segunda-feira, 27 de novembro de 2023

NAS TREVAS DA HORA PRESENTE (15/02/1936)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

NAS TREVAS DA HORA PRESENTE (15/02/1936)

PLÍNIO SALGADO

Ia eu escrever sobre a situação da França, apreciando os acontecimentos que ontem se desenrolaram em Paris, colocando-os em confronto com o que se passa atualmente em todos os pontos do mundo, numa hora dúbia, incerta, crepuscular,

Com o pensamento em Paris, chega-me a correspondência. Os teclados da máquina calam-se. Tenho um prazer particular de abrir, pessoalmente, esses montes de envelopes e de impressos que me chegam dos lugares mais remotos do Brasil, porque eles exprimem a própria alma da minha gente.

No meio das cartas, encontro um envelope grande. Dentro, alguns exemplares de um jornalzinho. Chama-se "A Lux". Vem de uma cidade remota do interior de Minas E' órgão oficial do Bispado de Aterrado,

Ao prelado daquela pequena cidade já me liga uma afeição delicada. Ele acompanhou com olhos de brasileiro e de Príncipe da Igreja, o meu trabalho, o meu esforço, nesta luta tremenda contra o Espírito do Mal, multiforme, multitudinário, complexo, insidioso, que se apresenta com mil máscaras, mil formas imprevistas, por vezes penetrando o próprio Movimento Integralista, em cujas zonas mais permeáveis tenho de acudir com assistência imediata. Ele compreendeu o anseio do meu espírito, o drama da minha consciência entre a execução de um plano político firmemente delineado e executado com autoridade, e as críticas, muitas vezes de boa fé, porém, falhas dessa intuição que é o segredo dos Estados Maiores e da capacidade dos Chefes, intuição de realidades sociais ambientes, norteadora de atitudes nem sempre compreensíveis. Ele sentiu o meu sofrimento, percebeu as minhas dificuldades, e mandou-me carinhosamente, a oração ao Santo seu predileto, o Arcanjo que guiou o jovem Tobias, que restituiu a vista ao velho Tobias. Por certo que s. ex., o longínquo prelado dos rincões mineiros viu no Brasil maçonizado, no Brasil roído de materialismo, de ceticismo, de incompreensão, que atinge até aos honestos, a figura de cego do velho Tobias. E pediu ao Arcanjo Raphael que me desse um pouco das entranhas do misterioso peixe, que restituiu a vista ao patriarca do Antigo Testamento.

*

* *

Guardei esse gesto de delicadeza dentro do meu coração. Um afeto particular ligou-me a esse brasileiro que nunca vi, nem conheci, e cujo espírito tão nobre e lúcido, ao mesmo tempo tão bondoso, dirigiu-se tão espontaneamente ao meu.

Abro agora este jornalzinho de Aterrado. É tão minúsculo, que coube num envelope de oficio. Em minha memória estavam os "boulevards" de Paris, a Praça da Concórdia, o Quais d'Orsay, as ruas que se dirigem a Saint Germain, itinerários dos funerais do escritor Bainville, realizados anteontem, e trechos meus velhos conhecidos, nas tardes de 1930, quando eu meditava, pelas margens do Sena, sobre a fermentação política do mundo.

Os últimos telegramas davam conta dos tumultos promovidos pela "Action Française", da agressão ao israelita Leon Blun, líder socialista francês, da attitude de Pilatos do sr. Sarraut, dos varejamentos das sedes monarquistas da França, pela "gendarmerie", das represálias da "frente popular", nome covarde que acoberta a III Internacional, cujo bureau central funciona atualmente, não em Moscou, porém, ali mesmo, em Paris.

Os despachos não se referiam, senão de um modo geral, às "organizações da direita", cujo fechamento se pedia no Parlamento. Diante desses fatos, eu meditava sobre a fatalidade de uma inevitável marcha, de um inevitável choque, de uma inevitável solução política em quase todos os países.

Pois da Espanha também não trouxeram os últimos despachos a notícia de um próximo e fortíssimo golpe comunista? E do Chile não nos vieram, na semana corrente, as novas de uma insurreição bolchevista?

Tremendas ameaças pesam sobre o mundo. Mas, o que é mais grave, mais impressionante para todos aqueles que, tendo-se enfronhado dos pormenores das marchas e contramarchas políticas, adquiriram senso agudo da compreensão de todas as manobras táticas e habilíssimas das "forças secretas", que jogam com os governos e os partidos, como títeres, é a identidade de ritmo no combate sistemático exercido, nestes dias, em todas as nações, contra as entidades congêneres ao Integralismo, expressivas das últimas (ou primeiras!) reservas das saudáveis energias nacionais e cristãs.

Votam-se leis, tomam-se providências, em todos os países, para destruir qualquer esforço de salvação nacional extrema. É muita coincidência. Os "camisas azuis", os "Croix du Feu", de França; os "camisas-pretas" da Inglaterra; os "camisas-douradas" do México; os "camisas-prateadas" dos Estados Unidos; os "camisas-pardas" do Chile; os partidos monarquistas, as organizações baseadas nas tradições nacionais; todos estão sendo ameaçados pelos Parlamentos, todos estão tendo contra si a arregimentação das "esquerdas" e dos "centros".

Em alguns países, a manobra tem sido executada com extrema habilidade. Aqui no Brasil, por exemplo, eu estou jogando mais uma partida de xadrez, com as "forças ocultas", do que uma batalha em campo raso. Desde que as "pranchas" do Grande Oriente circularam nas Lojas, comecei a sentir, não por parte dos maçons, diretamente, mas por parte de elementos de boa fé, porém ingênuos desconhecedores das tramas secretas, o combate ao Integralismo.

Não perder a calma, tem sido o meu lema. Não agir com precipitação, tem sido o meu método. Não dar expansão à minha impulsividade, tem sido o meu system. Examinar, pesar, distinguir, ensurdecer às vezes, perdoar muitas outras, procurar esclarecer em todas as oportunidades, serenamente e com firmeza. Do contrario, já teríamos fracassado, Pois tão imprevistos, simultâneos, incompreensíveis são os golpes que desferem sobre nós, integralistas, que eu tenho de estar atento para todos os lados.

Tem-se criado uma atmosfera de desconfiança entre o Integralismo e as religiões, especialmente, entre o Integralismo e a Igreja Católica; tem-se fomentado indisposições de operários contra nós, tachados que somos de defensores da burguesia, e tem-se estimulado o temor dessa mesma burguesia contra o Sigma, apontado como dissimulação do comunismo... Comparam o nosso movimento ao hitlerista, quando não somos racistas, nem nacionalistas cegos, porém brasileiros e cristãos. Acusam-nos de inimigos da liberdade, de subversores do regime, quando clamamos exatamente pela recomposição do equilíbrio das liberdades e fortalecimento do regime republicano, federativo e presidencial, por meio de um novo sistema de captação das vontades que pretendemos se exprimam através dos órgãos naturais e cristãos das corporações.

Essa campanha é feita habilmente por elementos que não aparecem na arena do combate. Combina-se, por exemplo, numa Loja, que tais e tais elementos de prestígio social, conhecidos como católicos, frequentadores do palácio do Bispo "x", insinuem, em palestras, o perigo que o Integralismo representa para a religião, etc. Os argumentos são sempre habilíssimos porque pertencem àquele que, revestindo a forma de serpente, desde a primeira insídia, escolheu essa forma por ser a víbora "o mais astuto dos animais".

Os recentes acontecimentos políticos da França revelam a mesma situação de intriga pérfida em que se envolvem as forças nacionais, ansiosas pela ordem, pela disciplina, pela grandeza de suas Pátrias.

É, no instante em que ia eu comentar estes fatos, que a imprensa, em geral, não focaliza no seu verdadeiro aspecto, eis que um jornalzinho remoto, de um Bispado longínquo, jornalzinho tão pequenino e humilde que cabe dentro de um envelope, chega e se revela aos meus olhos um intérprete seguro, firme, dos fatos que se desenrolam na vida brasileira e cuja lógica profunda nem todos os espíritos apreendem.

Na defesa do Integralismo, esse pequenino jornal do esquecido interior brasileiro, tão grande, porém, como o coração e a inteligência de um dos prelados mais ilustres pelos dotes Moraes e intelectuais e pela delicadeza de sentimentos, desenvolve a lógica legítima, a lógica única, a argumentação seguríssima que se resume, em numerosos artigos de vários de seus números, neste pensamento: se a maçonaria e o comunismo são contrários ao Integralismo, é porque os princípios deste são aqueles mesmos que motivam o ódio daquelas duas forças "internacionais" contra os católicos.

No meio das trevas da hora presente, como é doce receber um tênue raio de luz, humilde, simples e vivificante, como uma réstea luminosa de sol!

Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 15 de Fevereiro de 1936.

Nenhum comentário:

Postar um comentário