Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi
possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder
Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior
Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente,
é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o
trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/
A Pátria, acima de tudo! (09/05/1936)
PLÍNIO SALGADO
Três hipóteses se apresentam ao nosso
espírito em face da situação nacional:
1ª) - A situação do país é gravíssima;
2ª) - A situação é apenas grave;
3ª) - A situação não é grave.
Na primeira hipótese, devemos examinar
em que consiste uma situação gravíssima. Evidentemente que ela consiste em circunstancias
que se refletem nas próprias relações internacionais do país; é o caso da
intervenção em nossa vida interna de um inimigo estrangeiro, ou a ameaça premente
da invasão do nosso território. Nesta emergência, o Governo precisa
encontrar-se armado de meios, de modo a defender com a máxima eficiência e
rapidez a soberania nacional e a honra da Pátria. Temos diante de nós o caso típico
do "estado de guerra". Defendido pela legislação em vigor esse
"estado de guerra" suspende todas as garantias constitucionais,
relativas à liberdade de pensamento, de reunião, de propaganda, de atuação política,
ficando essa liberdade condicionada ao Juízo do próprio Poder Executivo, que
decide, a favor ou contra, através das autoridades que hierarquicamente o
encarnam.
Esse eclipse necessário das liberdades
públicas, essa restrição da amplitude do exercício dos direitos democráticos,
para surtir seus completos efeitos terá como consequência lógica a ineficácia
de quaisquer institutos assecuratórios dos referidos direitos, dando-se por
suspensas as concessões de mandados ou outros remédios jurídicos por parte de juízos
ou tribunais do país; porquanto seria insuficiente a abolição das liberdades
pelo Executivo, quando o Judiciário lhe anulasse a possibilidade de ação.
Que resulta disso? Resulta que "estado
de guerra" firma o princípio da prioridade absoluta do Poder Executivo
durante período de sua vigência. Firmado esse princípio, que decorre dele?
Decorre que, tanto em teoria, como na prática, os Poderes Judiciário e Legislativo
cessam de funcionar, este, de um modo completo, e aquele em tudo o que disser
respeito a quaisquer recursos ou ações referentes aos reclamos das liberdades
públicas asseguradas pela Constituição e pela Legislação em vigor nas épocas normais.
Agora, da suspensão temporária dos
Poderes Legislativo e Judiciário, quais serão as consequências? Essas consequências
são todas aquelas que decorram do princípio firmado de que o Governo Federal
não deve encontrar óbices de espécie alguma nas atividades repressoras da anarquia
ou da guerra que se levantam contra o Estado Nacional. Não existindo os Poderes
Legislativo e Judiciário, temos 1º - não há imunidade parlamentares nem
garantias especiais à magistratura, 2º) - a autonomia dos Estados sofre as restrições
decorrentes da declaração da prioridade do Executivo Federal sobre os dois
outros poderes da União, porquanto, se em matéria de providencias de ordem
policial ou militar, aqueles poderes podem criar embaraços, muito maiores embaraços
poderiam criar outros tantos Executivos agindo por conta própria e muitas vezes
em divergência com os supremos interesses nacionais.
Aberto um parêntesis na normalidade da
vida constitucional, deixando de, virtualmente, existir, para interpretarmos os
estritos termos legais referentes ao "estado de guerra", o
Legislativo, através do qual se manifesta a opinião pública, e o Judiciário,
que garante a execução da Lei Eleitoral, a interpretação exata da Lei de
Segurança Nacional, a aplicação concreta dos textos da Constituição,
logicamente serão nulas todas as eleições realizadas na vigência do
"estado de guerra".
O direito do voto, principalmente depois
que entrou em vigor a nova Lei Eleitoral que objetiva, de modo claro, po(...) expresso,
a representação partidária, só se torna efetivo mediante o exercício de vários
direitos que lhe são forçosamente inerentes: o direito de reunião, o direito de
propaganda, o direito de locomoção.
Ora, esses direitos não existem no
"estado de guerra". A Lei Eleitoral, por exemplo, proíbe aos partidos
a propaganda quarenta e oito horas antes da eleição; é exatamente dentro desse período
que o governo suspende o "estado de guerra" para a realização do comício
eleitoral.
Essas são as consequências do “estado
guerra”, tão necessário na hora presente, consoante o que se infere das
informações do Poder Executivo.
Aceita, pois, a hipótese de que a situação
do país é gravíssima, só nos portaremos com patriotismo e dignidade, aprovando
e até aplaudindo "estado de guerra". E uma vez que aprovemos e aplaudamos,
teremos de concordar, e jamais nos rebelarmos contra as consequências de remédio
heroico, de uma providência cauterizante, a que foi levado o Governo, em um
momento doloroso da vida nacional.
Regulamentar o "estado de
guerra" será reconhecer que a situação não é gravíssima, porém apenas
grave. Ora, se assim é, basta aplicar ao país o "estado de sítio", de
menores efeitos, ou até mesmo, socorrermo-nos tão só da legislação em vigor: a Lei
de Segurança Nacional, os Códigos Penais.
Mas eu pergunto: quem saberá melhor do
que o Executivo das necessidades imediatas do Brasil, no tocante à Segurança
Nacional?
Acaso o Legislativo?
Mas não foi Legislativo que, nas vésperas
de rebentar a revolução comunista de novembro, votou, por 80 votos contra 72,
uma indicação ao presidente da República, para que, ou "fechasse a Acção
Integralista Brasileira", ou "reabrisse a Aliança Nacional
Libertadora"?
As Chefaturas de Polícia de todo o país
e os Comandos das Regiões Militares verificaram, dias depois dessa atitude da Câmara,
que a Aliança Nacional Libertadora estava envolvida como personagem de primeiro
plano, na revolução de novembro. Essas mesmas autoridades verificaram os
relevantes serviços prestados, na defesa da Ordem e do Governo da República,
pela Acção Integralista Brasileira, tendo disso dado testemunhos públicos o
chefe de Polícia da Capital Federal e o próprio presidente da República, em
expressivo telegrama ao Chefe do Integralismo,
Como pode a Nação confiar no Poder
Legislativo, quando ele, na melhor das hipóteses, para não o acusarmos, nem de
leve, de conivência com os comunistas, se mostrou tão mal informado, nas vésperas
da intentona de novembro?
Por uma coincidência, naqueles dias,
os jornais publicavam uma correspondência de Moscou, dando conta dos trabalhos
do Congresso da Internacional Comunista, e reproduzindo considerações de
Dimitroff, em discurso através do qual afirmava que os comunistas brasileiros
iriam manobrai o nosso Legislativo, no intuito do combater o Integralismo, como
ato preparatório da insurreição bolchevista.
Não quero acusar os nossos patrícios,
com assento na Câmara Federal, do conhecimento dessa pérfida manobra da Rússia,
império com o qual devemos nos considerar em guerra, pela petulância e
menosprezo a nossa dignidade de Povo Livre, revelada na ingerencia em assuntos
de nossa política interna. Não: eu ainda creio no patriotismo da Câmara e do
Senado Federais. Não posso conceber que esses homens, tão atacados e às vezes
injustamente caluniados em razão de males que não deles, mas do sistema político
decorrem, não posso conceber que, pais família, cristãos e brasileiros, que o são
e muitos até paradigmas de tradições legítimas, dessem por tão barato o
interesse nacional, subordinando-o a caprichos fúteis.
Mas o em que me firmo é no seu desconhecimento
habitual por parte do Legislativo, das tramas ardilosas e hábeis maquiavelismos,
que só o Executivo, pela sua ação constante e vigilância incansável, pode
conhecer nos seus mínimos pormenores, muitos dos quais, no interesse mesmo da
Nação. No caso de serem levados à arena dos debates parlamentares,
prejudicariam a defesa nacional.
Ainda está quente e fumegante o sangue
dos militares que, na defesa dos lares brasileiros, entre os quais os dos próprios
congressistas, tombaram nos dias trágicos de novembro. Cumpre pensemos nisso,
antes que nos aferremos prerrogativas que, no momento, devemos renunciar em
holocausto a nossa Pátria e ao sacrifício de nossos irmãos militares que ainda
estão arriscados a morrer por nós, pelas nossas famílias.
Não queremos nós, os integralistas, nenhum
mal aos senhores deputados senadores, antes, pelo contrario, desejamos a suas famílias,
a sua religião, a sua liberdade, tanto quanto de bem aspiramos para todos os
camisas-verdes; entendemos, no entanto, que a hora é para que tenhamos, todos
nós, muito juízo, muito bom senso, sufocando em nós todas as vaidades.
Que o Poder Executivo, e ele, que
responde diretamente pela honra nacional, decida de tudo, neste momento.
Se, porém, a situação não é grave, o
que constitui a terceira das hipóteses acima aventadas, neste caso, nem
"estado de guerra", nem "estado de sitio" se justificariam.
Não podemos, em todo o caso, brincar
num instante como este. E brincadeira será sempre toda qualquer manobra que
elementos extremistas disfarçados e habilíssimos executarem no Legislativo,
abusando da boa fé de honrados pais de família, que ali tem assento, para que
votem de acordo com inconfessáveis desígnios de inimigos que a eles próprios,
deputados e senadores, pretendem trucidar.
Que jamais nas horas sérias, em quaisquer
episódios da vida parlamentar, mesmo o das eleições internas de comissões,
quando todo Brasil aflito quer confiar nos homens de responsabilidade, tenhamos
o espetáculo de um Senado de Calígula, resolvendo, sobre as desgraças de Roma,
qual melhor molho de peixe.
Nós, integralistas, ainda acreditamos
que não nos faltará, a nós, brasileiros, de todos os partidos e de todas as
condições, essa coisa tão indispensável e que, por mais que pareça vulgar, é
rara e preciosa: juízo.
Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 09 de Maio de 1936.