A QUARTA HUMANIDADE
sexta-feira, 20 de setembro de 2024
domingo, 1 de setembro de 2024
CARTA DE PLÍNIO SALGADO A RAYMUNDO PADILHA (02/04/1973)
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Carta de Plínio Salgado a Raymundo Padilha |
Esclarecimento: A publicação da Carta abaixo só se tornou
possível graças à generosa colaboração do Sr. Bruno Padilha, que tendo
encontrado a missiva na Memorabilia Familiar e percebendo sua importância
histórica, a liberou para divulgação. A Carta em questão acompanhou o exemplar
do magnífico discurso pronunciado por Plínio Salgado, na Câmara Federal, quando
da comemoração dos 40 Anos do Manifesto de Outubro de 1932.
CARTA DE PLÍNIO SALGADO A RAYMUNDO PADILHA
Brasília, 2 de abril
de 1973
Padilha,
não se poderia resumir em 40 minutos a
história e a significação do maior movimento de ideias e de ação prática
realizado no Brasil desde a Independência até nossos dias. Sem precedentes nem
outros posteriores que se lhe comparem, dele muito se tem escrito, ou pelas raposas
malévolas, ou pelos jumentos ignorantes, ou pelos batráquios que se fartam de
coaxar diante do que não entendem. Falta-nos um trabalho sério que seria
dividido nas seguintes partes: I) - O pensamento brasileiro a partir do século XVIII até o
primeiro quartel do século XX; II)- Fundamentos filosóficos do Integralismo;
III) - Sociologia e política integralistas; IV) História do movimento até o
golpe de Estado de 1937 e de 1937 a 1945; V) Influência das ideias integralistas
no país e no exterior. Isto, em linhas gerais, que devem incluir
pormenores relativos a acontecimentos até hoje deturpados.
Talvez
um dia esse trabalho apareça. Por enquanto, temos de nos conformar com resumos,
como esse que lhe envio, com lacunas, saltos, omissões, pois não se poderia
fazer mais num pequeno discurso limitado por exigências regimentais.
Além
disso, o folheto está com muitos erros de revisão, como sejam trocas de letras,
desconcordâncias e até o título do livro do Oliveira Viana que saiu como
"O Caso do Império"...
Em
todo o caso, foi comemorado o "Quadragésimo ano" da nossa encíclica
mais vivida do que falada mas que também trazia ao povo brasileiro "cousas
novas" ("Rerum novarum").
Abraço
velho e novo da velha e sempre renovada amizade do seu compadre.
PLÍNIO
SALGADO
quinta-feira, 29 de agosto de 2024
A Pátria, acima de tudo! (09/05/1936)
Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi
possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder
Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior
Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente,
é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o
trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/
A Pátria, acima de tudo! (09/05/1936)
PLÍNIO SALGADO
Três hipóteses se apresentam ao nosso
espírito em face da situação nacional:
1ª) - A situação do país é gravíssima;
2ª) - A situação é apenas grave;
3ª) - A situação não é grave.
Na primeira hipótese, devemos examinar
em que consiste uma situação gravíssima. Evidentemente que ela consiste em circunstancias
que se refletem nas próprias relações internacionais do país; é o caso da
intervenção em nossa vida interna de um inimigo estrangeiro, ou a ameaça premente
da invasão do nosso território. Nesta emergência, o Governo precisa
encontrar-se armado de meios, de modo a defender com a máxima eficiência e
rapidez a soberania nacional e a honra da Pátria. Temos diante de nós o caso típico
do "estado de guerra". Defendido pela legislação em vigor esse
"estado de guerra" suspende todas as garantias constitucionais,
relativas à liberdade de pensamento, de reunião, de propaganda, de atuação política,
ficando essa liberdade condicionada ao Juízo do próprio Poder Executivo, que
decide, a favor ou contra, através das autoridades que hierarquicamente o
encarnam.
Esse eclipse necessário das liberdades
públicas, essa restrição da amplitude do exercício dos direitos democráticos,
para surtir seus completos efeitos terá como consequência lógica a ineficácia
de quaisquer institutos assecuratórios dos referidos direitos, dando-se por
suspensas as concessões de mandados ou outros remédios jurídicos por parte de juízos
ou tribunais do país; porquanto seria insuficiente a abolição das liberdades
pelo Executivo, quando o Judiciário lhe anulasse a possibilidade de ação.
Que resulta disso? Resulta que "estado
de guerra" firma o princípio da prioridade absoluta do Poder Executivo
durante período de sua vigência. Firmado esse princípio, que decorre dele?
Decorre que, tanto em teoria, como na prática, os Poderes Judiciário e Legislativo
cessam de funcionar, este, de um modo completo, e aquele em tudo o que disser
respeito a quaisquer recursos ou ações referentes aos reclamos das liberdades
públicas asseguradas pela Constituição e pela Legislação em vigor nas épocas normais.
Agora, da suspensão temporária dos
Poderes Legislativo e Judiciário, quais serão as consequências? Essas consequências
são todas aquelas que decorram do princípio firmado de que o Governo Federal
não deve encontrar óbices de espécie alguma nas atividades repressoras da anarquia
ou da guerra que se levantam contra o Estado Nacional. Não existindo os Poderes
Legislativo e Judiciário, temos 1º - não há imunidade parlamentares nem
garantias especiais à magistratura, 2º) - a autonomia dos Estados sofre as restrições
decorrentes da declaração da prioridade do Executivo Federal sobre os dois
outros poderes da União, porquanto, se em matéria de providencias de ordem
policial ou militar, aqueles poderes podem criar embaraços, muito maiores embaraços
poderiam criar outros tantos Executivos agindo por conta própria e muitas vezes
em divergência com os supremos interesses nacionais.
Aberto um parêntesis na normalidade da
vida constitucional, deixando de, virtualmente, existir, para interpretarmos os
estritos termos legais referentes ao "estado de guerra", o
Legislativo, através do qual se manifesta a opinião pública, e o Judiciário,
que garante a execução da Lei Eleitoral, a interpretação exata da Lei de
Segurança Nacional, a aplicação concreta dos textos da Constituição,
logicamente serão nulas todas as eleições realizadas na vigência do
"estado de guerra".
O direito do voto, principalmente depois
que entrou em vigor a nova Lei Eleitoral que objetiva, de modo claro, po(...) expresso,
a representação partidária, só se torna efetivo mediante o exercício de vários
direitos que lhe são forçosamente inerentes: o direito de reunião, o direito de
propaganda, o direito de locomoção.
Ora, esses direitos não existem no
"estado de guerra". A Lei Eleitoral, por exemplo, proíbe aos partidos
a propaganda quarenta e oito horas antes da eleição; é exatamente dentro desse período
que o governo suspende o "estado de guerra" para a realização do comício
eleitoral.
Essas são as consequências do “estado
guerra”, tão necessário na hora presente, consoante o que se infere das
informações do Poder Executivo.
Aceita, pois, a hipótese de que a situação
do país é gravíssima, só nos portaremos com patriotismo e dignidade, aprovando
e até aplaudindo "estado de guerra". E uma vez que aprovemos e aplaudamos,
teremos de concordar, e jamais nos rebelarmos contra as consequências de remédio
heroico, de uma providência cauterizante, a que foi levado o Governo, em um
momento doloroso da vida nacional.
Regulamentar o "estado de
guerra" será reconhecer que a situação não é gravíssima, porém apenas
grave. Ora, se assim é, basta aplicar ao país o "estado de sítio", de
menores efeitos, ou até mesmo, socorrermo-nos tão só da legislação em vigor: a Lei
de Segurança Nacional, os Códigos Penais.
Mas eu pergunto: quem saberá melhor do
que o Executivo das necessidades imediatas do Brasil, no tocante à Segurança
Nacional?
Acaso o Legislativo?
Mas não foi Legislativo que, nas vésperas
de rebentar a revolução comunista de novembro, votou, por 80 votos contra 72,
uma indicação ao presidente da República, para que, ou "fechasse a Acção
Integralista Brasileira", ou "reabrisse a Aliança Nacional
Libertadora"?
As Chefaturas de Polícia de todo o país
e os Comandos das Regiões Militares verificaram, dias depois dessa atitude da Câmara,
que a Aliança Nacional Libertadora estava envolvida como personagem de primeiro
plano, na revolução de novembro. Essas mesmas autoridades verificaram os
relevantes serviços prestados, na defesa da Ordem e do Governo da República,
pela Acção Integralista Brasileira, tendo disso dado testemunhos públicos o
chefe de Polícia da Capital Federal e o próprio presidente da República, em
expressivo telegrama ao Chefe do Integralismo,
Como pode a Nação confiar no Poder
Legislativo, quando ele, na melhor das hipóteses, para não o acusarmos, nem de
leve, de conivência com os comunistas, se mostrou tão mal informado, nas vésperas
da intentona de novembro?
Por uma coincidência, naqueles dias,
os jornais publicavam uma correspondência de Moscou, dando conta dos trabalhos
do Congresso da Internacional Comunista, e reproduzindo considerações de
Dimitroff, em discurso através do qual afirmava que os comunistas brasileiros
iriam manobrai o nosso Legislativo, no intuito do combater o Integralismo, como
ato preparatório da insurreição bolchevista.
Não quero acusar os nossos patrícios,
com assento na Câmara Federal, do conhecimento dessa pérfida manobra da Rússia,
império com o qual devemos nos considerar em guerra, pela petulância e
menosprezo a nossa dignidade de Povo Livre, revelada na ingerencia em assuntos
de nossa política interna. Não: eu ainda creio no patriotismo da Câmara e do
Senado Federais. Não posso conceber que esses homens, tão atacados e às vezes
injustamente caluniados em razão de males que não deles, mas do sistema político
decorrem, não posso conceber que, pais família, cristãos e brasileiros, que o são
e muitos até paradigmas de tradições legítimas, dessem por tão barato o
interesse nacional, subordinando-o a caprichos fúteis.
Mas o em que me firmo é no seu desconhecimento
habitual por parte do Legislativo, das tramas ardilosas e hábeis maquiavelismos,
que só o Executivo, pela sua ação constante e vigilância incansável, pode
conhecer nos seus mínimos pormenores, muitos dos quais, no interesse mesmo da
Nação. No caso de serem levados à arena dos debates parlamentares,
prejudicariam a defesa nacional.
Ainda está quente e fumegante o sangue
dos militares que, na defesa dos lares brasileiros, entre os quais os dos próprios
congressistas, tombaram nos dias trágicos de novembro. Cumpre pensemos nisso,
antes que nos aferremos prerrogativas que, no momento, devemos renunciar em
holocausto a nossa Pátria e ao sacrifício de nossos irmãos militares que ainda
estão arriscados a morrer por nós, pelas nossas famílias.
Não queremos nós, os integralistas, nenhum
mal aos senhores deputados senadores, antes, pelo contrario, desejamos a suas famílias,
a sua religião, a sua liberdade, tanto quanto de bem aspiramos para todos os
camisas-verdes; entendemos, no entanto, que a hora é para que tenhamos, todos
nós, muito juízo, muito bom senso, sufocando em nós todas as vaidades.
Que o Poder Executivo, e ele, que
responde diretamente pela honra nacional, decida de tudo, neste momento.
Se, porém, a situação não é grave, o
que constitui a terceira das hipóteses acima aventadas, neste caso, nem
"estado de guerra", nem "estado de sitio" se justificariam.
Não podemos, em todo o caso, brincar
num instante como este. E brincadeira será sempre toda qualquer manobra que
elementos extremistas disfarçados e habilíssimos executarem no Legislativo,
abusando da boa fé de honrados pais de família, que ali tem assento, para que
votem de acordo com inconfessáveis desígnios de inimigos que a eles próprios,
deputados e senadores, pretendem trucidar.
Que jamais nas horas sérias, em quaisquer
episódios da vida parlamentar, mesmo o das eleições internas de comissões,
quando todo Brasil aflito quer confiar nos homens de responsabilidade, tenhamos
o espetáculo de um Senado de Calígula, resolvendo, sobre as desgraças de Roma,
qual melhor molho de peixe.
Nós, integralistas, ainda acreditamos
que não nos faltará, a nós, brasileiros, de todos os partidos e de todas as
condições, essa coisa tão indispensável e que, por mais que pareça vulgar, é
rara e preciosa: juízo.
Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 09 de Maio de 1936.
sábado, 17 de agosto de 2024
AS CORTES DO SIGMA (14/10/1936)
Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi
possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder
Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior
Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente,
é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o
trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/
AS CORTES DO SIGMA (14/10/1936)
PLÍNIO SALGADO
Estão chegando os Chefes Provinciais
de todo o Brasil, para tomarem parte nas grandes assembleias das Cortes do
Sigma. Uns chegam em navios, outros viajam de avião, outros por estrada de
ferro.
As Cortes do Sigma exprimem a suprema
autoridade coletiva do Movimento Integralista. Constituem-se do Supremo
Conselho, do Secretariado Nacional, da Câmara dos Quarenta e dos Chefes Provinciais.
Tomam também parte nas assembleias Integralistas de projeção no partido,
escolhidos para esse fim pelo Chefe Nacional, ainda quando não ocupem cargos
administrativos ou políticos.
Ao mesmo tempo que se realiza essa
imponente reunião dos grandes dignitários da confiança da Chefia Nacional,
assistiremos a dois Congressos na Capital da República: o 1º Congresso Nacional
Feminino da A. I. B. e o Conclave Parlamentar das Províncias Meridionais.
Ao 1o Congresso Nacional Feminino
comparecem mais de um milhar de blusas-verdes, que já estão chegando de todos
os pontos do país Pela primeira vez a mulher integralista vai realizar uma
imponente assembleia, traçando as vastas diretrizes de ação prática. Serão
lidas teses, serão assentadas providências, serão esclarecidas quaisquer dúvidas
regulamentares e protocolares, será finalmente estabelecido um plano a ser
executado no campo da arregimentação feminina, da infância e da juventude.
Firmar-se-ão as normas de combate ao materialismo, ao comodismo, à displicência,
ao ceticismo, e as da propaganda mais intensa do idealismo construtor da Grande
Pátria por cujo espírito responde com tamanha responsabilidade o próprio espírito
da mulher patrícia.
Ao Conclave Parlamentar das Províncias
Meridionais comparecem os vereadores, os prefeitos e os deputados eleitos pela
Acção Integralista Brasileira.
Pela primeira vez no Brasil se reúnem
os vereadores das Câmaras Municipais e os prefeitos pertencentes a uma corrente
politica, para estudar assuntos técnicos e administrativos.
A preocupação de planificar, de racionalizar
a execução de um programa nos âmbitos municipais evidencia o empenho que pomos
na futura planificação e racionalização de um largo programa de realizações nacionais.
O Município é, para os integralistas,
a base fundamental da Unidade da Pátria. A sua autonomia tem sido sistematicamente
destruída pela política centralizadora das Províncias erigidas em Estado.
Soberano. Todos os males de que se acusam as administrações municipais não
provém do Município em si mesmo, porém da interferência de partidos estaduais
na vida municipal. Essa interferência pela pressão do prestígio de organizações
partidárias externas redunda nesta desgraça: o povo de um Município, jamais
escolhe livremente os seus representantes Municipais. Uma verdadeira máquina
organizada de compressão eleitoral, manobrada através de um diretório político,
em remoções e demissões de funcionários, em nomeações de autoridades policiais
previamente orientadas no sentido das perseguições mais atrozes, o arbítrio na
distribuição de verbas para serviços públicos, tudo isso atrofia o espírito autonômico
dos Municípios, impedindo que a escolha dos vereadores e prefeitos se dê de conformidade
com os interesses da cidade.
Em consequência disso, geralmente as
administrações são más, pois nunca pesa sobre os administradores a ameaça da
retirada da confiança do eleitorado, uma vez que esses vereadores e prefeitos
se julgam garantidos em futuras eleições, pela força externa do partido que
interfere na vida municipal, anulando, praticamente, a teórica autonomia que a
Carta Constitucional consagra.
Os resultados dessa crescente
dominação dos sindicatos eleitorais organizados nas capitais das Províncias
sobre os Municípios inermes são extremamente graves para a Unidade Nacional. É
que, cada vez mais, desvirtuando-se a Democracia, sufocando-se a Liberdade, os
governadores dos Estados, acastelados no partido situacionista, fortalecem-se
em somas eleitorais e com elas ameaçam o Poder Central da República.
O fenômeno que se observa (e só os cegos
ou os loucos não percebem) é a concomitância de dois fatos inegáveis, que se acentuam
no desenvolvimento da política antiliberal e antidemocrática predominante no
Brasil:
1º) - O enfraquecimento político da célula
municipal;
2º) - O enfraquecimento consequente do
Poder Federal.
Engorgita-se a glândula provincial e a
Nação sofre os distúrbios de uma perturbadora disritmia. Verifica-se um desequilíbrio
mórbido que estiola as fontes da vitalidade nacional, tornando anêmica a nossa
expressão política, determinando fenômenos de esgotamento nervoso da opinião pública
e astenia muscular profunda nos órgãos de defesa da Pátria. Serve-se disso o comunismo
como disso se aproveita o capitalismo internacional. E o Brasil caminha para a
ruina em consequência de um fatozinho que passa despercebido aos nossos sociólogos
e políticos: a atrofia política do Município.
Nestas condições, estando no Município
a chave do problema nacional brasileiro, nós, integralistas, estabelecemos
estas formulas:
Para a Província, em relação à União: máximo
de autonomia administrativa; mínimo de autonomia política.
Para o Município, em relação à Província:
planificação administrativa pela Província; plena autonomia política da célula
municipal.
Seria longo expor aqui todo este capítulo,
que é básico na estrutura do Novo Estado, onde existirá a verdadeira Democracia,
a legitima Liberdade, a prática do mais puro pensamento que inspira teoricamente
o atual regime e é desvirtuado, na prática, pela política objetiva.
O que eu quero dizer é que esta reunião
no Rio, de um Conclave Parlamentar, em que tomam parte todos os vereadores,
prefeitos e deputados das Províncias Meridionais eleitos pelo Integralismo, assinala
uma afirmação importantíssima dos camisas-verdes. Sendo o primeiro congresso dessa
natureza realizado no Brasil, ele revela as linhas do nosso ideário político e
proclama os direitos de vida dos Municípios brasileiros.
Nesta hora de pregação nacionalista, eu
afirmo, com toda a minha convicção oriunda da experiência que, para mim,
madrugou, desde quando, aos vinte anos, batalhei na política municipal,
chegando mesmo a organizar numa zona do Estado de S. Paulo, um partido
municipalista, no qual congreguei numerosos Municípios: - será inútil toda pregação
de nacionalismo se não fortalecermos o Poder Central da República e, para
fortalecer o Poder Central temos de, preliminarmente, tomar a defesa da causa
do Município contra o arbítrio dos Estados.
Ou fazemos isso, ou não temos Nação.
Ou fazemos isso, ou prolongamos as lutas hegemônicas que ensanguentam nossa Pátria
de quatro em quatro anos. Ou fazemos isso, ou substituímos milhares de núcleos
de brasilidade por vinte e dois blocos heterogêneos em perpetua luta. Ou
fazemos isso, ou fortaleceremos o regionalismo, que marcha para o separatismo.
Ou fazemos isso, ou não teremos nem mesmo unidade policial, unidade judiciária,
unidade educacional, unidade moral, unidade de sentimentos para opormos uma
barreira ao comunismo invasor.
As Côrtes do Sigma, coincidindo com o
1º. Congresso Nacional Feminino e com o Conclave Parlamentar das Províncias Meridiões,
adquirem uma significação histórica extraordinária, na hora que passa.
Os fúteis, que discutem integralismo
sem conhecer nada de nossa doutrina política; os tardos de inteligência, que
não percebem a supervisão destes problemas essenciais da nossa vida de povo; os
perversos, que de propósito sofismam, apontando-nos como extremistas; os
vendidos, que trabalham a soldo de Moscou ou de Londres, esses poderão
contestar-me.
Como não sou um caçador de quatriênios,
porém um preparador de caminhos para as novas gerações, responder-lhes-ei que
estas minhas palavras serão confirmadas no Futuro: ou pela Vitória do
Integralismo, que dará Unidade, Força, Dignidade, Grandeza à nossa Pátria, ou
pela desagregação, pela ruína pela infâmia que nos trarão o separatismo e o comunismo.
Estou, porém, convencido de que os
arruinadores da Nação jamais conseguirão deter esta marcha de conscientes no
meio das turbas de inconscientes; jamais conseguirão sufocar, com as maiores opressões,
esta decisão de um milhão de brasileiros de camisa-verde; jamais lograrão
evitar que este desígnio esclarecido, esta luta no campo das ideias e dos
sentimentos, iluminada pelo estudo, pelo raciocínio, pela visão realista do
Brasil, se transforme, como já se está transformando, em fatalidade da História,
para honra da nossa gente.
Publicado originalmente n’A OFFENSIVA, em 14 de Outubro de 1936.
sexta-feira, 16 de agosto de 2024
A REVOLUÇÃO DA ANTA (13/03/1927)
Esclarecimento: A publicação do Artigo abaixo só foi
possível graças à generosa colaboração do Prof. Paulo Fernando, conhecido Líder
Pró-Vida, profundo pesquisador da História do Brasil, possuidor da maior
Pliniana existente, que nos permitiu o acesso a sua Hemeroteca; e, atualmente,
é Deputado Federal pelo Distrito Federal. Aos que desejarem conhecer mais o
trabalho do Prof. Paulo Fernando indicamos: https://www.instagram.com/paulofernandodf/
A REVOLUÇÃO DA ANTA (entrevista de Plínio Salgado,
13/03/1927)
- Uma entrevista para O JORNAL sobre a Anta e o antismo vem exatamente
ao encontro de um meu desejo. Tenho mesmo interesse em falar ao Rio de Janeiro sobre
este assunto, que reputo da mais alta relevância para o Brasil. À primeira
vista, tudo parecerá aos intelectuais uma lírica patriotada. Parecerá que o movimento
da Anta nenhuma relação terá com a nossa vida mental. E tais considerações serão
bem naturais, uma vez que a nossa literatura perdeu, completamente, o senso das
realidades.
O RIO ENTENDERÁ SÃO PAULO?
É preciso notar: observadas em conjunto,
diferem profundamente as mentalidades das nossas duas capitais. Isso
dificultará o entendimento a que deveremos chegar. Cercada de montanhas,
olhando o mar, a cidade do Rio de Janeiro só entra em contato com a realidade
brasileira através do morro da Favela e das piadas e trocadilhos mestiço
largamente exportados pelas províncias. Ia-me esquecendo: há aí também a “macumba”,
como expressão racial... E o Dr. Jacarandá, e o cidadão Pingó, como expressão política,
sistematizada desde a Saúde ao partidarismo municipal... Mas essa vida não é vivida
pelos intelectuais que respiram ares da França. Pois tudo o mais, desde João VI
- que trouxe a cidade a bordo — tem um caráter de adaptação e de
artificialismo.
Cidade burocrata e oficial, a obra da
infiltração estrangeira, desde a Confederação dos Tamoios, têm sido aí tão
dissimulada e insinuante, que não deu lugar a uma reação forte de nativismo.
Fatalidade político-administrativa.
Aqui as massas imigratórias entram de
supetão, com tal violência, que nos puseram de pé. No panorama dos arranha-céus,
acordou a alma do povo “arrogante e sem respeito, perturbador da paz dos
continentes”, a que alude o cronista. Nos intervalos dos apitos das fábricas,
São Paulo põe o ouvido no peito do sertão: é o ritmo da vida nacional.
As ressonâncias dessa vida chegam aí
no Rio com um acento político ou literário. Indiretamente. Essa cidade conhece as
“consequências brasileiras”, não as “causas brasileiras”. O Brasil lhe parece como
uma fachada misteriosa. Quando muito, será a visão panorâmica da poesia de
Ronald.
Distinguem-se fundamentalmente as mentalidades
do litoral e do interior. Pois, em relação ao país, uma se forma de fora para dentro,
a outra de dentro para fora. Na capital da República, a disparidade com a província
é agravada pelos hábitos burocratas e de sociedade, de oficialismo e contato
forçado com as culturas e costumes exóticos. A inteligência requinta-se
apurando a faculdade crítica, sobretudo o senso de comparação e de ecletismo, em
detrimento da faculdade criadora. Possibilita-se a ironiazinha sutil das
senilidades precoces, que é a raiva piedosa contra os que sabem ainda crer.
Floresce, absurdamente, no Brasil, um
espírito como o de Machado de Assis. Ele não poderia sair senão do Rio, que
respirava então por Stendhal, como hoje respira pelas últimas brochuras
europeias. Na mais recente geração intelectual, incapaz de criar, como observa cruelmente
Rodrigo de Andrade no largo e raivoso elogio que fez no O JORNAL à intelectualidade paulista, há, mais do que o espírito de
indecisão e angústia da civilização ocidental, um cheiro de senectude humanística,
o bolor da sombria biblioteca do Sr. D’Astarak. Aquele sorriso cretino de Anatole
diante da grandeza do inexplicável; aquela risada mesentérica de Eça única ação
de que foi capaz diante da derrocada do seu país; e, principalmente, o
esnobismo displicente e tecido de uma elegância espiritual nociva, que veio de Byron
e Oscar Wilde e rebentou no almofadismo letrado dos países velhos, tudo isso
influi aí no Rio para que poucos compreendam a nossa ingenuidade de crentes. Acredito,
entretanto, que os jovens escritores do Rio não se magoarão com essa franqueza
paulista de quem lhes quer muito bem. E, quando não concordem, pelo menos, levem
estas coisas em conta de nossa imensa ingenuidade de provincianos...
AOS VINTE ESTADOS DO BRASIL E AO ACRE TAMBÉM...
Vou contar a história da Anta, não só
ao Rio, mas às vinte províncias, nossas irmãs, que respiram, como nós o sol da
América. Algumas bem saturadas de espírito clássico e latim com rapé, velhas
igrejas lusitanas, velhas academias coimbrãs, sonetos & cia. Mas todas
unidas por este mesmo sentimento
brasileiro que as colocará de pé em luta contra a ditadura de cem anos dos pensadores e artistas
estrangeiros. Contra nosso regime colonial.
A VOZ DO OESTE
A centelha do movimento da Anta
faiscou uma noite, no decorrer de uma conversa entre mim, Alarico Silveira e
Raul Bopp. A propósito de uma alusão que fiz a um artigo de Alarico (grande
espírito e profundo conhecedor de coisas nossas), falou-nos ele da marcha
bandeirante, no rumo do oeste, sugerindo as razões étnicas por que se
encaminharam os paulistas naquela direção. Para ele, era uma saudade ancestral dos planaltos bolivianos, que o sangue índio implantou
no sangue português, nas primeiras núpcias de
raças, a que presidiu João Ramalho. Os tupis tinham vindo daquela
região.
CHE TAPYA!
Referindo-se à marcha pré-colombiana e
à origem do nome dessa grande tribo, falou-nos do totem da raça, a anta ou o
tapyr — o maior mamífero da América e o único grande animal genuinamente
americano do sul — totem largamente proclamado como tal pelos guerreiros, com
os brados de “che tapya”, que vieram
atroando as brenhas, naquela procura épica e predestinada do Atlântico, por
onde vinham, também numa procura épica de continentes, as caravelas lusitanas.
Ao passo que ouvíamos
interessadíssimos o notável paulista, eu, que andava procurando a força que
possibilitou a unidade nacional, a fim de usar dela como agente destruidor da
nossa subserviência ao estrangeiro, ia sentido uma íntima revelação.
A MATEMÁTICA DOS SENTIDOS RACIAIS
Nem os sistemas hidrográficos ou
orográficos; nem a unidade do processo moral da formação brasileira; nem as
contingências políticas, me eram mais sugestivas do que o próprio sangue Tupi,
proveniente das Ibiturunas (Andes), que eu via como um “denominador comum” das
diferentes expressões humanas dos cruzamentos. Era bem verdade que não somente
o Tupi entrou na formação brasileira, uma vez que havia outras tribos
selvagens, que não eram tupis; mas o símbolo servia e podia abranger todas as
famílias autóctones, e ser tomado como “senha” de um vigoroso movimento nativo.
Pois, em toda parte, víamos o índio: Poty, no norte; Tibiriçá, no centro, e São
Sepé, no sul.
ESCRÚPULOS DA TRIBO VERDAMARELA
Quando eu e Bopp falamos da Anta,
nossos amigos verdamarelos puseram o bicho de quarentena. Tomaram-no, a
princípio, como expressivo de uma função restritiva de preconceito racial.
Espíritos irmanados no mesmo desejo e na mesma fé, Menotti Del Picchia, Cassiano
Ricardo, Motta Filho, Genolino Amado, Raul Bopp e eu, costumávamos discutir como
único intuito de chegarmos a um acordo. Na discussão tudo se esclarece. Não brigamos,
mesmo quando usamos a violência no terreno das ideias. Espírito largo de
tolerância. Acordo que estabelece desacordo. Até mesmo os que estão fora
merecem o nosso respeito. Divergimos, por exemplo, em muitos pontos, do Mário
de Andrade e votamos-lhe (de minha parte fervorosamente), uma grande admiração. Pregamos tacapadas no Oswald
de Andrade, que nos agride também no seu rodapé do “Jornal do Commercio”, e, à
noite, confraternizamos em palestras amigas na sala acolhedora do “Correio
Paulistano”. Há tempos, Prudente de Moraes, neto, disse mal de um livro meu, e
em correspondência que temos trocado, ele ficou sabendo que eu não faço questão
de ser um grande escritor. Pois, se me interessa mais a humanidade do que os
meus escritos, por que hei de amar mais a estes do que às minhas ideias? E,
porque assim pensamos aqui, tivemos uma polêmica a respeito da Anta.
Discutiu-se à beça. No fim, a anta foi aceita, mas sem vencidos nem vencedores.
TUPYRETAMA
Aqui caberia um artigo de cinco
colunas para mostrar a área geográfica abrangida pela influência tupi. E a área
moral. E a área nos domínios da política, da estética e dos costumes, etc. Mas
já estou comendo muito espaço. Deixo a sugestão.
CENSURA
Ocorre-me aqui Ratzel, um lindo
pensamento de Greef e todo um livro de José de Vasconcelos. Só mesmo num tratado
ou num manifesto 21 tiros.
NECESSIDADE DA TIRANIA DO SERTÃO
Para mim, o “Facundo”, de Sarmiento,
tomava um novo sentido. Eu via o homem brotar da Terra e avançar para a cidade.
Eu via a grande cortesã, visionada pelo profeta de Pathmos, invadida por uma
manada de antas arrasadoras do cosmopolitismo, da crítica negativista, da
falsidade das atitudes e, principalmente, dessa incapacidade de crer,
remanescente de uma educação humanista e esnobe. Revoltava-me contra todos os
passivos: desde os que se aferram às fórmulas velhas da filosofia, da política
e da estética, até os que fazem arte nacional através de Marinetti e Max Jacob.
Indignava-me a poesia turista de Cendrars; os vícios de Cocteau, Apollinaire,
Morand; a macaqueação ultraísta e o estado “dadá” de espírito; e, mais ainda,
as contrafações de modernidade, em poetas ainda com prejuízos tangíveis do
parnasianismo e do simbolismo. Os gestos, mal vestidos de atualismo, de um ingurgitamento
romântico a Rousseau; o romantismo sensorial dos impressionismos “torre de
marfim”: o preciosismo acadêmico geometrizando-se diferente no teorema cubista,
submetido a um princípio e realizado sob preconceitos processuais. Em tudo, o
predomínio de mil Lobões praxistas, desses Lobões cujo senso do direito nunca
passou do rito e nos quais, por certo, a alta finalidade da estética jamais
iria além da norma consagrada no “boulevard”. Já não quero falar do panorama
político-social, do qual tratarei mais tarde. Mas foi assim conjecturando que o
li meu “nheengassu” que desencadeou a discussão que se tornou base do acordo em
que hoje estamos em São Paulo de desenvolver uma ação nova no Brasil. Interpretando-se
com novo sentido “Os Sertões”, de Euclides, e o “Facundo” de Sarmiento.
PORQUE O INDIO
Escrevi, em um dos meus artigos, o
seguinte:
“Eu ainda não vi o Brasil vivo e
pensante: o que eu tenho visto é uma Europa viva e pensante vivendo e pensando
o que nós chamamos de nossa vida e o nosso pensamento. Mas, há uma outra vida e
um outro pensamento, que devemos revelar ao mundo; e esse é o Brasil vivo e pensante
que dorme pesadamente sobre uma montanha de livros e que precisamos despertar
porque se aproxima o momento da sua fala
sem haver consciência, precisamos libertar-nos de todas as contribuições de
consciência alheia. Como símbolo da ação que
temos de desenvolver, tomamos o totem de uma raça que, objetivamente,
desapareceu, porém que é uma incontestável realidade na nossa formação étnica.
E não se confunda formação étnica com formação nacional, que é outra coisa
decorrente desse fator e de outros ainda. E se nos perguntarem porque tomamos o
índio, diremos que pela sua virgindade a nos ensinar, constantemente que, não
tendo nós ainda pensado pelas nossas cabeças, podemos fazê-lo sem compromissos
com as velhas civilizações. Responderemos ainda que, pela nenhuma contribuição
cultural e civilizadora que ele nos trouxe à formação nacional, pode a nação
dizer-se sua descendente, sem submissão histórica, até sem gratidão, o que a faz
mais livre. E foi justamente esse senso de individualismo nacional que ensinou
as clãs primitivas a se dizerem descendentes de bichos: para que pudessem fazer
sua eclosão com uma força de liberdade selvagem.
A CIVILIZAÇÃO DIFERENTE
Depois, declarei:
“Nós
queremos criar uma nova mentalidade, não desenvolvida exclusivamente sob
o influxo da cultura universal, mas respirando nesta, com raízes na terra. E
quando digo “terra”, quero abranger “meio cósmico e étnico”.
Não sei ainda “como será” a cultura
americana. Aos gênios do futuro compete responder-nos a angustiada pergunta.
Não podendo alcançá-los, queremos comovidamente anunciá-los ao Mundo.”
NÃO SE TRATA DO INDIANISMO
Escrevi esta frase 17 vezes em cinco
artigos. Mas escrevo ainda mais uma vez. Não se trata de indianismo.
O que queremos é um Brasil masculino,
que tenha a iniciativa dos atos fecundantes. Pois há povos masculinos, que
fecundam, e povos femininos, que são fecundados. Como há espíritos femininos,
que se emprenham pelo ouvido. Queremos, pois, um Brasil brasileiro. Não faço
isso por patriotismo, mas por humanidade. Pois vejo que a civilização ocidental
europeia faliu. Já nada se espera dela. Temos (e quando falo temos quero
abranger vários séculos futuros), temos que criar uma civilização em que talvez
o gênero humano seja mais feliz. Isso
parece pilhéria, aos espíritos (como a maior parte dos intelectuais
brasileiros), que esperam sempre o resultado do que se dá em outros países. Mas
creio firmemente que não o é. Ponho uma grande fé na “raça cósmica” de que fala
José de Vasconcelos. Ela poderá dizer a última palavra.
Voltemos à sabedoria da infância. Por que
nascermos velhos? A Europa é uma velha caduca, nós somos um povo criança.
Declaremos à velha que somos filho do índio como o índio era da anta. E nada
temos a ver com gente estranha. O movimento da Anta é de ação. Ação verdamarela
de independência. Sentir diretamente, dizer diretamente. Perder essa noção do ridículo,
ministrada por estrangeiros e inimigos, essa noção que nos fez perder o brio
nacional. Não mais dizermos que somos latinos. Isso é política que nos prende eternamente à Europa.
E onde já se viu caboclo e mulato latino? Acabemos com esse respeito
supersticioso pelas coisas que vêm de fora. Sejamos brasileiros para sermos
dignos da Humanidade.
Publicado originalmente n’O Jornal, Rio de Janeiro, 13 de março
de 1927.