam. Com quem? Com o sr. Armando de Salles? Naturalmente que deveria ser. Não há gato e cachorro em S. Paulo que não saiba que o sr. Armando de Salles Oliveira é o inspirador, o guia, o chefe, o dono, o proprietário, o senhor absoluto do Partido Constitucionalista.

 

Dizer que não, é querer tapar o sol com uma peneira.

 

Nestas condições, uma vez que já tínhamos tido à primeira desilusão, quando vimos que os senhores Alcântara e Motta não haviam rompido por motivos ideológicos, esperamos, ao menos, que rompessem com quem de direito, o que seria, pelo menos, uma saída. Uma saída digna, não de intelectuais, mas de homens comuns, como qualquer membro de diretório municipal.

 

Mas — pasmem os céus! — os dissidentes não romperam com sr. Armando de Salles Oliveira.

 

Só romperam com o sr. Laerte Assumpção. Só romperam com o Diretório. O Governador, esse, autor principal das desconsiderações aos reclamantes, continuará recebendo as homenagens dos pobres solicitantes desatendidos. Y

 

É, nestes últimos tempos, incontestavelmente, o Manifesto em questão, o documento mais triste da vida brasileira. É um barômetro. Marca uma altitude. Através dessa tristíssima página, sabemos já por onde andamos e em que nível caminha a política nacional,

E quando nós dizemos que os partidos estão morrendo, os homens práticos nos olham de lado e penalizados, exclamam: — estão sonhando acordados.

 

E é assim, mais cedo do que se pensa, O Integralismo estará triunfante sobre os escombros das velhas estruturas, altivo, dominador e abrindo tempos novos a um Novo Brasil.

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 21 de Fevereiro de 1936.

sábado, 11 de novembro de 2023

SINAIS DE ESFACELAMENTO (16/02/1936)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/   

SINAIS DE ESFACELAMENTO (16/02/1936)

Plínio Salgado

As últimas notícias vindas de todos os pontos do país revelam, de um modo flagrante, a inconsistência das velhas estruturas dos partidos políticos da República.

Evidencia-se uma fase precipitada de decadência. Prenuncia-se a desagregação, Na água régia da vida contemporânea, os partidos não resistem à fatalidade da sua ruína.

E, como os fenômenos sociais e políticos se repetem em ciclos através da vida de um país, o crítico dos acontecimentos atuais deve ter a sua vista voltada para as situações similares, que assinalaram os prelúdios de fases renovadoras, em outros tempos, porém, sob circunstancias semelhantes.

Para os que analisam a fundo os fatos históricos e tiram deles as conclusões norteadoras dos dias presentes, não há surpresas políticas. A política, desde Aristóteles, foi considerada uma ciência. E é justamente porque os homens de partido no Brasil a encaram exclusivamente como arte, que eles nunca podem prever o dia de amanhã.

Não se diga que a política não seja também uma arte. Ella o é, no que tem de intuição, de improviso, de compreensão imediata, de atitude a assumir em dado tempo e dadas condições. Dirigir massas humanas é segredo de estadistas, e os estadistas, como dizia muito bem Napoleão, são, antes de tudo, artistas, construtores de harmonias sociais.

Aos políticos brasileiros, si lhes falta a intuição da política, segundo o conceito de arte, que ela comporta, muito mais lhes falece o sentido científico da política, a consideração dos fenômenos sociais, segundo suas leis constantes, a procura da incógnita da equação presente, mediante o conhecimento de termos históricos indispensáveis à interpretação do instante e previsão segura do Porvir.

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Dois fatos destes dias, aparentemente contraditórios, exprimem uma situação uniforme da vida brasileira e a decadência inevitável de um sistema: o governo de gabinete do Rio Grande do Sul e a cisão no Partido Constitucionalista em São Paulo. Este segundo acontecimento é a chave da revelação do primeiro. Si dias antes disséssemos que a pacificação gaúcha exprimia não um sintoma de agregação, porém, de desagregação, seria difícil de explicar. O caso paulista poupa-nos esse trabalho. Revela um estado de espírito marcante da insubsistência dos partidos na República. Evidencia o caráter de precariedade das organizações políticas regionais, sem conteúdo doutrinário. Mostra que um esfacelamento geral prenuncia o advento de alguma coisa nova.

É condição fundamental do regime liberal-democrático, baseado no sufrágio universal, a existência dos partidos. Quer seja no regime parlamentar, quer seja no presidencialista, não se compreende a democracia com base no voto popular, sem os órgãos captadores desse voto.

Si a vida política do Rio Grande do Sul exigiu o apaziguamento das duas correntes em torno do governo estadual, é porque essa vida política já sentiu os efeitos da vida social, da vida econômica, dos interesses apolíticos. Os partidos se tornaram “indesejáveis” à opinião pública.

Pelo menos é o que se infiro das declarações dos líderes de ambas as facções, pois todos afirmam que, no cenário federal, cada corrente tomará a orientação que quiser, só se entendendo necessária a aglutinação de todos os homens de boa vontade, em torno do Poder, nos estritos Iimites do Rio Grande do Sul. Essa afirmativa, em última análise, quer dizer o seguinte: “nós, gaúchos, estamos convencidos de que as ideias políticas são nocivas aos interesses do Rio Grande, portanto, reconhecemos que essas lutas nocivas só devem ser aplicadas ao Brasil”.

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Reconhecem, pois, os políticos do Rio Grande que a existência de luta partidária é prejudicial a determinada região. Eis aí um precioso argumento, para nós, integralistas, que outra coisa não dizemos há três anos.

Agora, si volvermos os olhos ao Passado, encontramos igual estado de espírito, nas vésperas da decadência do sistema parlamentar e da Monarquia. Foi desde o governo de concentração do Marquês do Paraná. Desde então começa-se a observar o desprestígio, cada vez maior, da monarquia parlamentar. Esse desprestígio acentua-se quando Osório e Caxias, durante a Guerra do Paraguai, não se cansam de dizer que suas espadas não têm partido. Embora praticamente dissentidos e apoiados por facções contrárias, a teoria de ambos era a mesma. Era idêntica, aliás, à do homem extraordinário, de visão realista, que foi o Visconde de Mauá. O facto é que, de 1850 a 1889, os partidos agonizaram, fundiram-se várias vezes em gabinetes de concentração, e, dentro de suas próprias vidas internas, cindiram-se frequentemente.

É aqui que o rompimento de uma ala do Partido Constitucionalista de São Paulo acentua a identidade da situação de decadência dos partidos atuais, com os partidos do Império. Processavam-se, então, duas ordens de fenômenos políticos de absoluta similitude com os fenômenos atuais. Enquanto se movimentavam as correntes para produzir governos de gabinete isentos de colorido nitidamente definidor de qualquer dos dois grandes partidos monárquicos (fato que agora se repete na experiência do Rio Grande do Sul e na tentativa de aplicação do mesmo processo à política federal), por outro lado os partidos internamente se desagregavam.

O partido conservador tinha várias alas, assim como o partido liberal. Dominava, às vezes, num ministério, certa ala dos liberais com determinada ala de conservadores. E tudo isso significava que já não havia uma doutrina, uma diferenciação programática profunda. Tudo se diluía na própria decadência do sistema e em face de novas realidades nacionais.

Enquanto concentravam-se de um lado e internamente se esfacelavam por outro lado, avançava um Pensamento Novo.

Era a República.

Ninguém deteve a República.

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Talvez, nas marchas e contramarchas dos políticos, em meio às preocupações de campanário, assoberbados pelas intrigas, absorvidos pelo combate aos adversários, aflitos sobre o terreno movediço dos imprevistos de todos os momentos (tal qual como agora), os homens eminentes dos partidos imperiais não repararam que, bem próximo deles, Benjamin Constant preparava uma mocidade e que trinta e poucos clubes republicanos em todo o país (exatamente como agora os dois mil e vinte e três núcleos integralistas), infiltravam na massa popular ideias novas, mais consentâneas com as necessidades imediatas do Brasil.

Os políticos não sentiram que estavam se dissolvendo. Que em cada avanço, recuo, marcha de flanco, manobras hábeis ou desastradas, atitudes impulsivas ou sinuosas, o terreno lhes faltava aos pés. Não acreditaram na possibilidade da queda do trono. E o trono caiu.

Caiu sem rumor. Caiu sem nenhuma grandeza, sem ao menos aquela grandeza do verso imortal de Dante, que retumba na Divina Comédia. Foi quase uma queda de teatrinho de bairro, em que está preparado para o personagem o tapete macio ou a cadeira de espaldar para a hora do desmaio,

A dissolução dos partidos processara-se normalmente, como se processa agora. Alas que rompem; correntes que se unem; contramarchas para acordos; ideais de recomposição...

Enquanto isso, os novos Benjamins, Glycerios, Ruys, Demetrios, Silva Jardins, Prudentes, Campos Salles, Aristides Lobo, prontos para entrar em cena.

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Os partidos vivem de doutrina e intransigência. Os partidos morrem de acordos e de composições. O regime republicano, presidencial baseado no voto popular, vive da vida dos partidos. Quando os partidos se fundem é porque anteriormente se sentiram suficientemente desagregados para operar a fusão, Sem decomposição não há composição política. A composição, pois, significa morte dos partidos. A morte dos partidos significa a morte de uma situação geral.

Basta olhar para o Passado e compreenderemos o Presente.

Os Integralistas sabem disso. E prosseguem confiantes e serenos, na sua intransigência doutrinária e incompatibilidade fundamental com qualquer arranjo ou pacificação.

Que morram os outros, pacificamente.

Nós, na luta de todos os dias, palpitamos de vida intensa e nos destinamos a dizer a última palavra.

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 16 de Fevereiro de 1936.

quinta-feira, 2 de novembro de 2023

Nacional-socialismo e Nacionalismo Cristão (14/02/1936)

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/  

Nacional-socialismo e Nacionalismo Cristão (14/02/1936)

Plínio Salgado

Os últimos telegramas da Alemanha informam que o governo de Hitler mandou prender cerca de 150 sacerdotes católicos e centenas de membros das associações católicas, acusados de conspirar contra a segurança do Estado.

Eis aí uma notícia que nos leva a meditar.

Com o exato senso de equilíbrio que deve caracterizar os integralistas e o roteiro político já traçado por mim aos camisas-verdes, no artigo desta folha, intitulado “Carta de Natal e Fim de Ano”, procuro examinar esta gravíssima questão, deduzindo dos acontecimentos que se desenrolam na Alemanha a lição útil para nós, que desejamos criar um Estado Novo, o Estado Forte, mas, principalmente o Estado Cristão.

Que atos teriam praticado os católicos germânicos para incorrer na cólera do Estado Hitlerista? Cumpre aqui, para sermos justos, levantar várias perguntas:

1ª) — Teria o Estado Alemão, no seu objetivo de elevar ao máximo a mística nacionalista e o preconceito das raças superiores, ultrapassado os limites de seus direitos, atingindo, no campo da educação moral e física, os princípios da intangibilidade da “pessoa humana” e da “família”, projeção natural da “pessoa”?

2ª) — Se o Estado Alemão não ultrapassou esses limites, teriam as associações católicas ultrapassado o campo de suas atividades morais e espirituais, imiscuindo-se nas lutas políticas?

Eis duas perguntas que nos levam a considerar os gravíssimos perigos que representam para uma Nacionalidade as atitudes do Estado, ferindo o mais sagrado princípio da liberdade, que é a liberdade de consciência, a intangibilidade da pessoa humana, a invulnerabilidade religiosa da Família; ou as atitudes das autoridades eclesiásticas, no caso de, portando-se o Estado nos estritos limites que lhe impõem os deveres para com Deus, não dando motivos para censura por parte da consciência religiosa, assumirem elas o papel de meros instrumentos da liberal-democracia e das lojas maçônicas, ainda que de um modo inconsciente.

No caso da Alemanha, não tenho dúvidas (pelo que tenho lido nos livros nazistas, notadamente no livro de Hitler, “Minha Luta”, e pelo que tenho deduzido das medidas e iniciativas governamentais) que o governo hitlerista está, sem dúvida nenhuma, infringindo as mais sagradas leis naturais e humanas e dando lugar a que os católicos, ciosos do livre arbítrio e da intangibilidade da personalidade do homem e de sua família, se rebelem contra o Estado.

O hitlerismo, que proclama os seus princípios fantasiosos racistas e as razões históricas da Nação Alemã, em nome da qual desencadeia a guerra aos judeus, tenho para mim que se acha, inconscientemente orientado pelo próprio judaísmo, cujas raízes no Estado Nacional-Socialista revelam-se a cada passo.

O ascetismo, a mística, a super-humanização do tipo “führer”, a sua divinização ao ponto de o considerarem, os mais exaltados, a encarnação de Odin, exprime um artificialismo político, que foge de toda a base e equilíbrio da razão humana, uma vez que não tem o lastro religioso ou o alicerce de uma vocação espiritual específica. Em torno do “führer”, longe de se encontrar o ambiente religioso, encontra-se o ambiente de um nacionalismo pagão, o clima das ressurreições olímpicas de Juliano, o Apóstata. O próprio “socialismo”, lado simpático desse movimento que arrastou tantos proletários, passou para uma segunda plana, predominando a política exclusivamente nacionalista. Esse nacionalismo é uma continuação de Bismarck e um novo capítulo a acrescentar ao estado de espírito que assinalou as vésperas da Grande Guerra.

Não se pode negar ao Nacional-Socialismo, ainda quando ele se haja desviado da linha pura do proletarismo e da revolução social para o ritmo de uma orientação baseada no prestígio da indústria pesada, o verdadeiro milagre que foi a transformação da Alemanha, de país humilhado pelos seus adversários, em Nação respeitada que readquiriu a sua voz no concerto dos povos.

Esse esforço, porém, que dignifica um povo, tenho a impressão de que está sendo explorado por elementos semitas habilmente infiltrados, no sentido de desvirtuá-lo, aparecendo Hitler e a Alemanha, perante o mundo, sob um aspecto antipático.

Havendo censura rigorosa no Reich, não se compreende, por exemplo, que as megalomanias de Rosenberg possam ter circulação em pleno século XX. Há nisso, positivamente, falta de senso de equilíbrio, sentido de proporções, de respeito ao espírito cristão da Nacionalidade.

O caso da esterilização foi outro a revelar o sentido materialista da vida, sentido esse que, nunca, jamais, em tempo algum, conseguiu dar um conteúdo de moral verdadeira e, muito menos, traduzir-se em expressões de ascetismo, que só pode ser compreendido como um desvio, cujas consequências ninguém ainda pode prever.

O Estado tem seus limites, como a personalidade humana tem seus limites. Do mesmo modo, a Religião tem seus limites. Só a inspiração cristã mantém essas relações e os equilíbrios perfeitos. Fora do cristianismo, só pode imperar a violência.

Agora, se o Estado se conserva na sua linha precisa; se o Estado reconhece os limites e a área de ação da autoridade religiosa; se o Estado em matéria de educação estabelece um acordo justo entre os seus interesses nacionais e os interesses espirituais da religião; nesse caso toda e qualquer autoridade religiosa que se insurgir contra ele, não estará fazendo obra espiritual, porém, politicagem, e da mais barata.

Nós, integralistas, que somos coisa absolutamente diferente do nazismo e do fascismo, não nos cansamos de dizer que nosso fundamento é o fundamento cristão. Repetimos mil vezes que jamais caminharemos num rumo pagão, jamais deixaremos de ser um movimento, preliminarmente espiritual, em seguida, social-revolucionário, e, sustentando aqueles dois rumos, colocamos os imperativos da nacionalidade, dentro da qual encontramos ainda as mais sólidas tradições de cristianismo.

Para criar uma raça forte, eugenicamente apta, enérgica, nacionalista, digna, audaz, não precisamos hoje em nossa propaganda e amanhã em nosso governo, ferir os sentimentos religiosos do povo brasileiro, antes pelo contrário, será estribando-nos nele que conseguiremos criar o Estado Integral.

A luta que se esboça na Alemanha, entre católicos e hitleristas, oferece oportunidade para meditarmos no Brasil: nós com o sentimento profundamente cristão que nos inspira, o respeito pelos prelados e sacerdotes da nossa terra; estes, com alta visão política, que lhes não deve faltar na hora presente, evitando que atitudes impensadas de alguns venham lançar o germe de uma animosidade que seria um crime perante a Nação e perante Deus.

Pois será da mútua compreensão e do mútuo entendimento entre os detentores da autoridade religiosa e da autoridade civil que conseguiremos fazer alguma coisa de útil para nossa Pátria.

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 14 de Fevereiro de 1936.