domingo, 31 de março de 2024

O Estado Novo (04/11/1936)

 

Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente, é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/

O Estado Novo (04/11/1936)

Plínio Salgado

Li o belo telegrama de Lisboa, descrevendo a formidável manifestação de 50.000 pessoas ao Ministro Salazar. Essa extraordinária demonstração da vitalidade da alma lusitana despertou em meu espírito duas evocações.

A primeira foi a da emoção que senti quando numa bela manhã de céu azul e claro sol, subi à Torre de Belém, e contemplei o Tejo. Barcos de grandes velas pardas corriam mansamente. Eu olhava aquele rio de onde partiram um dia os "barões assinalados". Pensava nas reservas de força e de tenacidade desse pequeno povo que foi dominador dos oceanos, descobridor de continentes, desvendador dos mistérios da Costa d'África e do Mar Tenebroso.

Os brasileiros costumam, depois de visitar todos os países da Europa, passar pela Pátria de seus avós para falar mal dela. Invariavelmente, antes do fascismo e do salazarismo, todos os nossos patrícios que vinham do Velho Mundo, precisavam falar contra a Itália e Portugal, batendo sempre a mesma tecla. Esses nossos patrícios esqueciam-se de duas coisas: 1º) que no tempo em que o progresso, o esplendor, a força das nacionalidades dependia de valentia e de talento, foram esses povos latinos, as repúblicas italianas, os reinos de Espanha e Portugal que dominaram como potências; 2º) que, menosprezando os povos latinos, menosprezávamos as nossas próprias origens, e no menoscabo a Portugal, feriamos diretamente as nossas mais próximas raízes étnicas.

Ali, na Torre de Belém, na bela manhã, eu me lembrava daqueles que, no promontório de Sagres, sonharam a conquista de todos os mares, e da foz do Tejo partiram como audazes gigantes dominadores dos quadrantes do mundo. Considerava que, no advento da hulha e da navegação a vapor, sucedeu o declínio daquele grande pequeno povo, que não possuía carvão de pedra. Pensava quanto nos devemos orgulhar de ter como ancestrais os desbravadores de oceanos e de selvas.

A outra lembrança que me ocorreu foi de Sardinha, o criador do Estado Novo português.

Se não tivesse existido Sardinha não existiria Salazar. Se Sardinha não escrevesse os livros que escreveu e não gastasse os dias de sua luminosa mocidade na criação da mística do Estado Novo. Portugal, hoje, não seria o que é: uma voz respeitada entre as Nações, uma voz que se levanta altivamente e, sozinha, assume atitude desassombrada contra o pérfido Soviete.

As transformações do Estado não se fazem com medalhões, com discursos de governadores ou de deputados ou ministros. A grandeza dos povos não se faz por meio de decretos. O espírito nacional não se desperta só pelo fato de um homem de posição política pronunciar um discurso num banquete.

Enganam-se os que pensam que um país, quando está a pique de desagregação e ruína, pode salvar-se com uma plataforma de governo ou algumas leis modificando as estruturas políticas do Estado.

As leis, antes de serem leis, precisam viver na alma do Povo. O papel apenas consagra o que já foi consagrado na mística popular. A mística popular não se forma de um dia para outro. Ela provem de uma doutrina, e essa doutrina terá tido um longo período em que foi pensada e mais do que pensada, sofrida.

Depois, não basta expor a doutrina. É preciso viver a doutrina. É a obra do apostolado Mas o próprio apostolado não será apostolado, se tiver facilidades. Ele deve encontrar dificuldades, oposições, perseguições e opressões. Deve sofrer as incompreensões. Deve amargar

Um apostolado feito em carros "pulmann", com passes de estrada de ferro, com despesas pagas sem esforço é um apostolado ridículo, incapaz, por isso mesmo, de penetrar alma das massas.

Só o facto do apostolo dispor de empregos, proteções, máquinas de perseguição aos contrários, prestígio político, força material é o suficiente para ser um apostolo fracassado.

A luta deve ser áspera, deve ser dolorosa, deve ser o suplício de cada dia. O pregador deve ser injuriado e caluniado, deve ser falseado e negado, ser espezinhado e humilhado. Só então resplandece nele a luz misteriosa que os olhos materiais não veem, mas que os olhos da alma deslumbradamente sentem.

O Estado Novo fez de Portugal pequenino um Grande Portugal. Fez de um Portugal sem voz no concerto das Nações, uma voz que retumba com força e decisão. Mas Portugal não seria Portugal se não houvesse o apostolado de Sardinha e dos moços que o rodearam.

Antônio Sardinha pertenceu à raça daqueles para quem o Poder não exerce a mínima sedução. Pertenceu à raça dos grandes construtores. Dos alicerçadores. Dos criadores. Dos gênios, mil vezes negados. Mas a ele e deve a marcha de Portugal para o Estado Novo e a glória da gente lusitana nos dias atuais.

Sardinha morreu quase de repente, estupidamente, de uma septicemia que lhe entrou por una pequena inflamação no pé. Estava em viagem pelo interior de Portugal. Trouxeram-no urgentemente a Lisboa, mas já, era tarde.

Ele tinha cumprido a sua missão, como a cumprira, sob outro aspecto, Sidonio Paes.

O Destino reservou para Portugal uma coincidência curiosa. Na chefia do governo está Carmona, militar como Sidonio, penetrado pelo mesmo pensamento dele; na pasta de primeiro ministro, está Salazar, civil como Sardinha.

O telegrama de ontem, anunciando uma manifestação de 50.000 portugueses conscientes, trouxe-me à lembrança a figura de Sardinha, o doutrinador.

Ele foi como Corradini na Itália, como Jackson de Figueiredo no Brasil.

Ainda não se fez Justiça a Sardinha. É preciso glorifica-lo.

Eu recomendo aos integralistas do Brasil que leiam as obras desse escritor português. Seu pensamento político não é exatamente o nosso, mas muito se aproxima da nossa concepção de democracia e de autoridade nacional.

Lendo-o, compreender-se-á que ele é o autor de tudo. Do outro mundo, como o autor de uma peça de gênio, ele assiste no palco maravilhoso da sua terra, a representação da sua obra. Talvez os atores não executem com precisão o pensamento do autor. Mas, seja lá como for, a obra é daquele que a imaginou e a criou.

Publicado orginalmente n’A OFFENSIVA em 04 de Novembro de 1936.

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